metropoles.com

União gastou R$ 823 mi para bancar casas de servidores e autoridades

Valor é referente ao pagamento de auxílio-moradia a integrantes dos três Poderes, Ministério Público e Defensoria Pública em 2017

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Michael Melo/Metrópoles
Michael Melo/Metrópoles
1 de 1 Michael Melo/Metrópoles - Foto: Michael Melo/Metrópoles

O incêndio seguido de desabamento de um prédio de 24 andares no centro de São Paulo, na última terça-feira (1°/5), trouxe de volta ao debate nacional o problema histórico do deficit de moradia no Brasil. O edifício era ocupado por sem-tetos. Enquanto 7,7 milhões de cidadãos – segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) – aguardam solução habitacional do governo federal, R$ 823,5 milhões foram retirados dos cofres públicos em 2017 para bancar auxílio-moradia e ajuda de custo a servidores, políticos e autoridades dos três Poderes da República, Ministério Público (MP) e Defensoria da União.

O dado faz parte de um levantamento da Consultoria de Orçamentos do Senado Federal divulgado em janeiro deste ano e atualizado pela inflação, tendo por base o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA). Sem a correção, a cifra seria de R$ 814,2 milhões. No total, o impacto do benefício no orçamento público entre 2010 e 2018 é superior a R$ 4,3 bilhões.

Para 2018, o gasto previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA) para a rubrica é de R$ 831,2 milhões. Com o montante, seria possível custear um ano de aluguel social a 173 mil famílias em São Paulo, cidade com maior deficit habitacional do país e cenário da tragédia que, até o momento, deixou um morto e cinco desaparecidos.

O valor também equivale a oito vezes o orçamento previsto para 2018 do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS), uma das principais fontes de verba pública para a construção de moradias destinadas a famílias de baixa renda. Neste ano, a reserva conta com previsão de R$ 95,3 milhões, conforme informações do Painel Siga Brasil.

Gasto inédito
Caso executado por completo, o orçamento de 2018 para auxílios-moradia dos três Poderes, Ministério Público e Defensoria Pública será a soma mais alta já gasta com o benefício no Brasil. O maior volume é o destinado ao Poder Executivo (R$ 380,8 milhões), seguido do Judiciário (R$ 333,9 milhões) e do MP (R$124,5 milhões), que engloba Ministério Público da União e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), conforme detalhado abaixo.

5 imagens
Fonte: Senado Federal
Fonte: Senado Federal
Fonte: Senado Federal
Fonte: Senado Federal
1 de 5

Fonte: Senado Federal

Arte/Metrópoles
2 de 5

Fonte: Senado Federal

Arte/Metrópoles
3 de 5

Fonte: Senado Federal

Arte/Metrópoles
4 de 5

Fonte: Senado Federal

Arte/Metrópoles
5 de 5

Fonte: Senado Federal

Arte/Metrópoles

 

Faz sentido comparar o gasto com auxílio-moradia e o que poderia ser investido em situações semelhantes na área social. Em tese, os dois teriam o mesmo destino: auxiliar alguém com dificuldades em residir

Gil Castelo Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas

Para o economista, contudo, as críticas ao auxílio-moradia devem ser direcionadas não apenas aos valores gastos pela União, mas também às circunstâncias de concessão do benefício.

O boom da regalia
O auxílio-moradia existe há décadas na legislação brasileira e é assegurado a membros do serviço público que necessitam de subsídios para habitação em razão da função ocupada por eles. O benefício, contudo, passou a ser questionado de forma mais contundente após uma liminar concedida em 2014 pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux.

A decisão estabelecia o pagamento de auxílio-moradia de R$ 4.377 a todos os magistrados em atividade no país. Por simetria, a liminar estendeu-se ainda a membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas de toda a nação.

A liminar do STF provocou um boom de concessão de auxílios-moradia pelo Brasil e mais do que duplicou os gastos com a rubrica. Se em 2014 a União executou R$ 363,7 milhões com a despesa, em 2015 foram pagos R$ 820 milhões. “De lá para cá, pessoas com residência no estado onde trabalham ou que não foram obrigadas a se mudar estão recebendo”, afirma o professor do Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB) José Carneiro da Cunha.

Arte/Metrópoles
Um caso polêmico de recebimento de auxílio-moradia, lembra o docente, foi o dos juízes federais Sérgio Moro e Marcelo Bretas, responsáveis por ações penais resultantes da Operação Lava Jato em Curitiba (PR) e Rio de Janeiro (RJ), respectivamente. Enquanto Moro tem imóvel próprio na capital paraense, onde vive e trabalha, Bretas é casado e reside com uma juíza que também recebe o benefício.

A ideia fundamental do auxílio é ajudar um servidor público federal que, por solicitação da administração, teve de se mudar para outro estado. Hoje, esse pagamento está totalmente desvirtuado

José Carneiro da Cunha, professor da UnB

O auxílio, lembra o docente, não fura o teto do funcionalismo público e é isento de tributação. “São pessoas que já possuem, muitas vezes, salários maiores do que a média e querem compor remunerações fora dela, criando um mecanismo pelo qual o imposto não é cobrado”, comenta.

Imóveis funcionais
Alem dos auxílios-moradia, a União também garante o domicílio de diferentes agentes públicos pela concessão de imóveis funcionais. Por não possuírem uma discrição própria no orçamento público, contudo, os valores gastos com a manutenção das casas e apartamentos são de difícil contabilidade.

No Executivo, os imóveis funcionais são administrados pelos ministérios do Planejamento, das Relações Exteriores e da Defesa, bem como pela Presidência da República. As 424 residências gerenciadas pelo Planejamento, por exemplo, possuem um custo total de manutenção próximo a R$ 2,9 milhões por ano, segundo a própria pasta. Conforme informou o ministério, os gastos incluem taxas de limpeza pública e condominiais ordinárias dos imóveis.

A Câmara dos Deputados e o Senado Federal também mantêm imóveis funcionais em Brasília, para uso de parlamentares no exercício do mandato. Na Câmara, em que 90% das 432 unidades estão ocupadas, o gasto anual médio de manutenção de um único apartamento é de R$ 43 mil, segundo a Casa. O Senado administra 71 apartamentos, além da residência oficial da Presidência, a um custo anual de R$ 15,2 mil por imóvel.

4 imagens
O bloco custa, por ano, R$ 686 mil aos cofres públicos. As despesas são referentes a pagamento de porteiros e faxineiros, além de contas de água, energia elétrica e manutenção
Em março deste ano, a área verde do prédio foi interditada após vistoria da Defesa Civil que atestou risco de desabamento
O edifício está desabitado há pelo menos uma década. Atualmente, abriga escritórios e continua sendo utilizado como depósito de móveis e produtos de manutenção, entre outros
1 de 4

Bloco L é um dos quatro prédios de propriedade da Câmara dos Deputados na 202 Norte

Michael Melo/Metrópoles
2 de 4

O bloco custa, por ano, R$ 686 mil aos cofres públicos. As despesas são referentes a pagamento de porteiros e faxineiros, além de contas de água, energia elétrica e manutenção

Michael Melo/Metrópoles
3 de 4

Em março deste ano, a área verde do prédio foi interditada após vistoria da Defesa Civil que atestou risco de desabamento

Michael Melo/Metrópoles
4 de 4

O edifício está desabitado há pelo menos uma década. Atualmente, abriga escritórios e continua sendo utilizado como depósito de móveis e produtos de manutenção, entre outros

Michael Melo/Metrópoles

 

Freio
Especialistas concordam que os benefícios de habitação a agentes públicos oneram o orçamento da União e, muitas vezes, são concedidos de formas indiscriminadas. No Congresso, uma proposta de emenda constitucional (PEC) de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pretende vedar o pagamento de auxílio-moradia aos “membros do poder”. Com a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, o projeto, contudo, teve sua tramitação congelada: enquanto durar a medida, a Constituição não pode ser emendada.

Para o professor de gestão pública do Ibmec José Simões, a legislação precisa ser aperfeiçoada. “O orçamento hoje está tomado por despesas discricionárias e rolagens de dívidas, de modo que o espaço para investimento é cada vez menor. Se você economizar em benefícios como esse, deixa de onerar a folha de pagamento. O auxílio não pode virar um salário”, defende.

Quais assuntos você deseja receber?

Ícone de sino para notificações

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

Ícone de ajustes do navegador

Mais opções no Google Chrome

2.

Ícone de configurações

Configurações

3.

Configurações do site

4.

Ícone de sino para notificações

Notificações

5.

Ícone de alternância ligado para notificações

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?