Tramitam na Câmara 52 projetos de lei contra o aborto, PSL lidera pedidos
O levantamento é do (M)Dados, núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles, com base no Sistema de Informações Legislativas da Casa
atualizado
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A confusão enfrentada pela menina de 10 anos vítima de estupro para conseguir realizar um aborto no Brasil trouxe à tona o tabu entre os brasileiros, além de expor a confusa e frágil legislação em torno do procedimento. E, caso dependesse dos projetos de leis que tramitam na Câmara dos Deputados, o desfecho da história poderia ter sido bem diferente.
Levantamento do (M)Dados, núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles, identificou no Sistema de Informações Legislativas da Casa 121 propostas em tramitação, desde 1989, que mencionam a palavra aborto. Dessas, 52 tratam de restringir os direitos à interrupção voluntária da gravidez em qualquer circunstância.
O ano de 2019, primeiro do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), foi altamente pautado pelo assunto. Foram 13 projetos pela criminalização do aborto. Em 2013 e 2015, o tema também foi “popular”, com seis PLs em cada. No ano atual, cinco deram entrada na Casa.
Das 52 totais, nove matérias são de deputados filiados ao Partido Social Liberal (PSL), ex-legenda de Bolsonaro, assinadas em sua maioria pela deputada Chris Tonietto (RJ). Só dela, foram seis projetos — cinco em que assina sozinha e uma em coautoria com o deputado Filipe Barros (PSL).
Em um desses projetos de lei (PL 1945/2020), ela defende o aumento de pena em caso de aborto realizado em razão de microcefalia ou qualquer outra anomalia ou malformação do feto. Em outro, quer instituir a Semana Nacional do Nascituro (PL 4149/2019). Na justificativa, Chris até cita o livro Morte e Vida Severina, de João Cabral de Mello Neto.
“Na voz de Seu José Mestre Carpina, a vida é relatada com toda alegria que merece e com toda a dignidade que lhe é devida: ‘Mesmo quando é assim pequena / a explosão, como a ocorrida/ Como a de há pouco, franzina. /Mesmo quando é a explosão /De uma vida severina’. A vida, em todas as suas etapas, tem dignidade e deve ser promovida e protegida. De igual forma, e sempre, precisa ser celebrada”, escreveu.
O ex-vice líder do governo na Câmara dos Deputados, Capitão Augusto (PR-SP), também se tornou voz ativa contrária ao tema. Foram quatro textos apresentados em 2019 pedindo alteração do artigo 127 do Código Penal, prevendo pena para os médicos ou responsáveis pelo procedimento.
“Não se pode esquecer que, enquanto gestantes, muitas vezes por desequilíbrio emocional e desespero, consentem com essa barbaridade, o terceiro comete esse crime sem estar nessa condição, o que atrai a necessidade de dura punição”, justificou.
Na contramão, poucas são as matérias que defendem a legalização. A mais recente é de 2015, escrita pelo ex-deputado federal Jean Wyllys (PSol). Segundo site da Câmara, a proposição ainda está sujeita à apreciação do Plenário.
O que diz a legislação sobre aborto no Brasil?
Qualquer mulher pode ter acesso gratuito ao aborto no Brasil ao se apresentar no Sistema Único de Saúde (SUS) com um laudo da equipe de saúde, desde que obedeça à legislação vigente.
O procedimento no Brasil é crime. Confira os artigos do Código Penal que tratam desse tema:
- Art. 124 – Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque.
Pena – detenção, de um a três anos. - Art. 125 – Provocar aborto, sem o consentimento da gestante;
Pena – reclusão, de três a dez anos. - Art. 126 – Provocar aborto com o consentimento da gestante;
Pena – reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência - Art. 127 – As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
- Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico
I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
No país, há, ainda, a permissão para o caso de anencefalia fetal, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).