Trabalho escravo avança sobre plantações de café e legumes no Brasil
Entre as atividades com maior número de vítimas de trabalho escravo na área rural estão o cultivo de café, alho, batata e cebola
atualizado
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Apenas em agosto de 2023, mais de 500 trabalhadores foram resgatados de condições de trabalho escravo contemporâneo no Brasil. Entre as atividades econômicas com maior número de vítimas na área rural estão o cultivo de café (98), alho (97), batata e cebola (84), segundo dados do Ministério Público do Trabalho (MPT).
A Operação Resgate III representou a maior ação conjunta de combate ao trabalho escravo e tráfico de pessoas no Brasil. Ao todo, mais de 70 equipes participaram de 222 inspeções em 22 estados e no Distrito Federal. Minas Gerais (204), Goiás (126) e São Paulo (54) foram os locais com maior número de pessoas resgatadas.
“A operação mostra a importância da atuação articulada dos órgãos públicos para a proteção dos direitos humanos, bem como evidencia a forte presença da escravidão moderna que, infelizmente, ainda existe no país”, explica o vice-coordenador nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do MPT, Italvar Medina.
Dos 532 trabalhadores resgatados, 441 eram homens e 91 mulheres. Entre esses resgates, 356 ocorreram em atividades econômicas na área rural, abrangendo cultivo de café (98), cultivo de alho (97), cultivo de batata e cebola (84), carnaúba (54) e produção de ovos (23).
Na área urbana, o setor com o maior número de pessoas resgatadas foi o de restaurantes (17), seguido de oficinas de costura (13) e construção civil (10), além do trabalho doméstico. Isso evidencia que o mundo da gastronomia ainda permanece como um epicentro desse problema.
Apesar de não terem ganhado destaque na mídia, há outros casos de trabalho análogo a escravidão que constam na “lista suja” do Ministério do Trabalho. A maioria deles, inclusive, vieram de fiscalizações em fazendas, uma das principais áreas de cultivo de alimentos.
Por que isso ainda acontece?
De acordo com Marina Ferro, diretora executiva do Instituto Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (InPACTO), a exploração de trabalhadores está relacionada com a desigualdade e vulnerabilidade que marcam historicamente e profundamente a sociedade brasileira.
“Um exemplo disso é que, dentre os mais de 60 mil pessoas resgatadas até hoje, a gente vê um recorte claro do perfil dessas pessoas de que mais de 80% se autodeclaram negros. Por isso, precisamos agir na causa raiz para quebrar o ciclo da pobreza e miséria”, explica ao Metrópoles.
Marina ainda afirma que quanto mais as pessoas estiverem vulneráveis, mais elas recaem ao aliciamento ou aceitam uma situação degradante. Para combater o problema, é necessário unir todos os atores envolvidos.
“Cabe ao estado proteger os direitos humanos e criar políticas públicas, olhando para esses grupos mais vulneráveis. Além disso, as empresas devem exercer sua responsabilidade social e respeitar os trabalhadores. A sociedade civil também tem o papel de apoiar nessa direção”, elucida Marina.
Ações efetivas e conjuntas
A erradicação do trabalho escravo, infantil e do tráfico de pessoas depende do esforço coletivo, como a que ocorreu na Operação Resgate III, que demonstrou a cooperação interinstitucional. Segundo a diretora da InPACTO, ações como esta devem servir de exemplo para outras atuações desse porte.
“A intensidade dessa operação chama a atenção não só pelo número de resgatados, mas também pela cooperação e estrutura que foram envolvidos, abrangendo o meio urbano e rural. Precisamos de mais ações como essa para enfrentar o problema e fazer com que não aconteça mais”, ressalta Marina.
*A Operação Resgate III envolveu seis instituições: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).