“Tendemos mais a fogueiras santas do que à comunhão”, diz Romi Bencke
Pastora luterana foi coordenadora da Campanha da Fraternidade Ecumênica este ano e se tornou alvo de ameaças de extremistas
atualizado
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Apesar de ter o diálogo como tema, a Campanha da Fraternidade de 2021 foi marcada por boicotes dentro da Igreja Católica e por ataques graves à pastora luterana Romi Bencke, liderança religiosa que coordenou a iniciativa este ano. Bencke é secretária-executiva do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs, o Conic, e este ano a Campanha da Fraternidade foi realizada de maneira ecumênica, com os católicos convidando fiéis de outras religiões a uma união em torno de objetivos comuns.
Grupos mais conservadores do próprio catolicismo, porém, se negaram a abraçar alguns desses objetivos, como a denúncia da violência sofrida por minorias, a exemplo da população LGBTQI+.
Houve intenso debate no seio da igreja, com alguns líderes ignorando a campanha deste ano e outros a defendendo. O papa Francisco enviou mensagem aos féis brasileiros defendendo a campanha e dizendo que “cristãos devem dar o o exemplo”.
Alguns fiéis ligados a grupos políticos de extrema-direita promoveram nas redes sociais, além de ataques à pastora Romi Bencke, uma contra a própria campanha, pedindo que se evitasse doar para as paróquias no último dia 28, o Domingo de Ramos, quando terminou oficialmente a Campanha da Fraternidade.
“As resistências em torno da proposta ecumênica e inter-religiosa apresentada na Campanha indicaram o quanto o cristianismo está polarizado e dividido como expressão religiosa. A mesma polarização da sociedade se reflete nas comunidades cristãs”, avalia a pastora em conversa com a reportagem.
“Não há nada mais contraditório do que associar a fé em Jesus Cristo com exclusivismo religioso e combate a inimigos e inimigas. Mas hoje tendemos mais a fogueiras santas do que à mesa de comunhão”, completa ela, que chegou a mudar sua rotina e evitar sair de casa nos últimos meses por causa da campanha de ódio que enfrentou.
“A Campanha da Fraternidade Ecumênica apontou a necessidade de refletirmos sobre a atual face do cristianismo brasileiro. Em uma avaliação intermediária realizada na Comissão na Campanha, observamos que todos e todas aprendemos muito com este processo. Talvez ainda não tivéssemos consciência sobre o atual cenário do cristianismo no Brasil. Esta Campanha irá ressoar por muito tempo”, prosseguiu a líder religiosa, que já era alvo de extremistas antes dessa campanha por ter uma trajetória de militância pelos direitos das minorias.
O que fica de bom
Sem mostrar arrependimento pelo desafio de coordenar a Campanha da Fraternidade em condições tão duras, a pastora Romi Bencke lembra que houve uma onda de apoio a ela, em resposta aos ataques, que rompeu as fronteiras das comunidades religiosas e incluiu personalidades e entidades de vários setores. Em uma das manifestações, mais de 200 entidades se uniram para defender a religiosa dos extremistas.
“Os ataques realizados por grupos cristãos extremistas despertaram a atenção de atores da sociedade que normalmente não prestariam atenção à Campanha da Fraternidade Ecumênica”, afirma ela, que vê nesse movimento uma realização do diálogo proposto inicialmente.
Entrevista
Em fevereiro deste ano, a pastora Romi Bencke falou ao Metrópoles sobre a Campanha da Fraternidade e sobre os ataques de extremistas. Veja: