“Temos uma sociedade omissa” no combate à discriminação social, diz especialista
Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial é comemorado nesta segunda-feira e especialistas reafirmam o papel da soceidade nesta luta
atualizado
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O Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial é comemorado nesta segunda-feira (3/6). O objetivo da data é relembrar os desafios enfrentados pela população negra no Brasil e os direitos já conquistados ao longo dos anos. No entanto, especialistas alertam para a necessidade de ações mais efetivas contra o preconceito racial no país.
A celebração da data se refere a criação da Lei Afonso Arinos (Lei nº 1.390/1951), primeira legislação contra o racismo no Brasil. Promulgada por Getúlio Vargas em 3 de julho de 1951, a norma tornou a discriminação racial, por raça ou cor, uma contravenção penal.
Para a liderança negra Lúcia Xavier, coordenadora executiva da organização não governamental (ONG) Criola, o Brasil ainda enfrenta um grande desafio no combate à discriminaçãoi racial e é necessário o papel mais ativo dos Três Poderes para punir e fiscalizar todas as formas de preconceito, institucional ou não.
“Eu acho que nesse dia a gente precisava de um um pacto institucional. De Justiça, Legislativo, Executivo se propondo a enfrentar os processos discriminatórios institucionais. De revisão nas práticas institucionalizadas que afetam a população negra. Não é possível que a lei brasileira seja mais rígida e dura, violenta com a população negra não seja com outros grupos”, ressalta Lúcia Xavier.
Influência da sociedade
Lúcia Xavier reforça que a sociedade brasileira tem um processo muito influente no combate a discriminação racial. Para ela, além da presença de pessoas negras em produtos de entretenimento ou de comunicação, é importante a participação delas nos livros didáticos.
“Então eu acho que a sociedade é um ponto chave, mas muito do que a gente tem visto é uma sociedade omissa ou uma sociedade que também reproduz o racismo fazendo a primeira pergunta: ‘O que que aconteceu pra essa pessoa morrer?’ e não ‘porque que ela não foi salva’”, afirma a coordenadora executiva da Criola.
José Henrique Viégas Lemos, membro da União de Núcleos de Educação Popular para Negras e Classe Trabalhadora (Uneafro), afirma que nos últimos anos houve pouca evolução no combate a discriminação e aconteceu apenas depois de atos públicos do movimento negro dentro da sociedade.
“Essa mudança, mesmo que pouco significativa, só ocorreu porque os movimentos negros junto com seus aliados antiracistas, sindicatos, intelectuais e setores da populão palpirizados não negros, se mobilizaram e continuam se mobilizando para fazer valer as suas reinvidicações”, destaca José Lemos.
Discriminação
O servidor público Gilberto Martins, 46 anos, acusou um funcionário de uma churrascaria em Brasília de discriminação racial. Ele e outros colegas foram até o estabelecimento para uma confraternização. O momento de alegria foi interrompido quando um dos atendentes do local escreveu “preto” na comanda do servidor para identificá-lo.
“Um dia que eu acho que eu jamais esquecerei na minha vida. No dia 11 de março agora de 2023”, relatou Gilberto ao Metrópoles. Segundo a vítima, os funcionários do estabelecimento recolheram as comandas e depois entregaram elas novamente aos clientes.
“Na minha comanda tinha além do meu nome estava escrito a palavra preto. E isso me chamou atenção os colegas que estavam ao meu lado tanto direito quanto esquerdo eu perguntei se tinha alguma coisa na comanda deles e não tinha absolutamente nada além do nome”, relembra Gilberto.
O servidor público afirma que no primeiro momento não teve reação quando percebeu o que tinha acontecido. No entanto, a ficha caiu quando ele entrou no carro e entendeu que foi vítima de discrinação racial. Me senti muito ofendido, humilhado, me senti, por incrível que pareça, envergonhado por tudo que estava acontecendo”, conta.
Depois deste episódio, Gilberto conta que o seu filho, de 12 anos, também foi vítima de discriminação racial na escola onde estuda em Brasília. Segundo o servidor, um colega de turma do adolescente começou a imitar macaco.
Gilberto conta que o jovem não contou o episódio e só ficou sabendo após o coordenador informar a mãe do adolescente sobre o acontecimento. O servidor conta que ao conversar com o filho, ele contou que não contou nada para os pais porque se sentiu envergonhado.
“O episódio foi na quinta retrasada [16/6] na sexta [17/6] ele estava bem amuadinho e eu achei ele só falava para mim que estava cansado, ele treina basquete, só falava que estava cansado do treino ele não falava o que era. Na segunda [19/6] começaram as provas e ele teve uma queda nítida nas notas dele”, afirma o servidor público.
“Ele se sentiu muito envergonhado, muito constrangido e isso trouxe um impacto nos estudos dele também. Quando eu fiquei sabendo, fiquei doido”, relembra Gilberto.
Gilberto afirma que espera que a sociedade se conscientize sobre o que aconteceu e que aumente o combate a discriminação racial.
“Eu ainda prefiro enxergar o copo meio cheio e enxergar que as crianças que defenderam o meu filho quando ele foi chamado de macaco na frente de todos os amigos são essas que estarão à frente desse nosso país que estarão influenciando a nossa sociedade junto com o meu filho no futuro”, ressalta o servidor público.