“Telegram não é o único facilitador de fake news”, dizem especialistas
O aplicativo, que tem sido alvo de fortes críticas do TSE, está presente em mais 60% dos celulares brasileiros
atualizado
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O Telegram tem sido alvo de uma chuva de críticas nos últimos meses. Autoridades do Judiciário e especialistas em tecnologia argumentam que o aplicativo traz facilidades que ajudam na disseminação de notícias falsas, principalmente sobre questões políticas.
Nessa sexta-feira (25/2), o STF determinou que o Telegram bloqueie perfis acusados de disseminação de fake news. Caso o aplicativo não faça isso em 48 horas, ele pode ser bloqueado no país.
No início desta semana, o ministro Edson Fachin pediu ajuda do Congresso Nacional no assunto e defendeu a importância de impor limites à plataforma durante uma entrevista coletiva na última quarta-feira (23/2). Fachin, no entanto, não deu mais detalhes sobre como isso seria feito.
“Não havendo pronunciamento legislativo, é possível que o Poder Judiciário seja provocado a se manifestar. Nós estamos examinando, até por cautela e precaução, as experiências existentes em outros países”, disse o magistrado.
Luís Roberto Barroso (então presidente do Tribunal Superior Eleitoral), por sua vez, foi mais enfático em seu posicionamento: “Parece fora do razoável ter como ator no processo eleitoral brasileiro uma plataforma totalmente fora da lei. Você não pode ter um ator que influencia a realidade brasileira e que não esteja ao alcance da lei”. Apesar de indicar ser favorável ao bloqueio, Barroso declarou que o Judiciário não pode agir de ofício, precisa ser provocado.
Para se ter uma ideia da complexidade do problema, pesquisa da Opinion Box mostrou que o Telegram está presente em mais de 60% dos celulares no país.
Na avaliação do especialista político Paulo Loiola, a suspensão do app como medida inicial não seria coerente com a democracia brasileira.
“Seria incorreto o bloqueio antes da tentativa de outras medidas. Precisam ser feitas advertências, punições pontuais, pedidos de retiradas de canais criminosos, e então, a partir do não atendimento dessas questões, pode se pensar em uma punição mais efetiva. Mas, o bloqueio como medida inicial, me parece razoavelmente antidemocrático’, diz.
Sobre o foco exclusivo na rede, porém, Loiola afirma: “Não dá pra dizer que o único problema é o Telegram. Mesmo os acordos feitos com as outras plataformas, que são meritórios e importantes, ainda não são uma solução. Questões relacionadas ao tempo de retirada do conteúdo, ao próprio monitoramento, a campanhas educativas, a restituição do dano causado por materiais que já estão nas plataformas precisam ser levadas em consideração”.
“É errado dizer que apenas o Telegram é um facilitador para as fake news. Qualquer aplicativo ou site que permita o envio de mensagens ou publicação instantânea poderia ser um potencial disseminador”, afirma Juliano Kimura, especialista em mídias sociais.
Ele diz que a flexibilidade do aplicativo é justamente o que o torna tão atrativo, além de que a sua proibição apenas aumentaria o problema. “Essa falta de ‘censura’ está diretamente ligada à democratização da informação. Há muitos negativos sobre a tentativa de controle da comunicação na internet, mesmo que fosse possível; o mesmo seria inútil. Estaríamos apenas marginalizando e criminalizando o seu uso e livre acesso”, diz.
O professor de história, política e bens culturais da Universidade Federal Fluminense, Viktor Chagas, resume o papel do aplicativo de mensagens como parte de um sistema já existente.
“O principal problema concernente ao Telegram é a sua capacidade de se integrar a um ecossistema já organizado de grupos extremistas. Isso significa que os grupos com 10, 20 mil membros podem atuar como vetores para a disseminação de mensagens com caráter desinformativo, discursos de ódio e ataques a adversários políticos para outros ambientes, inclusive o próprio WhatsApp.”
No entanto, Chagas alerta para a importância de as autoridades ficarem atentas a todo o ecossistema digital que, segundo ele, também inclui “produtores de conteúdo audiovisual no YouTube, milícias digitais extremamente organizadas no Twitter e grupos com altíssima capilaridade social no WhatsApp”.