TCU pede suspensão de compra de lagostas e vinhos pelo Supremo
Corte havia feito licitação de R$ 1,3 milhão para servir refeições; órgão irá investigar pedido
atualizado
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O Supremo Tribunal Federal (STF) vai ter de explicar ao Tribunal de Contas da União (TCU) por que decidiu fazer uma licitação de R$ 1,3 milhão para comprar medalhões de lagosta e vinhos importados – e somente os premiados – para as refeições servidas pela Corte. A investigação se baseou em reportagem, publicada pelo Estado na última sexta-feira, dia 26 de abril. Ao transcrever a matéria, o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado, afirmou que a notícia teve “forte e negativa repercussão popular”. Furtado também pediu a suspensão da licitação por meio de medida cautelar.
“E é de se reconhecer que essa repercussão não causa surpresa: os requintados itens que compõem as tais ‘refeições institucionais’, previstos no Pregão Eletrônico 27/2019, contrastam com a escassez e a simplicidade dos gêneros alimentícios acessíveis – ou nem isso – à grande parte da população brasileira que ainda sofre com a grave crise econômica que se abateu sobre o País há alguns anos”, declarou Furtado, em sua representação.
O MP pede “medidas necessárias a apurar a ocorrência de supostas irregularidades nos atos da administração do Supremo Tribunal Federal que visam à ‘contratação de empresa especializada para prestação de serviços de fornecimento de refeições institucionais, por demanda, incluindo alimentos e bebidas’.”
O MBL também quer suspender licitação do STF para compra de vinhos e lagostas. O documento foi protocolado pelo deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP).
O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) foi à tribuna do Senado para criticar a proposta e informou que entregou duas representações ao TCU, uma para suspender o contrato imediatamente e outra para fazer uma auditoria nos últimos dez contratos firmados pelo STF. “É um absurdo completo. Queremos saber cada detalhe desses contratos alimentícios, e dos contratos etílicos também”, disse ao Estado.
Na semana passada, o servidor público estadual Wagner de Jesus Ferreira, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), também entrou com uma ação popular na Justiça Federal do Distrito Federal contra o pregão eletrônico do Supremo.
A deputada Carla Zambelli (PSL-SP) também entrou com uma ação no Tribunal Regional Federal do DF, pedindo a suspensão imediata da licitação realizada pelo Supremo. Na “ação popular com pedido de liminar, Carla Zambelli critica a compra de bebidas alcoólicas e caras pela suprema corte, uma lista que, além de vinhos premiados, inclui uísque, gin, vodka e “cachaças especiais”.
“Não se pretende na argumentação de forma alguma tecer qualquer juízo de valor moralista, no enyanto, é fato indubitavelmente vergonhoso e antiético o patrimônio público arcar com altíssimo gasto em BEBIDAS ALCOÓLICAS a serem consumidas na corte constitucional pátria, uma vez que o Supremo existe para que a Constituição Federal seja protegida, e não para que servidores alegrem-se etilicamente, com visitas ou não, às custas do Estado”, afirmou.
Menu exigido pela licitação ia de brunch a coquetel
O menu exigido pela licitação dos ministros dos STF inclui desde a oferta café da manhã, passando pelo “brunch”, almoço, jantar e coquetel. Na lista, estão produtos para pratos como bobó de camarão, camarão à baiana e “medalhões de lagosta”. As lagostas, destaca-se, devem ser servidas “com molho de manteiga queimada”.
A corte exige ainda que sejam colocados à mesa pratos como bacalhau à Gomes de Sá, frigideira de siri, moqueca (capixaba e baiana) e arroz de pato. O cardápio ainda traz vitela assada, codornas assadas, carré de cordeiro, medalhões de filé e “tournedos de filé”.
Os vinhos exigiram um capítulo à parte no edital. Se for tinto, tem de ser tannat ou assemblage, contendo esse tipo de uva, de safra igual ou posterior a 2010 e que “tenha ganhado pelo menos 4 (quatro) premiações internacionais”. “O vinho, em sua totalidade, deve ter sido envelhecido em barril de carvalho francês, americano ou ambos, de primeiro uso, por período mínimo de 12 (doze) meses.”
Se a uva for tipo Merlot, só serão aceitas as garrafas de safra igual ou posterior a 2011 e que tenha ganho pelo menos quatro premiações internacionais. Nesse caso, o vinho, “em sua totalidade, deve ter sido envelhecido em barril de carvalho, de primeiro uso, por período mínimo de 8 (oito) meses”. Para os vinhos brancos, “uva tipo Chardonnay, de safra igual ou posterior a 2013”, com no mínimo quatro premiações internacionais.
Em sua representação, o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado afirma que a despesa “que se pretende realizar por meio daquela licitação encerra afronta ao princípio da moralidade administrativa” prevista na Constituição.
“Não se pode exigir, pois, dos administradores públicos, simplesmente o mero cumprimento da lei. De todos os administradores, sobretudo daqueles que ocupam os cargos mais altos na estrutura do Estado, deve-se exigir muito mais. Dos ocupantes dos altos cargos do Estado, deve-se exigir conduta impecável, ilibada, exemplar, inatacável. A violação da moralidade administrativa importa em ilegitimidade do ato administrativo e, sempre que for constatada essa violação, deve ser declarada, quer pela via judicial, quer pela via administrativa, a nulidade do ato ilegítimo”, declarou Furtado.
STF diz que licitação prevê pagamentos apenas pelo que foi consumido
Por meio de nota, o Supremo declarou que “a licitação de refeições realizada pelo STF prevê que o tribunal pague apenas pelos serviços que forem de fato consumidos”.
“No pregão realizado na última sexta-feira (26), a menor proposta apresentou um desconto de 58% sobre o valor estimado pelos itens potenciais, no valor de R$463 mil na hipótese de execução total. A seleção, que está na fase de análise da regularidade documental das licitantes, estabelecerá um teto de gastos, mas o STF pagará apenas pelo que for efetivamente demandado e consumido”, informou a corte.
O edital da licitação, declarou, “reproduz as especificações e características de contrato semelhante firmado pelo Ministério das Relações Exteriores (que faz o cerimonial da Presidência da República) já analisado e validado pelo Tribunal de Contas da União, mas com redução de escopo: dos 21 itens contratados pelo ministério, 15 são objeto da licitação do STF”.