Suspeito de golpe: “Quatro linhas (da Constituição) é o caralho”
General Mario Fernandes, preso nesta terça-feira (19/11), trocou mensagens com militares sobre temas antidemocráticos com teor golpista
atualizado
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O general de brigada Mario Fernandes, preso nesta terça-feira (19/11) pela Polícia Federal durante a Operação Contragolpe por participação em uma organização criminosa que teria planejado um golpe de Estado em 2022, trocou mensagem com outros militares sobre temas antidemocráticos e/ou relacionados aos ideários golpistas.
Entre os oficiais investigados, consta o então chefe de gabinete do general, Reginaldo Vieira de Abreu, apelidado de “Velame”. Ele afirmou: “Quatro linhas [da Constituição] é o caralho. Quatro linhas da Constituição é o caceta”.
A troca de mensagem ocorreu em 5 de novembro em 2022 e faz referência a um jargão frequentemente utilizado por Jair Bolsonaro para se referir a uma atuação dentro dos parâmetros de legalidade (“quatro linhas”).
“O senhor me desculpe a expressão, mas quatro linhas é o caralho. Quatro linhas da Constituição é o caceta. Nós estamos em guerra, eles estão vencendo, está quase acabando, e eles não deram um tiro por incompetência nossa. Incompetência nossa, é isso. Estamos igual ao sapo, na história do sapo na água quente. Você coloca o sapo na água quente, ele não sente a temperatura da água mudar e vai se aumentando, aumentando, aumentando… Quando vê, ele tá morto. É isso”, disse Reginaldo.
Velame demonstrou preocupação após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno das eleições presidenciais e chegou a dizer que “tem que ter a primavera brasileira”, em referência à Primavera Árabe — série de protestos antigovernamentais, revoltas e rebeliões armadas que se espalharam por grande parte daquela região no início da década de 2010.
O general de brigada Mario Fernandes ainda trocou mensagens com o capitão Sérgio Rocha Cordeiro, assessor da Presidência da República durante o governo de Jair Bolsonaro.
Mario Fernandes, segundo análise da Polícia Federal, informa ao capitão que buscou realizar contatos com o coronel Marcelo Câmara — ex-assessor de Bolsonaro — e envia supostas provas de que poderiam influenciar decisões estratégicas. Mario acrescenta que falou com o ministro da Justiça e, no fim, expõe a preocupação de muita gente “jogar a toalha”, ou seja, desistir de seguir adiante com os intentos golpistas.
Envolvimento de Bolsonaro
Ainda segundo a apuração, o então presidente Bolsonaro redigiu, ajustou e “enxugou” a chamada “minuta do golpe”, uma espécie de decreto que previa a intervenção no Poder Judiciário para impedir a posse de Lula e convocar novas eleições.
A PF concluiu que Bolsonaro é o responsável por redigir e ajustar “a minuta do ilegal decreto golpista” mediante a análise de mensagens encaminhadas por Mauro Cid, seu ajudante de ordens, para o general Freire Gomes, então comandante do Exército.
Em uma das mensagens, afirmou-se que o então presidente estaria sofrendo “pressões para tomar uma medida mais pesada”, com o uso de forças, por parte de “deputados”.
Também de acordo com a investigação, Mauro Cid indicou, nos textos a Freire Gomes, que Bolsonaro “enxugou o decreto” e o tornou “mais resumido”.
Operação Contragolpe
De acordo com as investigações da PF, o grupo planejou a prisão e morte do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e a execução — marcada para o dia 15 de dezembro de 2022 — dos candidatos eleitos Lula e Geraldo Alckmin. No total, cinco mandados de prisão foram cumpridos pela PF na manhã desta terça-feira (19/11).
Os presos são:
- Coronel Hélio Ferreira Lima: comandava a 3ª Companhia de Forças Especiais, em Manaus, e foi destituído do cargo em fevereiro deste ano;
- Mario Fernandes: general e ex-ministro interino da Secretaria-Geral e secretário-executivo da PR. Atualmente, ele é reformado e assessor do deputado Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde;
- Rafael Martins de Oliveira: major das Forças Especiais do Exército. Acusado de negociar com o coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, o pagamento de R$ 100 mil para custear a ida de manifestantes a Brasília;
- Major Rodrigo Bezerra de Azevedo;
- Policial federal Wladimir Matos Soares.
Todos os presos, à exceção do policial federal Wladimir Matos Soares, são os chamados “kids pretos”, termo utilizado como apelido para se referir aos militares de elite, em ativa ou não.
Os agentes federais também cumprem três mandados de busca e apreensão e 15 medidas cautelares diversas da prisão – que incluem a proibição de manter contato com os demais investigados, a proibição de se ausentar do país, com entrega de passaportes no prazo de 24 horas, e a suspensão do exercício de funções públicas.
O Exército Brasileiro acompanhou o cumprimento dos mandados em ações no Rio de Janeiro, em Goiás, no Amazonas e no Distrito Federal.