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Rosa Weber sobre o orçamento secreto: “Não se observam regras de transparência”

Se mantido, o orçamento secreto distribuirá, no próximo ano, R$ 19,4 bilhões em emendas parlamentares sem transparência

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Fellipe Sampaio/SCO/STF
A ministra do STF, Rosa Weber, durante sessão no plenário do Tribunal. Ela olha para frente - Metrópoles
1 de 1 A ministra do STF, Rosa Weber, durante sessão no plenário do Tribunal. Ela olha para frente - Metrópoles - Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quarta-feira (14/12), o julgamento de ao menos quatro ações que questionam a constitucionalidade das emendas de relator, conhecidas popularmente como orçamento secreto. O tema começou a ser analisado no plenário do Supremo na última quarta, quando advogados fizeram suas sustentações orais e amicus curiae se pronunciaram.

Veja como foi:

A relatora, Rosa Weber, foi a única a votar. O julgamento será retomado na quinta (15/12). Em uma das críticas feitas ao sistema, a magistrada afirmou que “não se sabe quem são os parlamentares, as quantias e não existem critérios objetivos para realização das despesas, tampouco observam regras de transparência”.

Os 11 integrantes da Corte vão decidir se a Constituição permite a destinação de bilhões de reais em verbas públicas para parlamentares, com pouca transparência. Ficará estipulado se o Poder Legislativo pode definir como gastar essa verba sem que as despesas estejam necessariamente vinculadas a políticas públicas formuladas por ministérios e outros órgãos do Executivo, como ocorre com as emendas usuais.

Oficialmente chamados emendas de relator, esses repasses viraram moeda de negociação política do Executivo com o Legislativo ao longo do governo de Jair Bolsonaro (PL). No Orçamento de 2023, são empenhados R$ 19,4 bilhões para esse fim.

Entenda o que é e como funciona o orçamento secreto

Nas ações que serão julgadas, PSol, PV, Cidadania e PSB alegam que falta transparência nessas emendas, pois não são divulgadas informações sobre quem libera os recursos, para quais fins e sob quais critérios. Para os autores dos processos, as emendas com dados ocultos ofendem os princípios da transparência, da publicidade e da impessoalidade, que estão previstos na Constituição. Elas podem, inclusive, ser usadas para agradar aliados, já que não precisam ser justificadas ou explicadas.

Julgamento

Na última quarta-feira (7/12), os defensores dos partidos reforçaram os argumentos das ações, e os advogados da Câmara e do Senado, além do advogado-geral da União, defenderam a legalidade das emendas de relator.

“O texto constitucional não veicula mandamento proibitivo à criação de mecanismos que ampliem a influência do Poder Legislativo sobre a execução orçamentária”, argumentou o chefe da AGU, Bruno Bianco, em nome do governo federal.

Representantes de entidades da sociedade civil também se manifestaram. Foi o caso do advogado Marlon Reis, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. Ele, que é o idealizador da Lei da Ficha Limpa, disse que o orçamento secreto fere cláusulas pétreas da Constituição e “nasceu da fragilidade de um presidente da República que, não tendo aptidão para governar, desistiu de tentar e delegou os rumos da nação ao Congresso”.

Ainda segundo Marlon Reis, Bolsonaro, ao facilitar o orçamento secreto, “oficializou um mensalão desavergonhado, fratricida e lesa-pátria”.

Em nome da Procuradoria-Geral da República (PGR), a vice-procuradora geral, Lindôra Araújo, declarou que defendeu a legalidade do modelo de emendas de relator.

Ela criticou os discursos dos críticos ao orçamento secreto, que chamou de “políticos”. “Aqui estamos falando da transparência das emendas de relator, que foi garantida. Não estamos falando de eventuais ilícitos”, argumentou.

Investigações

Essa falta de transparência levou a desvios de verbas identificados em investigação da Polícia Federal. Um esquema revelado em outubro deste ano expôs que prefeituras de cidades pequenas do Maranhão mentiam sobre a quantidade de atendimentos médicos, para ter acesso a mais recursos.

Algumas localidades informaram que cada médico da cidade faria, em média, 450 consultas por dia, o que é impossível. Por causa desse esquema, R$ 78 milhões foram bloqueados nas contas das prefeituras de 20 cidades e, até hoje, não se sabe quem liberou as verbas – pois isso ficou oculto.

Idas e vindas do orçamento secreto

O que veio a ser conhecido como orçamento secreto nasceu em 2019, com o nome de “emendas de relator” ou “RP-9”. Tratou-se de uma investida do Legislativo federal sobre verbas que antes eram manuseadas por órgãos do Poder Executivo. Emendas parlamentares sempre existiram, mas, no orçamento secreto, os repasses foram ficando cada vez maiores e comprometiam mais expressivamente o orçamento do governo federal.

Pressionado sobre o tema ao longo da campanha presidencial de 2022, o presidente não reeleito Jair Bolsonaro (PL) costumava dizer que não tinha poder sobre o orçamento secreto e que, inclusive, era contra, tendo vetado o dispositivo em 2020. Após pressão dos parlamentares, no entanto, restituiu o orçamento secreto por lei.

Bolsonaro vetou o orçamento secreto quando sancionou o Orçamento de 2020; os parlamentares até tentaram derrubar o veto, mas não conseguiram, por falta de votos. Ainda em 2019, após negociação com os líderes do Congresso, o então ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, encaminhou ao Congresso um projeto de lei que recriava as emendas vetadas. O texto foi aprovado em votação simbólica.

Mesmo após o orçamento secreto ter virado lei, o governo federal continuou exercendo poder sobre as liberações, como mostra o recente bloqueio imposto por Bolsonaro, que coincidiu com um acordo entre Arthur Lira e o PT, do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

A questão já foi discutida na Justiça, e o orçamento secreto chegou a ser proibido, mas a pressão dos parlamentares reverteu a situação. No fim de 2020, a ministra Rosa Weber proibiu, em liminar, a continuação da distribuição das emendas sem transparência; meses depois, porém, a magistrada cedeu a pedidos dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e recuou da proibição, definindo que os repasses poderiam voltar se tivessem mais transparência.

Essa decisão, no entanto, não foi integralmente cumprida pelo Congresso. Isso porque apenas cerca de 400 parlamentares enviaram documentos que os vinculavam à liberação de verbas do orçamento secreto, mas esses dados abarcaram menos de um terço dos R$ 37 bilhões liberados no período. Os quase R$ 20 bilhões restantes seguiram secretos.

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