Sociedade de Espeleologia critica decreto sobre exploração de cavernas
A instituição disse ainda que, para alterar a legislação sobre utilização de cavidades naturais subterrâneas, o governo não a consultou
atualizado
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A Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE) se manifestou sobre a alteração feita, pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), na legislação sobre a proteção das cavidades – ou cavernas – naturais subterrâneas existentes no território nacional.
Além de não ter sido consultada para a mudança, a instituição demonstrou desaprovação ao novo projeto e afirmou que o decreto representa retrocesso à legislação espeleológica nacional.
Veja a íntegra do comunicado:
“A SBE reforça que não foi convidada para contribuir ou para integrar grupos de discussão acerca desta modificação substancial da legislação espeleológica brasileira. O Decreto Federal no 10.935/2022 foi produzido a portas fechadas, sem diálogo com a comunidade espeleológica e, claramente, mostra a interferência direta dos Ministérios de Estado de Minas e Energia e de Infraestrutura em uma matéria que é de interesse ambiental.
Esta interferência visa à facilitação de licenciamento de obras e atividades potencialmente lesivas ao patrimônio espeleológico nacional e que, geralmente, estão associadas a atividades de alto impacto social. Assim, a Sociedade Brasileira de Espeleologia considera inconstitucional o Decreto Federal no 10.935, de 12 de janeiro de 2022.
Reforçamos nosso total repúdio a este decreto e esperamos que o Governo Federal ouça a comunidade espeleológica, pesquisadores, pesquisadoras e as diversas instituições científicas que desenvolvem estudos nas cavernas brasileiras e que realmente podem contribuir para uma legislação espeleológica que, verdadeiramente, concilie o uso dos recursos que são essenciais para a nossa sociedade com a proteção deste patrimônio natural”.
Para a SBE, o novo Decreto nº 10.935/2022:
- Permite que o órgão ambiental licenciador autorize a destruição total ou parcial de cavernas de máxima relevância por atividades ou empreendimentos considerados “de utilidade pública”;
- Excluí dos atributos que classificam uma cavidade subterrânea como de máxima relevância as condicionantes morfologia única, isolamento geográfico, interações ecológicas únicas, cavidade testemunho e hábitat essencial para preservação de populações geneticamente viáveis de espécies de troglóbios endêmicos ou relictos;
- Possibilita que o empreendedor solicite a revisão, a qualquer tempo, da classificação do grau de relevância de cavidade natural subterrânea, independentemente do seu grau de relevância, tanto para nível superior quanto para nível inferior;
- Possibilita que o empreendedor compense o impacto sobre uma cavidade subterrânea com a preservação de uma cavidade testemunho qualquer, sem ter o conhecimento sobre a real relevância desta caverna que está sendo preservada; e
- Deixa aberta a possibilidade do Ministro de Estado de Minas e Energia e do Ministro de Estado de Infraestrutura realizar modificações em atributos ambientais similares da classificação de relevância e definir outras formas de compensação através de atos normativos (Art. 8º).
A especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama Suely Araújo também observa que o conteúdo do decreto era esperado. Segundo ela, é mais uma das “boiadas adotadas para enfraquecer o rigor da legislação” voltada à proteção do meio ambiente.
“É certo que [a alteração] prevê medidas compensatórias, mas essa redação é extremamente mais flexível do que a constante no decreto revogado”, salienta Suely. “Admite expressamente impactos negativos irreversíveis nas cavidades naturais subterrâneas com grau de relevância máximo nos casos de empreendimentos de utilidade pública, remetendo à lista da Lei Florestal”, observa a especialista.
“Exploração responsável”
Segundo comunicado enviado pela Secretaria-Geral da Presidência da República, o dispositivo visa a “disciplina” da proteção de cavidades naturais subterrâneas. O comunicado também fala em “aprimoramento” da legislação de cavidades, “permitindo a exploração responsável” e “garantindo a preservação ambiental”.
Como justificativa para a regulamentação, o presidente também defende que o novo entendimento cria a possibilidade de exploração mineral, de “modo eficiente e sustentável”, e que com isso, serão gerados cerca de 138 mil empregos diretos e indiretos e de incremento de R$ 2 trilhões do PIB brasileiro, segundo o governo.