Só a vacinação não basta: vice-presidente do Conass pede medidas adicionais para frear pandemia
Vice-presidente do Conass avalia que governo federal deve implementar novas estratégias para evitar recrudescimento de casos
atualizado
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O avanço da vacinação contra a Covid-19 no país resulta em números cada vez mais positivos. Na última quinta-feira (7/10), a média móvel de mortes diárias pela doença ficou em 437,3, que corresponde à menor taxa desde novembro de 2020.
Além disso, até a noite de quinta, 97,2 milhões de brasileiros estavam totalmente imunizados, ou seja, vacinados com as duas doses ou com a aplicação única. O número equivale a 45,57% da população do país.
Outro dado positivo é a porcentagem de pessoas vacinadas com ao menos uma dose. Elas representavam 69,78% da população brasileira até a última quinta-feira. O número equivale a 148,8 milhões de pessoas.
Apesar de otimista, o cenário ainda é de alerta. Em entrevista ao Metrópoles, o vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e secretário de Saúde do Espírito Santo, Nésio Fernandes, avalia que o governo deve criar medidas complementares para evitar novo aumento no número de casos e óbitos.
Para o gestor, cabe ao Ministério da Saúde apoiar estados e municípios na adoção de práticas como a obrigatoriedade de uso de máscara e apresentação de passaporte sanitário. As medidas, contudo, são duramente criticadas pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
Internações
Levantamento feito pelo Metrópoles mostra que 74% das pessoas internadas com Covid-19 entre julho e setembro não tinham completado o esquema vacinal.
Os números também indicam que apenas 26% das pessoas internadas durante o período já estavam totalmente imunizadas, com duas doses ou dose única de vacinas contra o coronavírus.
Além disso, uma pequena porcentagem dos pacientes internados (1,9%) é formada por pessoas que receberam as duas doses ou dose única do imunizante, mas foram hospitalizadas antes dos 14 dias necessários para imunização completa.
Os índices foram coletados do banco de dados de Síndrome de Respiratória Aguda Grave (SRAG), mantido pelo Ministério da Saúde.
Nesse arquivo, estão registradas todas as ocorrências de SRAG. Para a reportagem, foram mantidas apenas as informações relacionadas aos casos confirmados de Covid-19 que levaram à internação.
A base de dados tem suas limitações. Não é em todas as internações que a equipe médica consegue confirmar que a vacina foi aplicada. Casos em que a informação foi marcada como ignorada foram descartados.
Bem coletivo
Em entrevista ao Metrópoles, Nésio Fernandes, que também é médico sanitarista, enfatiza que, por mais que o país atinja bons níveis de cobertura vacinal, os indivíduos não imunizados ainda correm perigo de serem contaminados pelo vírus e terminarem hospitalizados.
“À medida que parte da população ainda se recusa a ser vacinada, além do risco aumentado, ela se beneficia menos da cobertura vacinal que ocorre quando você circula no meio de pessoas que estão vacinadas”, explica.
O médico ressalta que esses indivíduos também colocam em risco a saúde de pessoas que já foram imunizadas com as duas doses, já que nenhuma vacina é 100% eficaz contra a doença. É o caso de idosos e imunossuprimidos, que têm saúde fragilizada.
Por isso, além de incentivar a vacinação de quem ainda não procurou os postos de saúde, é importante que os gestores atuem fortemente na aplicação das doses de reforço.
Além disso, apesar de a maior parte da população brasileira aderir às campanhas de imunização, existem pequenos grupos que se recusam a buscar os postos de saúde para se vacinar.
“As pesquisas de opinião afirmam que 90% das pessoas querem ser vacinadas. Vai chegar um momento em que muitas pessoas vão tomar a D1 e vão abandonar a D2, por questões como fake news, posicionamentos políticos. Essas pessoas estão mais suscetíveis do que as que completaram o esquema”, frisa.
Medidas compulsórias
De acordo com o médico, cabe ao governo criar estratégias para incentivar a vacinação dos grupos que ainda não foram imunizados com nenhuma dose. “Chega um momento em que o Estado precisa adotar medidas compulsórias, ou a gente não vai conseguir avançar para além da adesão espontânea”, pontua.
Ele cita que o estado do Espírito Santo adotou, em fevereiro, o passaporte sanitário para entrada em estabelecimentos públicos de saúde. O resultado foi positivo, conforme destaca Nésio. Para o sanitarista, a medida deve ser implementada em todos os ambientes de tutela do Estado.
“Nós obrigamos, em fevereiro deste ano, o comprovante de vacinação para entrar em qualquer estabelecimento de saúde público, seja funcionários do administrativo ou assistencial, o trabalhador deveria confirmar que estava imunizado. Praticamente todos foram vacinados, porque havia uma norma complementar que estimulou a imunização. O mesmo deve se encaminhar como pré-requisito para trabalhar em outros segmentos públicos e em situações como a matrícula escolar, por exemplo. A visita de pessoas não vacinadas em ambientes de tutela do Estado precisa ser normatizada”, pontua.
Acesso à vacinação
Nésio também assinala que, além dos grupos que decidiram não se vacinar por posicionamentos políticos, há pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade e não têm fácil acesso às unidades de saúde.
Ele pontua que uma estratégia interessante para sanar o problema seria adotar a imunização em pontos de alto fluxo, como rodoviárias e estações de transporte público. Nésio explica que esse tipo de ação é chamada de “vacinação de oportunidade”.
“Parte da vacinação não foi de fácil acesso àquele trabalhador da zona rural ou da construção civil, e a trabalhadores que têm atividade informal e não conseguem tirar um período do dia para ir até uma fila de vacina. A imunização em pontos de alto fluxo é uma das estratégias aumentadas para garantir uma vacinação de oportunidade, na qual a pessoa está indo pro trabalho e pode ser vacinada”, conta.
Resistência
Apesar de defendidas pelos especialistas, medidas como o chamado passaporte sanitário e a obrigatoriedade do uso de máscaras de proteção facial são duramente criticadas pelo ministro Marcelo Queiroga. Na sexta-feira, durante visita a um hospital no Piauí, disse ser “absolutamente contrário” às normas restritivas.
“Passaporte disso, passaporte daquilo. Meus amigos, a população brasileira em breve vai estar toda vacinada. Todos vão ter esse passaporte. Eu mesmo, vacinado com duas doses — não estou querendo desacreditar as vacinas — adquiri a Covid. [Sou] absolutamente contrário a essas leis”, declarou o titular da Saúde.
Para o vice-presidente do Conass, entretanto, essas estratégias são de extrema importância para manter baixos os níveis de óbitos, casos positivos e internações por Covid-19. O sanitarista ressalta que o apoio do governo federal na adoção de medidas complementares é imprescindível.
“São debates cotidianos no Conass. Entendemos que o Ministério da Saúde precisa legitimar e dar força para que estados e municípios consigam adotar essas medidas complementares”, conclui.
O que diz o Ministério da Saúde
A reportagem procurou o Ministério da Saúde para verificar se o órgão implementa estratégias para incentivar os cuidados pós-vacinação e evitar hospitalizações de pacientes com Covid-19.
Também foi questionado o número de pessoas que ainda não tomaram a segunda dose da vacina contra a Covid-19 e estão com a imunização atrasada.
Em nota, o órgão informou que “reforça a importância da primeira e segunda dose para garantir a máxima proteção dos brasileiros, principalmente contra as novas variantes”.
“A pasta continua com sua campanha massiva de incentivo à imunização nacional e à importância da segunda dose e recomenda aos estados e municípios que também façam uma busca ativa da população-alvo”, divulgou a pasta.
Além disso, o Ministério da Saúde informou que cerca de 18,6 milhões de pessoas ainda não tomaram a segunda dose da vacina contra a Covid-19.