Sem Teich há 10 dias, Ministério da Saúde abandona pedidos de isolamento
A última recomendação foi dia 12. De lá para cá, a pasta passou a sugerir isolamento apenas de doentes e limitação na leitura do noticiário
atualizado
Compartilhar notícia
Dez dias após a saída do oncologista Nelson Teich do comando do Ministério da Saúde, a pasta abandonou completamente os pedidos de isolamento e distanciamento social. O “blackout” é alvo de críticas de infectologistas.
A última recomendação sobre a estratégia ocorreu em 12 de maio. Teich, ainda ministro, afirmou que o governo queria definir diferentes tipos de isolamento social para os lugares a partir do nível de risco em cada região do país.
A partir da sua saída, no dia 15 de maio, a recomendação não teve sequência. Vídeos explicativos passaram a pregar que apenas pessoas contaminadas fiquem isoladas e que as famílias limitem o tempo diário que elas dedicam a ler ou assistir noticiários. Veja abaixo:
Neste período de distanciamento social, manter hábitos saudáveis pode melhorar seu bem-estar físico e mental. Confira nossas dicas sobre o que fazer para ter um dia a dia com menos estresse em casa?
Saiba mais: https://t.co/UYm3jliCGA pic.twitter.com/6BLQGA1sfW— Ministério da Saúde (@minsaude) May 23, 2020
O isolamento social é alvo de duras críticas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e contribuiu para as trocas na chefia da pasta. Bolsonaro defende que somente pessoas do grupo de risco fiquem em casa. Ele atribui as complicações econômicas, como desaceleração do crescimento, ao distanciamento.
Teich deixou o governo federal em 15 de maio. Ficou menos de um mês no cargo. Sob sua gestão, as entrevistas coletivas foram esvaziadas e ficaram cada vez mais escassas. À época de Luiz Henrique Mandetta, médico ortopedista que por mais tempo chefiou a pasta no governo Bolsonaro, as atualizações eram diárias.
O novo ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, nunca comandou a atualização dos casos de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Além disso, a pasta mudou a forma de divulgar os números. Antes, a divulgação dos casos e as entrevistas coletivas ocorriam ao mesmo tempo. Agora, primeiro ocorre a entrevista — que tem sido disponibilizada com técnicos da pasta — e depois, o balanço de mortos e infectados. Nesse formato, a chance de haver perguntas sobre os números novos é zerada.
Desde a saída de Teich, ocorreram quatro entrevistas específicas com a equipe técnica da Saúde, que, entre outros assuntos, falou de atendimento psicológico para profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) e da contratação de profissionais, por exemplo. Neste meio tempo, outros ministérios também trataram do tema, como o da Economia e o da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.
Críticas
A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), uma das principais entidades no controle da pandemia no território nacional, defende que o isolamento é a única forma de controlar a Covid-19.
O infectologista Leonardo Weissmann, consultor da SBI, defende a medida. “O número de casos e óbitos não para de aumentar, ainda não temos medicação nem vacina comprovadamente eficaz e, além disso, não temos testes para toda a população, o que possibilitaria isolar somente os doentes e comunicantes. Sendo assim, o distanciamento físico ainda é essencial para diminuirmos a velocidade de propagação do vírus”, explica.
O diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José Davi Urbaez, concorda e afirma que comportamentos contrários ao isolamento, como a realização de manifestações, aumenta o risco de adoecimento.
“Sempre que se aumenta a circulação de pessoas, isso segue de aumento significativo da circulação viral. Um infectado pode infectar de duas a três pessoas suscetíveis, em aglomerações isso pode ser até seis ou sete pessoas. Assim, haverá uma escalada no número de casos, e essa escalada é exponencial: três, nove, 27, 81, 243, 729”, frisa.
Nessa segunda-feira (25/05), Michael Ryan, diretor de operações de emergência da Organização Mundial da Saúde (OMS), afirmou, referindo-se ao Brasil, que o isolamento exige o “envolvimento de todo o governo e de toda a sociedade”. “O vírus não some por si só”, criticou.
Manifestações
Entre as atitudes de Bolsonaro que são condenáveis por especialistas, está o apoio e a participação em manifestações, o que gera aglomeração. A mais recente ocorreu nesse domingo (24/05), na Praça dos Três Poderes, em Brasília, e contou, contraditoriamente, com a participação do ministro da Saúde.
Bolsonaro não falou sobre os riscos. O ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, saiu na defesa do governo. “Isso é gente que está aqui espontaneamente. O governo que trazia gente aqui era do PT. Viemos por que respeitamos as pessoas que votaram na gente e merecem nossa atenção”, reclamou.
O Metrópoles questionou o Ministério da Saúde sobre a falta de recomendações para o isolamento social, mas não obteve resposta. O espaço continua aberto a esclarecimentos.