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Segurança de co-vereadoras expõe fragilidade jurídica de mandatos coletivos

Câmara Municipal de São Paulo negou ceder guardas para a segurança de co-vereadoras ameaçadas porque elas não são titulares do cargo

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Quilombo-Periferico
1 de 1 Quilombo-Periferico - Foto: Divulgação

São Paulo – Na abertura da primeira sessão da Câmara Municipal de São Paulo, no dia 2 de fevereiro, o presidente da casa, o vereador Milton Leite (DEM), defendeu as decisões da Câmara para proteger vereadores que relatam ameaças.

Uma decisão da Mesa Diretora da Câmara Municipal de São Paulo do dia 1º de fevereiro aprovou medidas extras de segurança apenas para a vereadora Erika Hilton (PSol). Ela terá a disposição dois guardas civis metropolitanos do quadro de funcionários da Casa para sua escolta. Hilton relata que foi intimidada em seu gabinete e move ação contra agressões transfóbicas nas redes sociais.

No entanto, as co-vereadoras Carolina Iara, da Bancada Feminista (PSol), e Samara Sosthenes, do Quilombo Periférico (PSol), não receberão o mesmo benefício. As residências delas foram alvos de tiros, mas elas tiveram o pedido de reforço de segurança rejeitado porque não são oficialmente titulares de seus mandatos.

“Li na imprensa que alguns componentes das bancadas coletivas foram às redes sociais e disseram que estão abandonadas para serem mortas. Que absurdo. Legalmente, só podemos oferecer a proteção dos nossos guardas municipais aos vereadores titulares, ou seja, os reconhecidos pela Justiça Eleitoral”, afirmou Milton Leite.

Elaine Mineiro, vereadora titular do coletivo Quilombo Periférico, discorda. “Precisamos de ações efetivas que garantam o direito das co-vereadoras de exercer suas funções. Nossas co-vereadoras são legalmente funcionárias. Mesmo que elas não fossem parlamentares, elas foram ameaçadas por conta da função que exercem aqui. Por isso, é urgente repensar a segurança delas.”

Status de co-vereador e limites legais

Milton Leite afirma que a falta de reconhecimento legal e de regulação não favorece os mandatos coletivos.

“Só podemos executar ações mediante as normas já existentes. Entendo que a proposta de mandatos coletivos deva ser aperfeiçoada pelo Congresso Nacional”, declarou Leite, que sugeriu que os mandatos coletivos buscassem alternativas de segurança em outras instâncias públicas “porque é dever do Estado proteger todo cidadão”.

Em geral, num mandato coletivo, um dos integrantes é escolhido para representar o grupo perante a Justiça Eleitoral. Esse integrante é o titular do cargo e diplomado pela Justiça. Nas sessões, ele quem carrega a função de porta-voz do grupo.

Os demais integrantes do mandato coletivo são chamados informalmente de co-vereadores ou co-deputados, mas formalmente são nomeados assessores do titular do cargo.

Co-vereadores não podem discursar na tribuna, assinar projetos de lei ou votar. Caso o titular precise se ausentar do mandato, ele é substituído por um suplente, não por seus colegas.

A situação de um assessor carregar o status de parlamentar está fora de sintonia com a legislação vigente e que, segundo Milton Leite, pode levar a interpretações diversas e fazer uma confusão de privilégios.

“As ameaças às co-vereadoras são muito graves. Fico triste porque não dispomos de mecanismo para assistí-las. Mas, veja, eu tenho assessores que também foram perseguidos. Nunca usamos desse mecanismo [mandato coletivo] e não acusamos a Câmara de omissão. Não abandonei e não virarei as costas”, declarou incomodado em ser acusado de descaso.

Como solução, Milton Leite sugere que a segurança de funcionários (ou co-vereadores) ameaçados de violência política se torne pauta da casa. “A Comissão de Direitos Humanos poderá exercer um relevante papel para discutir essa matéria.”

PSol defende legitimidade dos mandatos coletivos

Nas últimas eleições, 27 candidaturas para o cargo de vereador em São Paulo eram chapas de coletivos. Destas, duas foram eleitas: o coletivo Quilombo Periférico e a Bancada Feminista. Os dois mandatos são do PSol, que vem apostando no formato, e elegeu outros sete coletivos pelo Brasil em 2020.

Segundo o estudo “Mandatos coletivos: Desafios e possibilidades para a representação legislativa no século XXI”, de autoria da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), a aceitação ao modelo coletivo só aumenta entre os eleitores. Em 1994, apenas dois mandatos assim foram eleitos no Brasil e esse número subiu para 22, em 2018.

Para os parlamentares do PSol, o número expressivo de votos para os eleitos confere legitimidade aos mandatos coletivos. O Quilombo Periférico conta com seis integrantes e recebeu 22.742 votos. A Bancada Feminista tem cinto integrantes e conquistou 46.267 votos —a 7ª maior votação da cidade.

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Integrantes do Quilombo Periférico, um dos coletivos eleitos para a Câmara Municipal de São Paulo
Covereadores do Quilombo Periférico trabalham enquanto Elaine Mineiro, titular do mandato, está na sessão plenária
Bancada Ativista no início de seu mandato na Alesp
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“Aberração jurídica”

“Mandato coletivo não existe e é aberração jurídica que deve ser exterminada”, declara o vereador Rubinho Nunes (Patriota). Conhecido como “o advogado do MBL (Movimento Brasil Livre)”, Nunes tem o fim dos mandatos coletivos como uma de suas pautas prioritárias.

No dia 9 de janeiro, o vereador pediu um parecer à Procuradoria da Câmara Municipal de São Paulo sobre os mandatos coletivos. A Procuradoria respondeu na quarta-feira (3/2). O órgão “não reconhece a existência de co-vereadores, uma vez que os mandatos de vereadores têm caráter individual e tal figura inexiste no ordenamento jurídico brasileiro”.

“Isso é uma invenção da esquerda para tentar dar um ar de coletividade, um ar cool para mandatos completamente irrelevantes. Junto com o deputado Kim Kataguiri (DEM), vou levar isso ao TSE. Isso é um estelionato eleitoral. Os vereadores votam em diversas pessoas, mas na verdade estão elegendo apenas uma”.

Elaine Mineiro, do Quilombo Perifério, rebate. “Esse não é um processo de confusão. Os 69 mil eleitores que votaram e confiaram o seu voto em mandatos coletivos não estão confusos, não estão enganados, e precisam ser respeitados.”

Nunes afirma que seu esforço é técnico, até porque, na opinião dele, “mandato coletivo é algo tão forçado, que nem os próprios se aguentam. Uma codeputada foi demitida da Bancada Ativista. Como se “demite” um deputado sem processo de cassação? Se foi demitido, nunca foi nem deputado”, afirma Rubino Nunes.

De fato, sem reconhecimento oficial, o titular do mandato coletivo não tem nenhuma obrigação legal de obedecer as decisões tomadas pelo grupo. Ele até pode destituir integrantes, mesmo que eleitores tenham dado preferência pelo coletivo por conta do integrante destituído.

Regulação e resposta do eleitor

Uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 379, de autoria do Podemos prevê regulamentação dos mandatos coletivos, mas está parada na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados desde 2017.

De acordo com artigo de Leonardo Leal, professor de administração pública da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e estudioso do tema, o crescimento dos mandatos coletivos são uma resposta do eleitor insatisfeito com o sistema de representação por partidos políticos tradicionais.

Segundo Leal, a dinâmica tradicional “resulta em baixo desempenho político somado a um alto nível de corrupção, além do declínio da capacidade dos principais partidos em representar os novos conflitos e preferências.”

Como reação, o eleitor busca uma reforma política à sua maneira, elegendo os mandatos coletivos e, ironicamente, os candidatos de movimentos suprapartidários, como é o caso do próprio Rubinho Nunes, ligado ao MBL.

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