São Paulo faz homenagem aos que ajudaram vítimas do ataque em Suzano
O prefeito do município, alunos, professores, diretores, policiais, merendeiras e servidores de hospitais receberam medalhas e diplomas
atualizado
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O governador de São Paulo, João Doria, homenageou com medalhas e diplomas, o prefeito de Suzano, Rodrigo Ashiuchi, alunos, professores, diretores, policiais, merendeiras e servidores de hospitais que se destacaram no enfrentamento, proteção, socorro e amparo as vítimas do ataque à Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano.
No dia 13 deste mês, a escola foi atacada por dois ex-alunos que mataram a tiros cinco estudantes e duas professoras. Quando a polícia chegou, um deles matou o companheiro e se suicidou. Antes de invadir a escola, os atiradores mataram o tio de um deles. Onze pessoas ficaram feridas no tiroteio. Apenas um adolescente de 15 anos permanece internado na enfermaria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O estado dele é estado estável.
Nessa quinta-feira (28/3), foram homenageadas 29 pessoas ou instituições, que receberam a Medalha MMDC Caetano de Campos, a maior honraria na área da educação concedida pelo governo paulista. O nome da medalha lembra os mártires da Revolução Constitucionalista de 1932: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo (MMDC).
“Sei que esse gesto do governo não traz vidas de volta, mas reconhece o apoio daqueles que ajudaram a evitar que a tragedia fosse ainda maior”, disse Doria, após pedir um minuto de silêncio aos presentes em homenagem às vítimas. Para o governador, o que ocorreu em Suzano foi um “fato totalmente inusitado e inesperado”, que vai exigir, além de ações nas área de segurança e de educação, um maior diálogo dos pais com seus filhos. “Que todos possamos compreender que o diálogo que estabelecemos com nossos filhos é de fundamental importância”, afirmou Doria. “O diálogo em casa, a relação familiar, a oportunidade de dialogar, de ponderar e de orar, além de medidas no âmbito da psicologia, da segurança e da educação vão contribuir para que tragédias como essa jamais aconteçam”, acrescentou.
O secretário estadual de Educação, Rossieli Soares, chamou a todos os homenageados de “heróis e heroínas” e “símbolos de superação”. “Esta é maior honraria concedida na área de educação [em São Paulo] para reconhecer pessoas que tenham tido ou realizado algo para a sociedade, especialmente na educação”, disse o secretário.
Para Rossielli, o que ocorreu em Suzano não é apenas um problema da escola ou da segurança. “As pessoas perguntam se o que aconteceu em Suzano é um problema de segurança, de educação, ou que tipo de problema é esse. Não é um problema da escola, não é um problema meramente de segurança. Isso vai muito além, e nós precisamos olhar cada vez mais para a raiz do que aconteceu, porque não podemos deixar passar em branco toda essa tragédia.”
Militarização
Em entrevista coletiva nesta quinta-feira, Rossieli negou que haja algum projeto para militarizar a Escola Raul Brasil. “Não temos nenhum projeto de militarização da escola. Temos um projeto de conversar com a escola e com a comunidade e, juntos, escolher os passos. Se este for um caminho que a comunidade e a escola construam, poderemos discutir, mas acho que é muito cedo para esse tipo de discussão. Estamos primeiro preocupados com as pessoas”, afirmou o secretário.
O governador João Doria ressaltou que a escola é segura, apesar de alunos, pais e professores se sentirem ainda bastante preocupados. “A escola foi reaberta, a escola é segura, tem monitoramento eletrônico, como já tinha anteriormente. Ela tem a ronda policial da PM [Polícia Militar] e da Guarda Municipal. Essa atenção foi discutida e debatida com os gestores da escola e a Secretaria de Educação. O que precisamos é manter essa relação estreita e próxima com os pais e com os próprios alunos para que, gradualmente, essa instabilidade emocional possa passar.”
Os homenageados
Entre os que receberam medalhas e diplomas do governo paulista estão as merendeiras que protegeram cerca de 50 alunos dentro da cozinha durante o tiroteio; a aluna que lutou com um dos atiradores; o policial vizinho da escola, que estava de licença médica e foi ao local à paisana, após ouvir os primeiros tiros; representantes de hospitais que ofereceram atendimento médico às vítimas; e policiais da Força Tática que chegaram rapidamente ao local.
A merendeira Silmara Cristina Silva de Moraes, de 49 anos, foi uma das homenageadas. A atuação dela no dia do ataque ficou bem conhecida: ela conseguiu proteger dezenas de alunos, fechando-os na cozinha e montando uma espécie de barricada com freezer e geladeiras. Silmara contou que, naquele dia, agiu por um instinto de amor. “Tudo o que fizemos ali, dentro daquela cozinha, foi um ato de amor porque nós trabalhamos por amor”, afirmou hoje a merendeira. Para Silmara, é como se aquelas crianças fossem seus filhos.
As portas da escola já foram reabertas e algumas crianças já retornaram. “Estamos fazendo um movimento lá na escola, e tem sido um momento bom, porque quando eles não estavam e a escola fica fria. Com eles lá, a alegria volta para a escola”, falou. “De manhã, recebemos 200 alunos – foi um encontro emocionante – alguns se alegravam, choramos juntos. Mas eles passam força para nós e nós também passamos força para eles. Com aqueles que estão muito tristinhos, nós conversamos. Eu disse para um aluno que estava chorando: Deus entregou uma chave para nós e diante de nós tem uma porta. Nós podemos abrir essa porta ou fechá-la. A chave está em nossas mãos, e a decisão é nossa. O mundo está aí está a para a gente crescer.”
Silmara informou que, desde a tragédia, uma equipe de profissionais, incluindo psicólogos, tem ajudado as famílias e profissionais da escola a enfrentar possíveis traumas. “Estamos falando com psicólogos. Eu tenho falado também com meu pastor. Minha vida está uma correria, mas sei que logo tudo estará no seu lugar e vamos conseguir administrar tudo melhor.”
Outro homenageado foi o soldado Eduardo Andrade Santos, de 34 anos, que está de licença médica desde janeiro. Vizinho da escola, ao ouvir os tiros, ele pegou sua arma e identificação, correu para a unidade e chegou a ficar frente a frente com um dos atiradores até a chegada da Força Tática. Também foi homenageado o 2° sargento Anderson Luiz de Camargo, de 44 anos. Ele foi um dos primeiros policiais a chegar ao colégio.
“Foi uma grata coincidência e um ato divino estarmos perto do local. Soubemos da ocorrência pelo Copom, via rádio. Atendemos a primeira vítima, um senhor que, depois fiquei sabendo, era tio de um dos assassinos. Ele levou três tiros. Demos o primeiro atendimento a ele”, lembrou Camargo.
“Solicitamos apoio do Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência] para socorrê-lo. Saímos dali e já sabíamos algumas informações: que [o assassino] era um rapaz branco, com roupa preta, máscara. Como já estava tendo atendimento à vítima, fomos em busca dos assassinos. E então entramos na primeira [rua] à esquerda, que era a rua da escola. Podíamos ter entrado em qualquer lugar, mas entramos à esquerda. Sabendo que era um carro branco, o único carro branco que vimos ali perto foi na frente da escola. Descemos da viatura. Até então, não sabíamos a proporção do que estava acontecendo lá dentro. E então vimos as primeiras vítimas”, contou o policial a jornalistas.
Camargo lembrou que havia um policial à paisana lá, que se identificou de pronto. “Adentramos e seguimos o rastro. Vimos muita munição no chão, avistamos corpos caídos ao chão.” Ele disse que, depois, ouviu dois disparos sequenciais, mas não sabia que os atiradores tinham se matado. Os corpos estavam no corredor. Os policiais foram, então, às salas de aula – em cada uma havia cerca de 25 alunos. “Em uma das salas, uma professora contou que um dos atiradores tinha tentado abrir a porta com um machado. Nossa ação foi rápida, graças a Deus”, ressaltou o policial homenageado.Pai de dois filhos, o policial disse que, após a tragédia, tem insistido mais no diálogo.
“Acredito que não tem coisa melhor que conversar e tentar entender o que está acontecendo dentro de casa, trazer essa proximidade.”
Outra homenageada foi a estudante Rhylarry, de 15 anos. A mãe da adolescente, Marilene Barbosa de Oliveira, de 45 anos, disse que a menina está bem, embora lembre sempre o que aconteceu. “Temos conversado muito com ela, que está tendo toda a assistência necessária”, disse Marlene à Agência Brasil.
Rhylarry, que não foi ferida no tiroteio, tentou desarmar um dos atiradores. “Tem horas que ela acorda assustada. As vezes, ela acha que ele [atirador] pode estar por ali. O que digo a ela é que se acalme, quando acordar, e pense que ele não está mais no veio dos vivos, que ele não tem mais como aterrorizá-la.” A menina ainda não retornou ao colégio. “Ela entende que tem de retornar às aulas e vai voltar na segunda-feira. Sinto que ela está confiante e que vai ficar tudo bem. Peço que ela seja firme, porque o pior já passou”, acrescentou Marlene.