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Salles erra ao dizer que seca causou aumento de queimadas na Amazônia

Ministro do Meio Ambiente foi o entrevistado pelo programa Roda Viva, da TV Cultura, na noite dessa segunda-feira

atualizado

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Marcelo Camargo/Agência Brasil
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1 de 1 Ricardo-Salles3 - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Em meio à crise internacional causada pelo alto número de queimadas na Amazônia, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foi o entrevistado pelo programa Roda Viva, da TV Cultura, nessa segunda-feira (26/08/2019). O ministro falou sobre os focos de incêndio e afirmou que “quanto mais seco o ano, mais queimadas, enquanto mais úmido o ano, menos queimadas”. Salles aproveitou ainda para falar sobre os contingenciamentos sofridos pelo sua pasta. A Lupa acompanhou a entrevista e verificou algumas frases ditas pelo ministro. Veja o resultado:

“O percentual [de aumento nas queimadas] (…) em 2019, comparado com ano passado, 2018, é por que no ano passado choveu muito (…)”

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao programa Roda Viva no dia 26 de agosto de 2019

Segundo nota técnica do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), a quantidade de chuvas não foi um fator preponderante no aumento do número de incêndios em 2019. O estudo mostra que, neste ano, choveu em mais dias do que em 2018 em cinco de seis estados pesquisados (Acre, Amazonas, Pará, Mato Grosso e Rondônia). Mesmo assim, com o tempo menos seco, o número de focos de incêndio aumentou.

A quantidade total de chuva tampouco foi excepcional em 2019. Segundo a base de dados Climate Hazards Group InfraRed Precipitation with Stations (Chirps), até o dia 20 de agosto de 2019, o total de precipitação na região Amazônica, 1.757 mm, estava bastante próximo da média dos últimos dez anos: 1.767 mm. Em relação a 2018, houve ligeiro crescimento: naquele ano, a quantidade de chuva até o dia 20 de agosto foi de 1.732 mm. Veja os dados aqui.

Procurado para comentar, o ministro não retornou.

“[No] gráfico de volume de queimadas, ao longo dos últimos 15 anos, a gente vê uma coincidência total: anos secos (…), mais queimadas. Anos úmidos, mais chuva, menos queimadas”

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao programa Roda Viva no dia 26 de agosto de 2019

Nos últimos anos, nem sempre houve coincidência entre o número de focos de queimadas e a quantidade de chuva na Amazônia. Segundo a base de dados Climate Hazards Group InfraRed Precipitation with Stations (Chirps), em 2016, por exemplo, choveu, em média, 2.394 mm na região. Já 2017 foi um ano mais úmido: choveu 2.532 mm. Mesmo assim, os incêndios cresceram 22,4% naquele ano, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em 2018, o oposto aconteceu: embora a precipitação tenha caído ligeiramente – 1,6% -, foi verificada uma redução de 36,3% no número de queimadas.

Entre 2010 e 2015, a relação citada por Salles existiu: sempre que houve aumento nas chuvas, houve diminuição no número de queimadas, e vice-versa. Porém, não há um padrão claro entre as variações.

Em 2010, por exemplo, houve uma redução de 5,2% na pluviosidade. As queimadas cresceram 64,8%. Cinco anos depois, em 2015, a redução na quantidade de chuva foi de 12,7%, e os focos de incêndio aumentaram 28% – bem menos do que em 2010.

Procurado para comentar, o ministro não retornou.

“O Ministério do Meio Ambiente, em especial, não foi sequer do grupo de ministérios que sofreu mais com os cortes”

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao programa Roda Viva no dia 26 de agosto de 2019

O Ministério do Meio Ambiente não está no grupo de pastas que sofreram mais cortes com os contingenciamentos das verbas discricionárias anunciados pelo governo federal. As verbas discricionárias são a parcela do orçamento de despesas não obrigatórias, o que inclui investimentos e custeio dos órgãos públicos. Considerados os dois cortes feitos até agora, o Ministério do Meio Ambiente perdeu R$ 195,8 milhões em relação ao que estava previsto no Orçamento de 2019, ou 23,74% do total. Tanto em números absolutos quanto percentuais, ficou em 14º lugar na verba congelada entre 18 órgãos. O governo federal fez um primeiro contingenciamento em março e um novo corte em 30 de julho.

Segundo dados do Ministério da Economia, percentualmente, o Ministério de Minas e Energia foi o recordista em cortes e já perdeu 81,32% do que estava previsto no Orçamento de 2019, – o equivalente a R$ 3,8 bilhões. Em números absolutos, o Ministério da Educação teve o maior volume de verba contingenciada – R$ 6,2 bilhões, ou 24,72% do total. Outras pastas bastante afetadas foram o Ministério da Defesa (R$ 5,8 bilhões, ou 43,26% do total) e o próprio Ministério da Economia (R$ 4,4 bilhões, ou 34,87% do total).

“Nós [Ministério do Meio ambiente] só tivemos contingenciamento na primeira leva de contingenciamentos. Nas duas subsequentes, que atingiram todos os demais ministérios, nós fomos poupados”

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao programa Roda Viva no dia 26 de agosto de 2019

O Ministério do Meio Ambiente foi atingido nos dois contingenciamentos anunciados pelo governo federal, em 29 de março e 30 de julho. Com isso, o total de gastos em verbas discricionárias permitido pelo Orçamento para a pasta passou de R$ 824,8 milhões para R$ 625,4 milhões após essas medidas.

O Decreto 9.741/2019 trouxe o primeiro contingenciamento e foi publicado em 29 de março de 2019. Na ocasião, o Ministério do Meio Ambiente sofreu um corte de R$ 187,4 milhões, de acordo com dados do Ministério da Economia.

Na época, foi criada uma reserva orçamentária de emergência de R$ 5,3 bilhões, para amenizar o impacto de futuras quedas de arrecadação que resultariam em novos congelamentos. Parte desse dinheiro foi usado, por exemplo, para recompor o Orçamento do Ministério do Meio Ambiente e da Educação em maio. Considerando as movimentações orçamentárias que ocorreram até o fim do 2º bimestre do ano, o total cortado caiu para R$ 185,6 milhões.

Em 22 de julho, no entanto, o governo federal afirmou que a reserva estava zerada e determinou que faria um novo corte nas verbas discricionárias. Dias depois, com a publicação do Decreto 9.943/2019, o Ministério do Meio Ambiente perdeu mais R$ 10,2 milhões em verbas, e o total dos cortes chegou a R$ 195,8 milhões.

Procurado para comentar, o ministro não retornou.

“O presidente [Jair Bolsonaro] (…) assinou, anteontem, um despacho determinando a PF que investigue aquela história do ‘Dia do fogo’”

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao programa Roda Viva no dia 26 de agosto de 2019

No último domingo (25), o presidente Jair Bolsonaro solicitou ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, que a Polícia Federal investigue o “Dia do fogo”. Isto ocorreu após o Globo Rural divulgar uma reportagem com um relato de um pecuarista sobre carros do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) – órgão do governo subordinado ao Ministério do Meio Ambiente – que teriam colocado fogo em uma área florestal no município de Cachoeira da Serra, no Pará.

No entanto, entidades emitiram alertas a órgãos federais e estaduais sobre o chamado “Dia do fogo” ainda no início de agosto. No último dia 9, a Procuradoria da Justiça de Novo Progresso, no Pará, notificou a Delegacia de Polícia do município. No mesmo dia, o Ibama também foi avisado de que já havia áreas em chamas no estado. No dia 13 de agosto, o Ibama em Santarém foi alertado para que se manifestasse sobre os crimes ambientais praticados às margens da rodovia BR-163, próximo ao aeroporto de Novo Progresso.

Vale lembrar que o presidente Jair Bolsonaro que no dia 21 de agosto – antes de pedir que o caso fosse investigado pela PF – afirmou que Organizações Não-Governamentais (ONGs) estariam por trás dos incêndios que ocorrem atualmente na Amazônia. No entanto, o próprio presidente reconheceu, no dia seguinte, que não tem provas para embasar sua acusação.

Na última segunda-feira (26), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou a instauração de um inquérito para apurar a autoria e origem dos focos de incêndio na Amazônia. “O que queremos é sincronizar a atuação do Ministério Público brasileiro para que as queimadas e os incêndios cessem, e para que os infratores, aqueles que estão cometendo o gravíssimo crime de pôr fogo na floresta, sejam identificados e punidos”, afirmou Dodge.

“Foram imputados ao mês de junho de 2019, (…) 3,5 mil alertas de desmatamento”

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao programa Roda Viva no dia 26 de agosto de 2019

O portal Terra Brasilis, que reúne os dados do Sistema de Detecção de Desmatamentos em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), mostra que houve 3.320 alertas de desmatamento na Amazônia Legal em junho deste ano.

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