RS: como ficam as questões trabalhistas durante período de calamidade
Cerca de 1,4 milhão de moradores de 417 municípios gaúchos foram afetados. CLT não prevê abono dessas faltas
atualizado
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Cerca de 1,4 milhão de moradores do Rio Grande do Sul foi afetada em decorrência das enchentes na região. Entre os atingidos, estão pessoas que não conseguem se deslocar para o trabalho. Sabendo disso, o Metrópoles conversou com especialistas para saber os impactos trabalhistas durante um período de calamidade pública, como a vivida no estado gaúcho.
Até o momento, 425 municípios gaúchos têm 163 mil pessoas desalojadas e 66 mil em abrigos públicos. A tragédia socioambiental deixou 100 mortos, 130desaparecidos e 374 feridos.
Especialistas consultados pelo Metrópoles explicam que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não prevê abono de faltas no período de calamidade pública. Ou seja, o empregador pode computar os dias como “faltas injustificadas”.
A advogada trabalhista Ana Gabriela Burlamaqui explica que o projeto de decreto legislativo (PDL) que reconhece o estado de calamidade pública no RS “não regula os direitos e deveres no contrato de trabalho em situações de calamidade”.
Segundo ela, a CLT se limita a especificar as hipóteses de falta justificada, nas quais as situações de calamidade pública não se enquadram.
Empregos devem ser mantidos no RS
Burlamaqui afirma que as “empresas por sua função social constitucionalmente estabelecida devem contribuir de forma positiva para a sociedade ajudando a preservar a dignidade dos seus empregados” por meio da manutenção dos empregos.
A advogada defende que as faltas nesse período de calamidade devem ser consideradas ou justificadas, sem penalidade, ou compensadas futuramente sem descontos ao salário.
“Existe óbvia impossibilidade de acesso ao trabalho, por qualquer meio, estando os transportes públicos totalmente paralisados, logo nos parece impróprio o desconto das faltas”, afirma a advogada.
Para reforçar esse argumento, ela cita uma exceção prevista na CLT (art. 131, VI) que diz que, ao não haver serviço, as faltas serão justificadas e não podem ser descontadas.
De acordo com o advogado trabalhista Maurício Sampaio da Cunha, mesmo que seja possível descontar as faltas no salário do funcionário, “por bom senso, o empregador pode perdoar a ausência e pagar o salário integralmente ou acordar a compensação das faltas em outros dias”.
Ambos os especialistas acreditam que uma possível saída para resolver a questão trabalhista no estado gaúcho é a Lei 14.437/2022, que regula a possibilidade da aplicação de medidas extraordinárias. Ou seja, essa legislação flexibiliza as leis trabalhistas em momentos de calamidade pública.
Desta forma, as empresas ficam aptas a adotar o teletrabalho, antecipar férias individuais e de feriados, conceder férias coletivas e usar o banco de horas.
Burlamaqui também analisa que é possível que o Executivo institua um novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, focando “no enfrentamento das consequências sociais e econômicas do estado de calamidade pública de âmbito estadual, exatamente como neste caso”.
Posso ser demitido?
Cunha explica que o funcionário não poderá sofrer punições como: advertência, suspensão ou dispensa por justa causa devido à ausência ou atraso em decorrência do estado de calamidade. Isso porque a falta ocorreu “por razão que não estava sob seu controle”.
Para ter mais segurança jurídica, ele recomenda que o trabalhador comprove toda a situação que impediu sua ida ao trabalho, bem como avise ao empregador sobre a ausência assim que possível.