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Porto Alegre – Com o recuo das águas e as cidades gaúchas tomadas de lodo, lixo e cheiro ruim, é hora de encaminhar o que sobrou da tragédia das chuvas para o seu destino final. Com uma projeção de lixo estimada em 47 milhões de toneladas, o Rio Grande do Sul não possui hoje capacidade técnica contratada para tratar todo esse resíduo com os atuais aterros.
Uma série de encaminhamentos e anúncios estão sendo feitos pelo governo estadual sobre a destinação. Em Porto Alegre, por exemplo, foi anunciada a contratação de um novo aterro, localizado em Gravataí, para de até 180 mil toneladas de resíduos.
O diretor-geral do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), Carlos Alberto Hundertmarker, afirmou estar preocupado com o impacto socioambiental.
“Seria muito fácil colocar esse resíduo contaminado em algum outro local, mas nossa equipe está muito preocupada com a destinação correta do que pode estar contaminado”, afirmou. “Essa área é bastante extensa e dará todo o suporte para a destinação do resíduo de Porto Alegre”, concluiu, sobre a escolha do aterro.
As demais cidades do estado seguem buscando alternativas. Muitos municípios estão impossibilitados de realizar o transporte até o principal receptor de resíduos do estado, o aterro de Minas do Leão, que fica a menos de 100 quilômetros de distância de Porto Alegre. Eles poderão, em caráter emergencial, armazenar temporariamente o material em áreas específicas.
Segundo orientação da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler, órgão responsável pelo licenciamento dos espaços que receberão provisoriamente os detritos, é preciso observar, nos terrenos, critérios tais como a ausência de recurso hídrico, as condições adequadas de acesso para remoção futura e a garantia da estabilidade da massa de resíduos e das estruturas originais da área.
300 mil carros nas ruas
Com uma previsão de mais de 300 mil carros espalhados pelo estado após as chuvas, segundo projeções do DMLU, será necessária uma ação conjunta entre Detran e municípios para encaminhar resíduos automobilísticos.
Espalhados nos pátios de locadoras, Detrans, estacionamentos, oficinas mecânicas e pelas ruas, os veículos causarão um trabalho muito grande de recolhimento e avaliação sobre as condições para reaproveitamento e reciclagem.
Responsável pela compra e venda de sucata automotiva para reinserção da matéria-prima na indústria, a Green Way for Automotive (GWA) se prepara para apoiar os estudos.
Segundo o sócio fundador da GWA, Wladi Souza, entre as etapas que seguem, é preciso tirar fluidos e gases, fazer a desmontagem básica e preparar a carcaça para prensagem e trituração.
“A gente quer fazer que esses carros voltem a ser carros novamente. É uma situação inédita, esperamos que tenhamos habilidade para que eles sejam reciclados de maneira correta”, afirmou Souza.
Ativismo para limpeza solidária
Enquanto a orientação da prefeitura é para que a população descarte os resíduos nas ruas, deixando a cargo dos garis a retirada do que sobrou, voluntários apoiam moradores a realizar a faxina com um propósito.
Eles estão testando a aplicação de um método em que são levados em conta o respeito à história de cada morador e a capacidade de ressignificar suas memórias.
No bairro Cidade Baixa, o sapateiro José Comeli, de 80 anos, foi um dos que receberam a ajuda do grupo. Sua casa foi completamente atingida, e ele não sabia nem por onde começar.
De botas, luvas e rodo em punho, Paula Molleta, engenheira ambiental e mobilizadora na consultoria GreenThinking, foi uma das ajudantes que faxinaram a casa e a sapataria de Comeli.
Paula faz parte de um grupo de pessoas que se reuniu, desde o começo das enchentes, para pensar soluções conjuntas.
“Não são só resíduos o que temos aqui. É dinheiro, tempo da vida e a história de uma pessoa”, diz Paula, que participa do projeto Limpeza Solidária.
De acordo com Paula, a Limpeza Solidária surgiu em um ambiente universitário composto por pesquisadores e empreendedores para articular soluções e formar lideranças para atuar na pauta de resíduos para cidades mais resilientes.
“A gente precisa ensinar as pessoas a fazerem o trabalho. Uma pessoa fica cuidando do morador. Depois vamos agindo, cada um por uma peça, com um trabalho cuidadoso que respeita o processo pelo qual eles estão passando”, explica o voluntário Lucas Fontes, que também participou da limpeza da sapataria.