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Papa sobre Campanha da Fraternidade: “Cristãos devem dar exemplo”

“Fiéis são convidados a ‘sentar-se a escutar o outro’ e, assim, superar os obstáculos de um mundo que é muitas vezes ‘um mundo surdo”, disse

atualizado

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O papa Francisco enviou, nesta quarta-feira de Cinzas (17/2), uma mensagem para o início da Quaresma e da Campanha da Fraternidade 2021 no Brasil — que tem sido atacada, mais uma vez, pela ala mais conservadora da Igreja Católica.

Na declaração, o sumo pontífice ressalta que os cristãos devem ser os primeiros a ter que dar exemplo, “começando pela prática do diálogo ecumênico”.

Francisco diz também ser tempo de superar os obstáculos de um mundo que é muitas vezes “um mundo surdo”. E elogia o fato de a Campanha da Fraternidade, pela quinta vez, ser realizada com igrejas do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil (Conic).

“De fato, quando nos dispomos ao diálogo, estabelecemos ‘um paradigma de atitude receptiva, de quem supera o narcisismo e acolhe o outro'”, escreveu o papa, que, durante o mandato, tem buscado fortalecer relações com outras religiões.

“Certos de que ‘devemos sempre lembrar-nos de que somos peregrinos, e peregrinamos juntos’, no diálogo ecumênico podemos verdadeiramente ‘abrir o coração ao companheiro de estrada sem medos nem desconfianças, e olhar primariamente para o que procuramos: a paz no rosto do único Deus'”, prosseguiu.

Com o tema “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor”, a tradicional iniciativa que pede doações de fiéis para financiar projetos sociais apoiados pela Igreja Católica virou alvo de religiosos fundamentalistas nas redes sociais.

Um dos motivos é a busca da inclusão, nesse diálogo, das minorias e a violência direcionada a esses grupos.

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Como mostrou o Metrópoles, os ataques nas redes são ferozes e acusam líderes religiosos de terem aderido a “pautas abortistas e anticristãs”. Esses grupos tentam incentivar os cristãos a não doar nenhum dinheiro para a Campanha da Fraternidade.

A revolta se dá principalmente em relação ao parágrafo do documento da Campanha da Fraternidade 2021 que faz a seguinte afirmação: “Outro grupo que sofre as consequências da política estruturada e da criação de inimigos é a população LGBTQI+”.

O texto traz dados do Atlas da Violência e da ONG Grupo Gay da Bahia para denunciar que 420 pessoas desse grupo foram assassinadas em 2018, e argumenta que “esses homicídios são efeitos do discurso de ódio, do fundamentalismo religioso, de vozes contra o reconhecimento dos direitos das populações LGBTQI+ e de outros grupos perseguidos e vulneráveis”.

Para os religiosos mais extremistas, sobra militância e falta religião no documento.

Um dos principais alvos, a pastora luterana Romi Bencke contou, ao Metrópoles, que mudou sua rotina por temer que o extremismo das redes possa resultar em consequências físicas. “Não tenho vocação para mártir”, disse a religiosa.

“A gente precisa refletir sobre a responsabilidade de quem propaga esses discursos. Os vídeos desse Centro Dom Bosco [canal ultraconservador no YouTube] têm sido muito assistidos. E eles fomentam a violência”, relatou.

“Então, a partir do momento em que fazem o discurso que eles estão divulgando, numa cruzada santa em que o mal tem de ser eliminado, é claro que alguém que realmente acredita que está numa cruzada santa vai achar que fará uma grande contribuição para a obra de Deus se eliminar o mal”, avaliou Romi Bencke.

Leia a íntegra da carta enviada por papa Francisco e publicada no site oficial da Santa Sé:

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO AOS FIÉIS BRASILEIROS POR OCASIÃO DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2021

Queridos irmãos e irmãs do Brasil!

Com o início da Quaresma, somos convidados a um tempo de intensa reflexão e revisão de nossas vidas. O Senhor Jesus, que nos convida a caminhar com Ele pelo deserto rumo à vitória pascal sobre o pecado e a morte, faz-se peregrino conosco também nestes tempos de pandemia. Ele nos convoca e convida a orar pelos que morreram, a bendizer pelo serviço abnegado de tantos profissionais da saúde e a estimular a solidariedade entre as pessoas de boa vontade. Convoca-nos a cuidarmos de nós mesmos, de nossa saúde, e a nos preocuparmos uns pelos outros, como nos ensina na parábola do Bom Samaritano (cf. Lc 10, 25-37). Precisamos vencer a pandemia e nós o faremos à medida em que formos capazes de superar as divisões e nos unirmos em torno da vida. Como indiquei na recente Encíclica Fratelli tutti, «passada a crise sanitária, a pior reação seria cair ainda mais num consumismo febril e em novas formas de autoproteção egoísta» (n. 35). Para que isso não ocorra, a Quaresma nos é de grande auxílio, pois nos chama à conversão através da oração, do jejum e da esmola.

Como é tradição há várias décadas, a Igreja no Brasil promove a Campanha da Fraternidade, como um auxílio concreto para a vivência deste tempo de preparação para a Páscoa. Neste ano de 2021, com o tema “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor”, os fiéis são convidados a «sentar-se a escutar o outro» e, assim, superar os obstáculos de um mundo que é muitas vezes «um mundo surdo». De fato, quando nos dispomos ao diálogo, estabelecemos «um paradigma de atitude receptiva, de quem supera o narcisismo e acolhe o outro» (Ibidem, n. 48). E, na base desta renovada cultura do diálogo está Jesus que, como ensina o lema da Campanha deste ano, «é a nossa paz: do que era dividido fez uma unidade» (Ef 2,14).

Por outro lado, ao promover o diálogo como compromisso de amor, a Campanha da Fraternidade lembra que são os cristãos os primeiros a ter que dar exemplo, começando pela prática do diálogo ecumênico. Certos de que «devemos sempre lembrar-nos de que somos peregrinos, e peregrinamos juntos», no diálogo ecumênico podemos verdadeiramente «abrir o coração ao companheiro de estrada sem medos nem desconfianças, e olhar primariamente para o que procuramos: a paz no rosto do único Deus» (Exort. Apost. Evangelii gaudium, n. 244). É, pois, motivo de esperança, o fato de que este ano, pela quinta vez, a Campanha da Fraternidade seja realizada com as Igrejas que fazem parte do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC).

Desse modo, os cristãos brasileiros, na fidelidade ao único Senhor Jesus que nos deixou o mandamento de nos amarmos uns aos outros como Ele nos amou (cf. Jo 13,34) e partindo «do reconhecimento do valor de cada pessoa humana como criatura chamada a ser filho ou filha de Deus, oferecem uma preciosa contribuição para a construção da fraternidade e a defesa da justiça na sociedade» (Carta Enc. Fratelli tutti, n. 271). A fecundidade do nosso testemunho dependerá também de nossa capacidade de dialogar, encontrar pontos de união e os traduzir em ações em favor da vida, de modo especial, a vida dos mais vulneráveis.

Desejando a graça de uma frutuosa Campanha da Fraternidade Ecumênica, envio a todos e cada um a Bênção Apostólica, pedindo que nunca deixem de rezar por mim.

Roma, São João de Latrão, 17 de fevereiro de 2021.

Francisco

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