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Trabalho escravo em MG: “É mais que explorar miséria”, diz procurador

Quinze trabalhadores foram resgatados neste mês em situação análoga à de escravo em uma clínica de reabilitação em Patos de Minas (MG)

atualizado

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Quinze trabalhadores são resgatados em clínica terapêutica em Patos de Minas
1 de 1 Quinze trabalhadores são resgatados em clínica terapêutica em Patos de Minas - Foto: Material obtido pelo Metrópoles

Trabalhadores resgatados em situação análoga à de escravo em uma fábrica de esculturas de gesso travestida de clínica de reabilitação, em Patos de Minas (MG), relatam uma rotina extenuante de agressões físicas e psicológicas, além de ameaças de morte feitas pelos donos do estabelecimento.

As vítimas eram submetidas à violência quando não conseguiam bater a meta diária de vendas, o que era recorrente devido ao alto valor estabelecido. Um homem chegou a parar no hospital após ser agredido pelos suspeitos, revelam depoimentos obtidos pelo Metrópoles.

A clínica foi um dos estabelecimentos alvo da Operação Resgate II, deflagrada no início de julho em combate ao trabalho escravo. Desde então, mais de 330 vítimas foram resgatadas na ação. Dessas, 15 trabalhavam na comunidade terapêutica de Patos de Minas. O caso chamou a atenção dos investigadores.

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Eles eram moradores de rua e dependentes químicos de vários cantos do estado e até do Entorno do Distrito Federal, e foram aliciados por um pastor sob a falsa promessa de trabalho assalariado e de tratamento na comunidade, que levava o nome de Clínica Missionária Renascer.

Por conta disso, os donos do estabelecimento, entre eles José Augusto Santos Neto, também são investigados por tráfico humano.

O Metrópoles teve acesso aos depoimentos de três vítimas que trabalhavam na comunidade. Os internos foram resgatados no último dia 15 e encaminhados para uma clínica regular em Uberlândia (MG), a 216 quilômetros de Patos de Minas.

A comunidade não oferecia qualquer tipo de tratamento, explica o auditor fiscal Humberto Monteiro Camasmie.

“Embora se apresentasse como uma clínica de recuperação para pessoas usuárias de drogas e álcool, não contava com supervisão médica, psicológica ou corpo de enfermagem. Tampouco possuía um plano terapêutico. Os empregadores se limitavam a exigir que os internos fabricassem e vendessem as peças”, diz.

Traumas e agressões

Pedro*, de 30 anos, um dos internos resgatados, trabalhava para José Augusto desde novembro de 2016, ou seja, há cerca de seis anos. A atuação na fábrica de gesso, porém, começou em janeiro deste ano. Ele relata que era compelido a vender as obras e bater uma meta diária de R$ 400. Mas, segundo ele, isso era impossível.

Em junho deste ano, ele foi agredido.

“Na ocasião, o mesmo foi cobrado em virtude do não alcance das metas estabelecidas e, mesmo esclarecendo as dificuldades, o trabalhador passou a ser agredido pelo sr. José Augusto, seu irmão Mateus e o interno Fabrício. Após as agressões, o mesmo foi ameaçado pelo sr. Mateus sob pena de ser assassinado”, diz trecho do depoimento prestado à Defensoria Pública da União (DPU).

Naquele dia, Pedro foi atendido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e, segundo conta, levado para o Hospital Regional de Patos de Minas.

Sobreviveu às agressões, mas o trauma ficou. Diz não ter sido o primeiro a apanhar por não atingir as metas de vendas. As violações eram recorrentes. Após o episódio, Pedro decidiu se abrigar no Centro de Referência de Assistência Social do Brasil (Creas) para proteção.

Antônio*, de 66 anos, presenciou o sofrimento de Pedro e outros internos. Ele também já foi ameaçado. Em depoimento, externou que “que teme pela sua vida em virtude das ameaças que sofreu” e que “aceitou ser resgatado pela operação e que não pretende voltar ao município de Patos de Minas em razão de sua segurança”.

O idoso chegou à clínica em abril deste ano. Antes disso, vivia em Montes Claros (MG), a 347 quilômetros de Patos de Minas, quando foi chamado por um pastor para trabalhar com a venda de gesso.

O pastor o prometeu um salário mínimo acrescido de 10% das vendas. Antonio trabalhava de 7h às 20h, vendendo as obras de casa em casa. Porém, jamais recebeu qualquer pagamento, assim como não contava com carteira assinada. Os internos detalharam que só havia pagamento se os trabalhadores cumprissem a quase impossível meta diária.

“O empregador se beneficiava”

Uma terceira vítima, Vitor*, de 27 anos, relatou no depoimento que presenciou agressões físicas a outro interno da clínica apelidado de Neguinho.

“Informa que ouviu que o trabalhador agredido faleceu na BR e, após o ocorrido, soube que a causa mortis foi atropelamento, porém tem dúvidas se não foi em decorrência da agressão. Que o empregador usava os casos de agressões anteriores como ameaça e coação aos internos para cumprirem as ordens estabelecidas e não deixarem a clínica”, detalha documento obtido pela reportagem.

Em conversa com o Metrópoles, o procurador Roberto Gomes de Souza, do MPT em Minas Gerais, chama a atenção para a vulnerabilidade social dos trabalhadores resgatados na operação.

“Alguns eram moradores de rua, outros dependentes químicos, o que facilita a alienação desse pessoal em razão da vulnerabilidade. São pessoas simples, analfabetizadas. É mais que explorar a miséria do ser humano. Mas isso é só a ponta do iceberg. Pode ser que a gente tenha descoberto um novo ‘nicho’ de trabalho escravo”, afirma.

“O que tínhamos ali”, acrescenta Camasmie, “era uma exploração de pessoas em condição análoga à de escravo, a pretexto de realizar tratamentos contra a dependência química e abuso de álcool – mas nenhum procedimento terapêutico era realizado”.

“O empregador se beneficiava da prestação laboral e realizava atividade econômica com essa mão-de-obra explorada”, diz o auditor fiscal.

Outro lado

A reportagem não conseguiu contato com José Augusto Santos Neto. O espaço segue aberto para manifestações.

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