Quilombolas de Alcântara cobram ações concretas e consulta às comunidades
Pela 1ª vez, governo brasileiro pediu desculpas a quilombolas por Base de Alcântara, no Maranhão, em julgamento internacional na OEA
atualizado
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Após o governo brasileiro pedir desculpas, pela primeira vez, em razão das violações de direitos humanos de quilombolas durante a construção do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, organizações que representam os povos tradicionais se manifestaram cobrando atitudes concretas.
As instituições defenderam que o posicionamento do governo foi “incompleto e suscita dúvidas”. Em nota após o fim do julgamento, as comunidades alegam que a fala do governo brasileiro foi motivo de “frustração”, por ser “completamente esvaziada de conteúdo efetivo”.
“Estes anúncios foram cercados de zonas fundamentais de incerteza quanto ao seu efetivo conteúdo, com expressões pouco precisas, palavras vagas, que mantém o futuro de Alcântara em um campo de grande insegurança institucional”, diz a nota.
O Brasil foi julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), 36 anos após as primeiras remoções de quilombolas para a construção da base do Centro de Lançamentos de Alcântara, da Força Aérea Brasileira (FAB).
Reconhecimento
Na época, 300 famílias foram remanejadas compulsoriamente e instaladas em sete agrovilas. O Estado é acusado de não consultar as comunidades e não fazer estudos de impactos socioculturais – descumprindo diretrizes da convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
O reconhecimento dos erros do Estado foi lido na corte internacional pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, que realizou as alegações orais no tribunal.
“Manifesto o nosso mais sincero e formal pedido de desculpas. Informo aos peticionários a à honorável Corte que este pedido de desculpas constará de declaração pública, que reconhece a violação do direito de propriedade e de proteção judicial às comunidades quilombolas de Alcântara”, declarou.
Esta também é a primeira vez que o Estado brasileiro é julgado em uma corte internacional em caso envolvendo comunidades tradicionais. As sessões aconteceram nessa quarta (26/4) e quinta na sessão itinerante da Corte na sede do Tribunal Constitucional do Chile, em Santiago. O Brasil é acusado de expulsar os quilombolas das terras que ocupavam historicamente.
Distância das comunidades
Os denunciantes demandaram que o governo brasileiro conceda a titulação definitiva do território quilombola, pague indenização às comunidades removidas e às que permanecem no local, crie um fundo de desenvolvimento comunitário em conjunto com as famílias e realize estudo de impacto ambiental e cultural.
Segundo a organização que representa os povos tradicionais, o grupo de trabalho anunciado pelo governo foi formulado “sem qualquer consulta às comunidades quilombolas envolvidas”.
A representação dos povos tradicionais defende ainda que “o Estado deve também ouvir as comunidades sobre o que elas consideram suficiente e adequado em termos de formalização e publicização deste pedido”.
“Em meio à tamanha indefinição sobre o alcance da boa-fé do Estado Brasileiro, o sentimento de vitória tornou-se nublado. As comunidades de Alcântara querem crer que estão diante, efetivamente, de um passo rumo ao futuro – mesmo que tudo pareça, de algum modo, repetir as fórmulas do passado”, finaliza a nota.
Grupo de trabalho
Na última quarta-feira (26/4), o Palácio do Planalto instituiu um grupo de trabalho interministerial para buscar soluções para a demarcação de terras quilombolas em Alcântara.
O Decreto nº 11.502 foi assinado pelo presidente em exercício, Geraldo Alckmin (Lula estava na Espanha), e publicado no Diário Oficial da União (DOU).
De acordo com o texto, o grupo vai propor alternativas para a titulação territorial das comunidades remanescentes que compatibilize os interesses dessas comunidades e os do Centro Espacial de Alcântara. Deverá também solicitar informações ao Programa Espacial Brasileiro sobre o resultado de trabalhos já realizados na região.
O grupo terá 120 dias para elaborar o ato normativo e deve concluir os trabalhos em até um ano, com a apresentação de relatório com indicação de diligências, discussões, consensos alcançados e propostas não consensuadas.