Queimadas, garimpo e petróleo: os pepinos do Brasil na área ambiental
Enquanto se projeta como liderança climática na COP29, o Brasil ainda tem questões internas a resolver para a proteção dos recursos naturais
atualizado
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O Brasil defenderá, durante a 29ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP29), uma série de medidas de combate à crise climática. No entanto, o país ainda luta para resolver os próprios “pepinos” no que diz respeito à questão ambiental.
A COP29 ocorre entre os dias 11 e 22 de novembro em Baku, capital do Azerbaijão. No encontro, países signatários do Acordo de Paris discutem termos complementares e propostas de implementação do que foi negociado em 2015.
Na prática, são colocadas demandas e há muita discussão sobre financiamento de programas, critérios de aplicação de recursos e projetos que visam a solucionar problemas. Apesar de se projetar como lideraça climática, o Brasil ainda tem questões internas a resolver para a proteção dos recursos naturais.
Ambição de ampliar a exploração de petróleo no Brasil
Enquanto a expressão “transição energética” é um mantra entre os defensores do combate à crise do clima, ou seja, abandonar os combustíveis, o Brasil discute a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. A Petrobras tenta um licenciamento para a atividade.
A questão divide o governo federal. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) tem negado o licenciamento. Por outro lado, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, considera que não é o momento de eliminar o uso do petróleo.
“Quando se fala em transição energética, não tem como se dissociar da mineração, principalmente dos minerais críticos. Nós ainda dependemos dos combustíveis fósseis”, afirmou em maio em uma audiência no Senado.
O assunto incomoda ONGs de defesa ambiental. “O Brasil não pode, por exemplo, levar à COP29 uma discussão de transição energética muito consistente, e ao mesmo tempo aumentar o processo de produção e exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas. Isso fica muito contraditório”, afirma o líder de mudanças climáticas da WWF Brasil, Alexandre Prado, em entrevista ao Metrópoles.
Subsídios a combustíveis fósseis
Os subsídios a combustíveis fósseis também são uma questão complicada para o Brasil. Segundo um relatório do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), divulgado no final de outubro, o governo brasileiro destinou R$ 81,7 bilhões em 2023 para financiamentos de combustíveis fósseis, um montante 4,5 vezes maior do que o remetido a energias renováveis, que receberam R$ 18 bilhões.
A diferença na distribuição de incentivos reflete uma política que favorece o consumo de combustíveis fósseis, responsáveis por uma parcela significativa das emissões de gases do efeito estufa no país.
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Ainda segundo o Inesc, o total de subsídios para ambas as fontes energéticas aumentou 3,57% em relação ao ano anterior, embora os combustíveis fósseis tenham registrado uma leve redução de R$ 372 milhões em 2023, devido à reoneração de tributos como a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) e o PIS/Cofins sobre a gasolina. O Ministério de Minas e Energia (MME) informou que essa reoneração representa R$ 40,6 bilhões. O diesel, no entanto, continua isento desses impostos.
O Brasil ocupa o sétimo lugar mundial entre os maiores emissores de gases de efeito estufa (GEE). Em 2022, o setor de energia foi responsável pela emissão de 490,6 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e), representando 18% das emissões totais do país, conforme dados do Sistema de Estimativa de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (Seeg), do Observatório do Clima.
Descontrole do fogo
O Brasil enfrentou em 2024 um dos piores e mais críticos períodos de seca e, consequentemente, de queimadas. Mesmo com os esforços do governo federal, 22,38 milhões de hectares acabaram sendo consumidos pelas chamas entre os meses de janeiro e setembro, segundo o mais recente levantamento do Monitor do Fogo, do MapBiomas. O número representa um aumento de 150% em relação ao mesmo período de 2023.
Na Amazônia, o bioma mais afetado, o fogo consumiu cerca de 11,3 milhões de hectares, o que equivale a 51% de toda a área queimada no Brasil. O mês de setembro foi o mais crítico, com 5,5 milhões de hectares de floresta destruídos. Destes, 2,8 milhões de hectares eram de formação florestal — áreas de vegetação mais densa que possuem um papel essencial na regulação do clima global.
O Cerrado, por sua vez, enfrentou o pior período em cinco anos, com 8,4 milhões de hectares devastados até setembro. A seca extrema registrada no bioma favoreceu a propagação das chamas, atingindo não só áreas de vegetação nativa, mas também prejudicando a qualidade do ar em diversas cidades.
No Pantanal, a situação foi ainda mais drástica, com um aumento de 2.306% na área queimada em relação à média dos últimos cinco anos. Entre janeiro e setembro, o bioma perdeu 1,5 milhão de hectares para o fogo, sendo 318 mil hectares em setembro. A maioria das áreas afetadas era de vegetação nativa.
Garimpo
O garimpo ilegal surfou no enfraquecimento da fiscalização durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Atualmente, o arrocho na fiscalização da exploração de minério na Amazônia reduziu a atuação dos criminosos. No entanto, o problema persiste, ainda que em uma escala menor. A Polícia Federal (PF) tem feito repetidas operações contra as ilegalidades.
Em setembro, por exemplo, a PF cumpriu 15 mandados de busca e apreensão, além de cinco prisões preventivas contra suspeitos de financiar organizações criminosas no garimpo ilegal da Terra Indígena Yanomami.
Os territórios indígenas são alvos constantes do garimpo ilegal. Quatro terras indígenas monitoradas pelo Greenpeace tiveram, até setembro, uma área de 27.250 hectares, aproximadamente 38.165 campos de futebol, impactada pelo garimpo ilegal. As unidades são Kayapó (PA), Yanomami (AM/RR), Munduruku (PA) e Sararé (MT).
Porta-voz do Greenpeace Brasil, Jorge Dantas explicou ao Metrópoles que os garimpeiros têm buscado estratégias para fugir da vigilância governamental.
“O crime ambiental não conhece fronteiras, então, você tem unidades de conservação também sofrendo com o garimpo; esse garimpo indo para outras áreas, outras cidades, outros territórios (indígenas). Isto é algo que a gente precisa, enquanto sociedade, ficar muito atento”, pontua Dantas.