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São Paulo – A adoção de medidas mais restritivas de funcionamento de setores econômicos para evitar para tentar frear o avanço da Covid-19 não resultou ainda em uma redução da circulação de pessoas no estado de São Paulo. Para especialistas ouvidos pelo Metrópoles, a falta de adesão de grande parcela da população aos protocolos estabelecidos por autoridades tem sido dos principais desafios no combate à pandemia.
Na segunda (25/1) e na terça-feira (26/1), os dois primeiros dias de quarentena mais rígida, a taxa de isolamento no estado ficou em 43% e 40%, respectivamente. O índice é próximo da média registrada entre segunda (18/1) e sexta (22/1) ) da semana passada, de 41%, segundo dados do sistema de monitoramento do governo estadual.
Até o dia 7 de fevereiro, as regiões de Barretos, Bauru, Franca, Marília, Presidente Prudente, Sorocaba e Taubaté estarão na fase vermelha do Plano São Paulo, com fechamento de comércios e serviços não essenciais como bares e restaurantes. As demais, incluindo a Grande São Paulo, ficarão na etapa laranja, mas com restrições da vermelha em dias úteis, após as 20h, e integralmente aos fins de semana.
O médico infectologista do hospital Emílio Ribas Jamal Suleiman considera que as novas medidas adotadas no estado são rígidas, mas reforça que só surtirão efeito se houver participação da sociedade. “Sem a participação da sociedade, as medidas são inócuas. A função do Estado é apontar as soluções. Se a sociedade entende que não é problema dela, ela paga um preço alto, como um todo. Não só são as pessoas que vão para a aglomeração”, afirma .
“As medidas de restrição só terão resultados positivos se houver respeito da população às regras de prevenção. Cabe aos governantes colocarem as normas restritivas e fiscalizarem. À população, cabe a conscientização e respeitar as regras de prevenção. O controle da pandemia é papel de todos”, reforça o infectologista Leonardo Weissmann, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBL).
Para epidemiologista José Cassio de Moraes, consultor da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o governo de São Paulo deveria ter adotado as medidas há mais tempo. “Mas também não adianta adotar essas medidas sem que haja o seu cumprimento. A Covid não lê diário oficial. Então, vai circular entre a gente”, acrescenta.
Na capital paulista, a taxa de isolamento chegou a avançar para 47% no dia 25, data do aniversário da cidade, mas recuou para 38% no dia seguinte. Entre os dias 18 e 22, esse índice ficou entre 38% e 40%.
Os percentuais também sofreram pouca alteração nas sete regiões que estão integralmente na fase vermelha. Em Barretos, eles ficaram em 38% nos dois primeiros dias de quarentena mais rígida, após variar entre 36% e 38% na semana passada, sem contar o fim de semana. Já Bauru passou de uma média diária, entre 18 e 22 de janeiro, de 37% para 38% nessa segunda e terça.
Em Franca, a taxa de isolamento estava em 33%, na segunda, e 35%, na terça, ante uma variação de 29% a 35% na semana anterior. Marília, que já estava na fase vermelha, registrou nos dois primeiros dias um índice de 37%, sem alterações no período de comparação. O mesmo ocorreu em Presidente Prudente, com 35% na segunda e terça, em Sorocaba (36%) e Taubaté (38%).
Aglomerações
Mesmo com as restrições impostas pelo governo paulista nas festas de fim de ano, alertam os especialistas, os números de casos e óbitos por Covid-19 seguem em alta no estado, resultado de aglomerações em eventos clandestinos e encontros familiares no período. Até a última terça (26/1), São Paulo já registrou 5.121 mortes pelo novo coronavírus em janeiro, mais que o dobro de todo o mês de novembro.
“Esses números refletem a desobediência e desrespeito à prevenção nas festas de fim de ano, que foram intensamente alertadas”, afirma Weissmann.
Uma das preocupações neste momento é o carnaval, que estava previsto para 15 e 17 de fevereiro. Na capital paulista, a prefeitura adiou as celebrações na cidade, mas ainda não definiu a situação dos pontos facultativos da semana originalmente prevista para as festas.
“Não é segredo que já está ocorrendo a organização de várias festas clandestinas. A gente deve ter um novo pico mais para frente se as pessoas não entenderem que isso as coloca em um risco muito grande. Aglomerou é risco, não tem outra possibilidade. E a gente tem um risco adicional que é a emergência de variantes do vírus que são mais transmissíveis do que a anterior“, diz Suleiman.
Sem discurso unificado
Além do cansaço da população com o isolamento, avaliam os especialistas, a falta de discurso unificado entre as esferas federal, estaduais e municipais no combate à pandemia contribui para que os protocolos sejam ignorados por grande parte da população.
“A orientação de quarentena nunca deixou de existir. As pessoas que, exaustas com a situação, deixaram de cumprir. São necessárias maiores orientação e fiscalização. Além disso, que o discurso seja o mesmo em todos os níveis de governo (federal, estadual e municipal). Essa situação só confunde, a população fica sem um norte e, enquanto isso, o vírus continua se propagando”, afirma Weissmann.
Para Suleiman, o discurso na esfera federal é “esquizofrênico”. “Não no sentido da doença, mas de ruptura. A pessoa vai capturar a mensagem e ficar com o menor sofrimento possível. Neste momento, esse menor sofrimento é: esqueça isso, não é um problema. Passa a ter problema quando eles matam a família inteira, que é o que tem acontecido”, diz.
José Cassio também critica a falta de uma posição de uniforme de todos os dirigentes sobre as medidas que devem ser adotadas e de uma liderança no país desde o início da pandemia. “Não tem um sistema de comunicação efetivo. Qual propaganda que você vê na televisão sobre isso? Muito pouco”, acrescenta.