Problemas com sistema de satélite travam investigação sobre óleo
Estudos com base nas correntes marítimas já indicam que o acidente aconteceu além das 200 milhas da costa, em alto-mar
atualizado
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A ausência de um sistema de monitoramento de desastres ambientais por satélite no oceano e a escassez de imagens do alto-mar dificultam a investigação sobre a origem do óleo achado em mais de 200 pontos do litoral do Nordeste. Cientistas de diferentes instituições buscam imagens que deem alguma pista, mas não encontraram nada que mostrasse o deslocamento do poluente até agora.
Ex-ministro do Meio Ambiente, o deputado estadual Carlos Minc (PSB-RJ) foi um dos primeiros a levantar a questão. “[Imagens de] satélites do Inpe [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais] e da Nasa [a agência espacial americana] deveriam ter sido requisitados no dia seguinte, cruzando com os planos de rotas de todos os navios, que a Marinha tem”, cobrou Minc, em redes sociais. Não é tão simples assim.
O único satélite que produz o tipo de imagem capaz de mostrar um vazamento de óleo no mar e que o disponibiliza gratuitamente é o Sentinel, da Agência Espacial Europeia (ESA). E há limitações. As imagens são geradas com intervalos de dias. E a maioria delas é de regiões mais próximas da costa. Sobre estas, o interesse comercial dos países é maior.
Estudos com base nas correntes marítimas já indicam que o acidente ocorreu além das 200 milhas da costa, em alto-mar. É menor a chance de haver imagens dessas regiões.
Ainda assim, grupos do Inpe, do Laboratório de Análise e Processamento de Imagem de Satélite da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio (UFRJ), buscam imagens que deem alguma pista.
“O Inpe já olhou todas as imagens disponíveis das proximidades da costa de 60 dias para cá, e não foi detectada nenhuma mancha expressiva indicativa da origem do vazamento”, disse o oceanógrafo Ronald Buss de Souza, pesquisador titular do Inpe.
Nas análises da Ufal, os resultados obtidos foram semelhantes. “Até agora não conseguimos identificar nenhuma imagem com um padrão clássico de derramamento de óleo”, disse o coordenador do laboratório, Humberto Alves Barbosa, especialista em sensoriamento remoto. “Mas não há uma sequência completa. Há falhas de dois, três dias. Além disso, a dificuldade de interpretação das imagens é grande.”
Para Luiz Landau, coordenador do laboratório da Coppe/UFRJ, seria sorte achar uma imagem com informações sobre a origem do vazamento dentre as geradas pela ESA. “Não temos imagens para nos ajudar, porque não temos programa de monitoramento para eventos desse tipo”, explicou. “Temos uma constelação de satélites privados nos céus, mas eles têm de estar programados para olhar para onde nos interessa.”
Pesquisadores também já alertaram que outra dificuldade é que o óleo se movimenta na sub-superfície, o que dificulta a visualização do material. “As primeiras manchas, na fase aguda do vazamento, eram mais líquidas e flutuantes. Era mais fácil de ver por satélite ou aviões”, disse ao Estado, na semana passada, a oceanógrafa Yara Schaeffer-Novelli, professora sênior da Universidade de São Paulo (USP) e sócia do Instituto BiomaBrasil.
Para os especialistas, a melhor estratégia para determinar a origem do óleo é contar com oceanógrafos e modelos matemáticos para estudar correntes marítimas. Análises geoquímicas do óleo também podem ajudar. Os cientistas reclamam, porém, que o gabinete de crise do governo não convocou os cientistas oficialmente. “Após 50 dias, não se conseguiu ainda descobrir a fonte do vazamento. Essa lerdeza gera um desastre ambiental sem precedentes”, disse Souza, do Inpe.
Procurado pelo Estado nessa terça-feira (21/10/2019), o gabinete de crise do governo se manifestou.