Presidente do Iphan ignora proibição e mantém uso de carro oficial
Decreto nº 9.287 tirou de dirigentes de autarquias direito de utilizarem veículo institucional. Metrópoles flagrou Kátia Bogéa descumprindo
atualizado
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Para economizar no dia a dia da máquina pública, a União atualizou em fevereiro as regras para autoridades federais utilizarem carros oficiais. No entanto, as novidades contidas no Decreto nº 9.287 parecem não terem sido completamente incorporadas pela presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Kátia Bogéa, em sua rotina.
A titular da pasta continua a usar o veículo institucional (fotos em destaque e abaixo) em seus trajetos durante a semana – idas de casa ao trabalho e vice-versa –, o que foi vetado pela norma em vigor desde 15 de março. Também vai de carro oficial ao aeroporto a fim de embarcar para sua cidade natal, São Luís (MA), e outros destinos.
O Metrópoles flagrou a irregularidade. Na manhã de terça-feira (8/5) e de quinta (10), Kátia Bogéa foi vista pela reportagem embarcando em um Ford Fusion – placa 9924-DF – em frente ao prédio onde reside. Depois, nos dois dias, ela desembarcou na sede da autarquia. O carro está registrado em nome do Iphan no Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF), mas tem circulado sem qualquer identificação do governo federal.
No fim do expediente de quinta-feira, a gestora seguiu no mesmo veículo até o Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasilia. A reportagem apurou que ela tinha voo marcado para o Rio de Janeiro, mas um compromisso na cidade só foi registrado na agenda da presidente nesta sexta (11).
Confira imagens do uso irregular do veículo institucional:
O decreto leva as assinaturas do presidente Michel Temer e do então ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira. O texto foi publicado em 15 de fevereiro no Diário Oficial da União (DOU), mas só entrou em vigor um mês depois. A norma restringiu o direito de usufruir de carros institucionais para ocupantes de cargos de alto escalão, como presidentes de autarquias e fundações.
O artigo 6º do decreto, por exemplo, veda “o uso de veículos oficiais para o transporte individual da residência ao local de trabalho e vice-versa”. O trecho também faz referência ao deslocamento “a locais de embarque e desembarque, na origem e no destino, em viagens a serviço, quando houver o pagamento da indenização estabelecida no art. 8º do Decreto nº 5.992, de 19 de dezembro de 2006”.
Essas restrições previstas no Decreto nº 9.287/2018, que tem como principal objetivo gerar economia às contas públicas para ajuste fiscal, eliminaram prerrogativa de 1.052 autoridades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, segundo informações do Ministério do Planejamento. Do total, 40 são dirigentes de autarquias ou fundações. Portanto, todos perderam o direito de utilizar carro para transporte institucional – isso inclui ida da residência ao trabalho e vice-versa.
Confira a quantidade de cargos, por tipo de função, que perderam a prerrogativa, de acordo com o Ministério do Planejamento:
TáxiGov
Para essas finalidades, as respectivas autoridades devem acionar o TáxiGov, sistema de mobilidade disponibilizado na capital pela União. Ou então usar “veículos de serviços comuns”, conforme determina o artigo 4° do Decreto nº 9.287/2018.
Em Brasília, 25 mil servidores e colaboradores de 24 órgãos, cadastrados no TáxiGov, já utilizam o serviço. Conforme informado pelo Planejamento, até o fim de maio todos os órgãos da administração pública direta devem formalizar o cadastro no sistema. Já as autarquias, fundações e entidades – a exemplo do Iphan; consideradas administrações públicas indiretas – ainda não possuem prazo para se cadastrarem.
Contudo, a regra é clara: dirigentes de autarquias e fundações não podem fazer uso de automóveis oficiais, sequer de serviços comuns de forma individual. Os veículos, antes destinados ao transporte de dirigentes, poderão ser direcionados às atividades “finalísticas” do próprio órgão, leiloados ou doados, dependendo das condições apresentadas por cada um (e de acordo com a legislação vigente).
A redução de carros institucionais por autoridades, combinada com a utilização do TáxiGov (iniciada em fevereiro de 2017), deve gerar economia de cerca de R$ 101 milhões por ano, segundo o Ministério do Planejamento, pasta responsável pela administração dos bens da União e regras gerais de funcionamento dos órgãos federais.
Aeroporto
Embora igualmente vetado, a presidente do Iphan, Kátia Bogéa, também tem usado o carro oficial para deslocamentos até o Aeroporto JK. Tanto imagens encaminhadas para o Metrópoles quanto os flagrantes da reportagem confirmam o uso no trajeto Iphan-aeroporto de Brasília.
Durante a apuração, o Metrópoles consultou a agenda da chefe da autarquia, divulgada publicamente no site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. No final da tarde da quinta, não havia registro de compromissos oficiais a serem cumpridos a partir de 10 de maio fora de Brasília (confira abaixo).
Contudo, em nova pesquisa feita na manhã dessa sexta-feira (11), a agenda de Kátia Bogéa já contava com “embarque para o Rio de Janeiro – RJ”, às 20h40, no cronograma do dia 10. Além disso, atividades a serem realizadas pela presidente do instituto em 11, 12 e 13 de maio também foram acrescentadas aos compromissos oficiais no Rio e em outras capitais (veja abaixo).
Padronização
Para padronizar as novas regras de uso de carros oficiais, o Decreto nº 9.287 extinguiu duas categorias que norteavam os critérios antes adotados no governo federal: os veículos de transporte institucional e os considerados especiais. Frente a isso, foram criados três novos segmentos com diretrizes específicas: veículos de representação, de serviços comuns e de serviços especiais.
O carros de representação são destinados aos cargos de presidente e vice-presidente da República; ministros de Estado; comandantes das Forças Armadas e chefe do Estado-Maior; ex-presidentes da República; ocupantes de cargos de natureza especial e presidente, diretor-geral ou diretor-presidente de agência reguladora, conforme estabelecido no artigo 5º da Lei nº. 9.986/2000. Essas autoridades têm o direito de contar com esse tipo de automóvel para deslocamento em todo o território nacional.
Abaixo, os quantitativos de cargos com direito aos veículos de representação, de acordo com o Ministério do Planejamento:
Já os veículos destinados a serviços comuns atendem “pessoal a serviço” e transportam ainda “material”. Por fim, a categoria dedicada aos serviços especiais está relacionada à segurança pública e nacional, atividades de inteligência, saúde pública, fiscalização, coleta de dados, peculiaridades do Ministério das Relações Exteriores (MRE), necessidades dos ex-presidentes da República e segurança dos familiares do chefe do Executivo federal e de seu vice.
As novas diretrizes do decreto não se aplicam aos militares das Forças Armadas, nem aos poderes Legislativo e Judiciário em âmbito federal, estadual ou municipal.
O outro lado
O Metrópoles acionou a assessoria de comunicação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional para questionar sobre o uso diário por Kátia Bogéa do carro institucional Ford Fusion, placa JJJ 9924-DF, e em quais circunstâncias isso acontece.
Em resposta, a autarquia informou que “a presidente do Iphan utiliza o veículo oficial sempre quando necessário e dentro dos limites da legalidade e moralidade”.
Por meio de nota, o instituto afirmou ainda que, “segundo orientação do Ministério do Planejamento, o veículo oficial poderá ser utilizado a serviço da administração indireta até que o modelo de transporte de servidores como TáxiGov ou similar seja regulamentado em toda a administração pública federal. Em razão disto, a presidente do Iphan ainda está utilizando o carro oficial para cumprir agenda de trabalho sempre quando necessário e dentro da legalidade”.