Presa na alfândega, cloroquina doada por Trump tem futuro incerto no Brasil
Ministério da Saúde admite que “ainda não tem informações sobre sua distribuição por estado e outros usos”
atualizado
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Quatro dias após receber 2 milhões de doses de hidroxicloroquina dos Estado Unidos, o governo brasileiro ainda não sabe qual destinação dará ao medicamento. Atualmente, a carga — que chegou ao Brasil no último domingo (31/05) — está passando por “desembaraço aduaneiro” na alfândega, segundo o Ministério da Saúde.
A pasta admite que “ainda não tem informações sobre sua distribuição por estado e outros usos”. Mesmo assim, o governo brasileiro agradeceu a doação. “A medida é uma demonstração da solidariedade dos dois povos na luta contra o coronavírus”, ressalta, em nota.
A carga com o medicamento chegou no domingo, pelo aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. Neste momento, segundo as autoridades sanitárias, estão sendo resolvidos os despachos legais aduaneiros para liberação da carga. O medicamento é recomendado pelo governo brasileiro contra a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus.
Inicialmente, o Ministério da Saúde diz que seguirá os parâmetros do novo protocolo da droga. Ao comunicar a doação, a Casa Branca disse que o medicamento poderia ser usado como profilaxia em equipes de saúde.
Pesquisas
Apesar do uso controverso da droga, o Ministério da Saúde informou que tem colaborado na condução de pesquisas e de ensaios clínicos para estudarem a segurança e a eficácia da medicação.
“A pasta tem acompanhado seguimentos clínicos, por grandes grupos, de mais de 40 mil brasileiros que tiveram acesso a essas medicações com boas respostas ao tratamento. Novas evidências científicas são fundamentais para atravessar, de forma mais branda, a pandemia da covid-19”, defende.
O ministério afirma que fará um esforço de pesquisa conjunto entre Brasil e Estados Unidos que incluirá testes clínicos controlados randomizados, para avaliar a segurança e eficácia da droga, tanto para a profilaxia quanto para o tratamento precoce do vírus Sars-Cov-2.
O governo brasileiro afirmou que “segue acompanhando estudos realizados em todo o mundo e já conta com um banco de informações com mais de 200 protocolos de cloroquina e de hidroxicloroquina usados em países como os Estados Unidos, Turquia e Índia”.
A doação foi anunciada pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE). Segundo o Itamaraty, em breve, o país norte-americano, chefiado por Donald Trump, também enviará mil ventiladores ao Brasil.
“A HCQ [hidroxicloroquina] será usada como profilático para ajudar a defender enfermeiros, médicos e profissionais de saúde do Brasil contra o vírus. Ela também será utilizada no tratamento de brasileiros infectados”, informou o ministro das Relações Exteriores, chanceler Ernesto Araújo, ao anunciar o recebimento do donativo.
Retomada de estudos
O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou, nesta quarta-feira (03/06), que a entidade vai retomar os estudos com cloroquina e hidroxicloroquina contra o coronavírus. Tedros Adhanim Ghebreyesus explicou que o Comitê de Segurança e Monitoramento do ensaio clínico Solidaridade revisou os dados e decidiu manter o protocolo original do estudo.
O trabalho havia sido suspenso na semana passada depois que os resultados de uma pesquisa com 96 mil pacientes foram publicados na revista científica The Lancet. Segundo os pesquisadores, o medicamento não tinha eficácia contra a Covid-19 e aumentava o risco de arritmia cardíaca e morte. Porém, nesta segunda (02/06), a publicação científica anunciou em editorial que os resultados passariam por auditoria e que os editores estariam “preocupados”.
Polêmica
Na última semana, o Metrópoles mostrou que, nos bastidores, o governo admite que novo protocolo da cloroquina “fracassou”. Após ampliar o uso da droga no tratamento da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, entidades científicas rechaçaram a sua eficácia. Contudo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) apoia a utilização.
A ampliação do uso do medicamento para casos leves da doença ocorreu em 20 de maio. Bolsonaro defende a droga como uma alternativa contra a infecção. A mudança neste protocolo resultou na demissão de dois titulares do Ministério da Saúde: o médico ortopedista Luiz Henrique Mandetta e o oncologista Nelson Teich. Atualmente, a pasta é comandada interinamente pelo general Eduardo Pazuello.
Ressalva em protocolo
Apesar de o Ministério da Saúde ter mudado a recomendação, o governo fez uma ressalva técnica no documento admitindo que, na prática, a droga não tem eficácia comprovada.
O protocolo prevê o uso do medicamento para pacientes com sintomas leves, bem como crianças, gestantes e mulheres que tiveram filhos recentemente.
Entre as fontes de embasamento, o documento cita o Conselho Federal de Medicina (CFM), estudos próprios do Ministério da Saúde, a Agência Europeia de Medicina, reportagens publicadas em sites, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, o Hospital Israelita Albert Einstein e artigos científicos.