Prefeitura distribui 350 kits sem comprovação contra Covid-19 em Goiás

Goiânia – Em 20 dias, 350 pacientes diagnosticados com a Covid-19 no município de Nova Veneza, a 33 quilômetros de Goiânia, receberam até a segunda-feira (8/2) kits da prefeitura com medicamentos que não têm eficácia comprovada no tratamento contra a doença: ivermectina e azitromicina.

O prefeito Valdemar Costa (DEM) afirmou que só não distribuiu cloroquina nos pacotes a pacientes porque não a encontrou disponível no mercado.

“Vamos continuar insistindo para colocar cloroquina no kit”, afirmou Costa na segunda (8/2), logo após dizer que não autorizou o secretário municipal de Saúde, Deijar José do Carmo, a furar a fila da vacinação, apesar de aparecer em vídeo comemorando o episódio revelado pelo Metrópoles. O caso é investigado pelo Ministério Público de Goiás.

No total, a prefeitura já gastou R$ 14,3 mil para adquirir mil kits de medicamentos sem comprovação científica para a prevenção contra a Covid-19. Cada um deles tem quatro comprimidos de ivermectina, cinco de azitromicina e 10 de dipirona.

Ao todo, a prefeitura gastou R$ 9.750 para comprar azitromicina; R$ 2.960 para adquirir ivermectina e R$ 1.590 com dipirona. O Metrópoles teve acesso às notas fiscais dos medicamentos.

Os kits são entregues, em um saco plástico, com as indicações de como cada pessoa deve tomá-los em casa após ser liberada do hospital sem sintomas graves.

“Azitromicina: tomar um cp [comprimido] ao dia por 5 dias. Ivermectina: tomar uma cápsula a cada 30kg, dose única. Dipirona: tomar 1 cp de 6/6 hrs se [houver] dor ou desconforto. Obs: se hidratar muito!”, diz bilhete colocado na embalagem com os remédios.

Os pacientes que recebem o kit ainda têm um recado do município grampeado do lado externo. “Nós da Prefeitura Municipal de Nova Veneza e Secretaria da saúde desejamos uma ótima recuperação para você e sua família!”, afirma.

A mensagem é assinada pela farmacêutica da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Lara Gouveia, responsável pelas compras de insumos e medicamentos da pasta. Segundo ela, a prefeitura acompanha “um protocolo que todos os municípios seguem para amenizar os sintomas e tentar achar uma solução para o problema”.

Sem certeza

“A gente sabe que [esses medicamentos] não têm comprovação científica”, diz a farmacêutica. “Ninguém tem certeza de nada com essa doença. Se algumas pessoas tomam e se sentem bem, o dever da prefeitura é fazer com que isso aconteça, por mais que não tenha comprovação científica”, acrescentou.

Os kits são distribuídos no Hospital Municipal de Nova Veneza, onde os pacientes suspeitos de estarem contaminados com Covid-19 recebem atendimento inicialmente em uma tenda montada do lado externo.

Se houver necessidade, em seguida, a equipe de saúde realiza exame de sangue ou RT-PCR, usados para detectar o coronavírus. Só pega o kit quem passar pela triagem, testar positivo e tiver recomendação médica.

Nova Veneza confirmou 660 casos de Covid-19 até a última semana. Houve 12 mortes. Apenas na sexta-feira passada (5/2), havia em tratamento domiciliar 78 pessoas contaminadas pelo coronavírus, que ainda gera uma série de dúvidas na população e na comunidade científica.

Para tentar conter o aumento de casos, a prefeitura determinou o fechamento de todos os estabelecimentos às 23 horas, horário a partir do qual o público pode ser atendido somente por delivery.

Contraindicação

A Secretaria Estadual de Saúde de Goiás informou ao Metrópoles que não recomenda a prescrição de kits, sendo que a indicação da medicação a ser usada fica a critério do médico responsável pelo paciente.

Disse também que se preocupa com a forma como estão sendo distribuídos tais medicamentos, pois entre eles se incluem antibióticos que, no médio e longo prazo, podem produzir efeitos críticos no tratamento de outras doenças, como a resistência do organismo e a respectiva perda de eficácia do remédio.

Conforme a pasta, as demais medicações quando usadas de forma inadequada podem provocar sérios problemas de saúde. No caso da ivermectina, assim como os demais vermífugos, segundo o órgão, é preciso respeitar suas indicações e contraindicações, sobretudo na sua interação com outros medicamentos em uso.