Por que os estados não conseguem gastar fundo bilionário da segurança
Estados recebem 50% do Fundo Nacional de Segurança Pública em suas contas todo ano, mas execução dessa verba é bastante lenta
atualizado
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A dificuldade dos estados e do DF em utilizar a verba bilionária do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) perpassa diferentes governos há mais de cinco anos, e é um desafio que está sendo encarado pela atual gestão do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).
Todos os anos, metade do FNSP é repassado diretamente para as contas dos estados, recurso que pode ser usado em diversos tipos de investimento na área de segurança, da compra de viaturas e armas à construção de delegacias e batalhões.
Acontece que mais de R$ 3 bilhões dessa verba repassada para os estados e DF está “empossada”, sem execução. Para se ter uma ideia, desse total, cerca de R$ 1 bilhão corresponde a repasses do período entre 2019 e 2021. Ou seja, mesmo sendo valores transferidos há mais de dois anos, eles ainda não foram utilizados.
O FNSP foi criado no início dos anos 2000, mas só foi se tornar um fundo mais atrativo a partir de 2019, quando passou a receber dinheiro das loterias e começou a ser repassado (50%) no modelo “fundo a fundo”, em que a verba vai direto para as contas dos estados, diminuindo a burocracia para executar o recurso.
Motivos para “empossamento”
Professor da UnB e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Arthur Trindade avalia que existe uma dificuldade técnica dos estados em executar a verba federal.
“Alguns estados não conseguiam executar os recursos porque simplesmente eles não estavam previstos no orçamento estadual. É algo básico, mas acontece”, exemplifica o pesquisador.
Nesse cenário, o governo federal vem se organizando desde o ano passado para auxiliar os estados a gastar esse recurso. Um dos planos mais recentes é auxiliar diretamente na confecção da lei orçamentária anual do estado.
“O que se nota é uma grande assimetria da capacidade técnica dos estados. Alguns deles, como o Rio Grande do Sul, possuem profissionais qualificados para realizar a gestão do Fundo de Segurança Pública, ao passo que em outros estados essa gestão é feita por servidores que acumulam outras tarefas”, pontua ainda Trindade.
Em agosto do ano passado, foi estipulado que os estados e o DF criem equipes de cinco servidores para cuidar exclusivamente do recurso do Fundo Nacional de Segurança Pública.
“Se o estado não tem na sua equipe quem entenda de orçamento, ele não executa política pública no final. Não é nem que falta dinheiro, falta autorização para gastar aquele dinheiro”, explica ao Metrópoles a atual diretora de Gestão do Fundo Nacional de Segurança Pública, Camila Pintarelli.
De acordo com a gestora, também estão sendo realizadas reuniões semanais com as secretarias estaduais para tirar dúvidas e auxiliar na execução da verba, o que já está refletindo em uma maior execução do orçamento, que será medida nos próximos meses.
Mudanças na gestão do fundo
As gestões dos ministros Flávio Dino e do atual Ricardo Lewandowski são diferentes quanto ao uso do Fundo Nacional de Segurança Pública.
Na gestão de Dino, o Ministério da Justiça tentou direcionar mais a forma como os estados devem usar o recurso. Portaria de agosto do ano passado previa que 80% da verba deveria ser direcionada para o combate a mortes violentas intencionais.
Já a atual gestão de Lewandowski tirou essa exclusividade, e definiu, em nova portaria de maio deste ano, que esses 80% também podem ser utilizados no enfrentamento ao crime organizado e proteção patrimonial.
Segundo Camila Pintarelli, a diretora de Gestão do FNSP, essa exclusividade de boa parte dos repasses ser voltado para o combate a homicídios estava dificultando a execução da verba.
“Tem estado que tem índice de morte violenta intencional realmente assustador, mas tem outros que não têm esses índices tão elevados, que têm mais problema com crime patrimonial e criminalidade organizada”.