Políticos criticam repressão policial contra indígenas na Câmara
Manifestação acabou em confronto. Indígenas são contra a aprovação de um projeto de lei que altera uso de terras demarcadas
atualizado
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O confronto entre indígenas, policiais militares e policiais legislativos desencadeou uma série de críticas à repressão contra a manifestação desta terça-feira (22/6). Diversos indígenas sofreram com as bombas de gás lacrimogêneo e três agentes foram feridos – um policial legislativo e um militar, além de um profissional da área administrativa da Câmara – por flechadas.
O integrante da Polícia Legislativa, Ricardo Miranda, foi levado pelo Corpo de Bombeiros do Distrito Federal para atendimento no Hospital Santa Lúcia, onde seria submetido a uma cirurgia para retirada de uma flecha alojada na perna.
O agente administrativo, atingido no tórax, também foi levado ao Santa Lúcia, e está fora de perigo.
A PMDF confirmou também ferimento no pé de um integrante da corporação. Ele foi atendido ainda na Câmara e passa bem.
Representantes de várias etnias do país foram ao Congresso protestar contra a tramitação do projeto de lei 490, que está em pauta na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ ) e permite a retirada de demarcação de terras indígenas já homologadas. A proposta, que é defendida pelo governo federal, ainda liberaria mineração comercial e agricultura em terras indígenas.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) usou as redes sociais para repudiar a ação. “É inaceitável a covardia com que as manifestações dos povos indígenas foram reprimidas pela polícia em Brasília. É preciso que a sociedade brasileira repudie a banalização dessas agressões. Um país que não respeita seus povos originários não pode ir pra frente”, criticou Lula.
É inaceitável a covardia com que as manifestações dos povos indígenas foram reprimidas pela polícia em Brasília. É preciso que a sociedade brasileira repudie a banalização dessas agressões. Um país que não respeita seus povos originários não pode ir pra frente.
— Lula (@LulaOficial) June 22, 2021
A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), acompanhou a manifestação e se queixou da violência policial. “A imbecilidade política levou a violência. O que os indígenas queriam era tirar o projeto 490 da pauta até dia 30, quando 0 STF [Supremo Tribunal Federal] decide sobre o marco temporal das terras indígenas. A direção da Câmara tem de explicar porque sua polícia dispersou os manifestantes e chamou a PM”, frisou.
O deputado Zé Carlos (PT-MA) criticou a atuação policial. “Indígenas em protesto em prol de seus direitos de demarcações de terras indígenas foram recebidos na Câmara com tiros de borracha, bombas e violência de policiais. Até quando manifestações em defesa de direitos e a liberdade de expressão, serão motivos para tamanha violência?”, escreveu no Twitter.
O líder do PT no Senado, senador Paulo Rocha (PT-PA), também reclamou da reprimenda e classificou como “absurda” a reação da polícia. “Neste momento, indígenas são recebidos com bombas na entrada da Câmara. Há duas semanas, vários indígenas estão acampados na Esplanada em protesto ao projeto que dificulta a demarcação de territórios”, destacou.
A líder da bancada do PSol na Câmara, deputada Talíria Petrone (PSol-RJ), condenou o confronto. “É um absurdo que isso aconteça no que deveria ser a casa do povo”, publicou nas redes sociais.
O perfil oficial do PSol também se manifestou. “Os povos indígenas são recebidos agora na Câmara com bala e gás”, ressaltou.
O protesto
Lideranças indígenas afirmam que, caso o projeto seja aprovado, terras indígenas serão liberadas para exploração predatória e ficariam inviabilizadas novas demarcações. Eles pedem que o projeto seja definitivamente retirado da pauta.
Na prática, o projeto de lei passa a permitir a implantação de hidrelétricas, mineração, estradas e arrendamentos, entre outros, em reservas.
As mudanças
A proposta altera o Estatuto do Índio e atualiza o texto da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215. O projeto permite a supressão de direitos, como a posse permanente de terras e o direito exclusivo sobre seus recursos naturais.
O texto permite retirar o “usufruto exclusivo” dos indígenas de qualquer área “cuja ocupação atenda a relevante interesse público da União”.
O projeto também aplica às demarcações o chamado “marco temporal”, pelo qual só teriam direito à terra os povos indígenas que estivessem em sua posse, no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, ou que estivessem em disputa judicial ou conflito direto com invasores.
Tramitação
O texto já passou pelas comissões de Agricultura e de Direitos Humanos. Nessa última, recebeu parecer contrário. Caso seja aprovado na CCJ, segue ao plenário e, se também for aprovado, vai ao Senado.
O relator na CCJ é o deputado Arthur Maia (DEM-BA) e o autor, o deputado Homero Pereira (PR-MT), já falecido.