“Vontade” de privatizar: relembre opiniões de Bolsonaro sobre a Petrobras
Presidente dá sinais mistos sobre a estatal petrolífera e já negou a venda da empresa e dos bancos públicos
atualizado
Compartilhar notícia
Na última quinta-feira (14/10), ao se queixar da responsabilização pelo aumento do preço dos combustíveis, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse ter “vontade” de privatizar a Petrobras. Apesar de a venda da companhia ser defendida pela equipe econômica do governo, Bolsonaro nem sempre foi favorável à medida.
“Já tenho vontade de privatizar a Petrobras, tenho vontade. Vou ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer, porque o que acontece: eu não posso, não é controlar, eu não posso direcionar o preço do combustível, mas quando aumenta a culpa é minha”, disse o chefe do Executivo nacional em entrevista a uma rádio pernambucana.
Durante os 27 anos que passou na Câmara dos Deputados, o então deputado adotou um tom protecionista em assuntos relativos à Petrobras. E defendia que a estatal ficasse sob a alçada do governo.
Capitão reformado do Exército, ele seguia a linha estatista dos militares e defendia que a empresa ocupava uma posição estratégica para o setor energético. Em abril de 2009, em discurso no plenário da Câmara, Bolsonaro disse que a Petrobras deve muito aos militares:
“Nossa querida Petrobras deve muito aos militares – no Governo Médici, passamos de 12 milhas para 200 milhas o nosso mar territorial. Sem isso, a Petrobras não teria como tirar petróleo na parte seca do nosso continente”, afirmou o então deputado federal pelo PP, segundo registros das notas taquigráficas da Casa.
O principal ponto de inflexão veio quando se lançou à Presidência da República, em 2018. Aconselhado por economistas de perfil liberal, Bolsonaro passou a admitir a possibilidade de privatização da petroleira, mas não chegou a encampar abertamente a medida.
“Se não tiver uma solução, eu sugiro a privatização da Petrobras. Acaba com esse monopólio estatal. Se não tiver solução, tem que privatizar”, disse ele em em entrevista ao Central das Eleições, programa da GloboNews, em agosto de 2018.
Núcleo duro
Já no Palácio do Planalto, Bolsonaro deixou claro que o núcleo duro da Petrobras não seria privatizado. Desde o início do mandato, ocorreram vendas de ativos e de empresas subsidiárias, as quais foram celebradas pelo mandatário do país.
Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a privatização de subsidiárias de estatais pode ocorrer sem a necessidade de autorização prévia do Congresso Nacional e também sem licitação. O entendimento da Corte estabeleceu exigência de lei específica apenas para a venda das “empresas-mães”, como a Petrobras e os bancos públicos.
Em maio de 2020, em transmissão ao vivo pelas redes sociais,o presidente descartou a privatização da estatal petroleira: “A Caixa Econômica Federal não está nessa linha (de privatizações). O Banco do Brasil também não está nessa linha. A Petrobras, o núcleo também não está nessa linha.”
A privatização da Petrobras é defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, desde a campanha presidencial. E era também abraçada pelo primeiro presidente da estatal da gestão Bolsonaro, o economista Roberto Castello Branco.
Tradicionalmente resistentes a privatizações, ministros militares tiveram que ser convencidos pela equipe de Guedes de que algumas desestatizações eram necessárias. Foi após esse trabalho de convencimento que avançaram as privatizações da Eletrobras e dos Correios, por exemplo.
Política de preços na mira
Entre 2014 e 2015, no governo Dilma Rousseff (PT), a Petrobras manteve o preço dos combustíveis congelados nas refinarias, mesmo com o barril do petróleo em alta no mercado internacional. A medida tentava aliviar a inflação alta no país, mas acabou sendo um dos fatores responsáveis pelo prejuízo acumulado da estatal entre 2014 e 2017.
Criticada pelo mercado financeiro, a política adotada pela gestão petista foi alterada ainda no governo Michel Temer (MDB), quando a composição dos preços dos combustíveis passou a levar em conta o preço internacional do barril do petróleo e a cotação do dólar. Com isso, a Petrobras começou a repassar com maior frequência as flutuações do câmbio e do petróleo ao consumidor.
Na campanha, Bolsonaro garantiu não interferir na estatal. Entretanto, seguiu criticando aspectos da política de preços de combustíveis meses após assumir o cargo, pressionado pela inflação e por ameaças de paralisações de caminhoneiros. E negou possibilidade de tabelamento:
“Sabemos que o pessoal está reclamando que algum preço sobe. É natural. Assim como nós vendemos, nós também compramos, tá? É a lei da oferta e da procura. Não tenho como tabelar preço. Algum pessoal fica achando que devo tabelar preço de um produto ou de outro. Não vai haver tabelamento”, afirmou em 5 de dezembro de 2019.
Mudanças no comando
Ante frequentes reajustes de preços de combustíveis, as críticas de Bolsonaro à política de preços escalou e ele promoveu mudanças no comando da companhia em fevereiro deste ano. Roberto Castello Branco foi substituído pelo general Joaquim Silva e Luna, militar de confiança do presidente e que não se posiciona abertamente favorável à venda da empresa. A troca levou as ações da Petrobras a despencarem mais de 6%.
Recentemente, uma das soluções propostas por Bolsonaro foi a criação de um fundo para amortecer a flutuação do preço dos combustíveis no país. Esse fundo seria formado por dividendos da Petrobras pagos à União.
“Vim conversando com Montezano hoje no avião. Ele é presidente do BNDES. Pegando dicas com ele [sobre] o que a gente pode fazer. É criar um fundo regulador, é ver o lucro da Petrobras, aquilo veio para o governo federal, para nós. Ninguém vai meter a mão em nada”.
“Será que esse dinheiro da Petrobras que vem para nós — será, eu estou perguntando, será, eu não estou afirmando —, que é um lucro bilionário, nós não podemos converter e ir para esse fundo regulador?”, prosseguiu.
Segundo Bolsonaro, com essa proposta, os aumentos nos preços dos combustíveis não precisarão ser repassados na totalidade ao consumidor.
Em 8 de outubro deste ano, ao comentar novos aumentos no preço dos combustíveis no país, Bolsonaro afirmou que não vai congelar preços de combustíveis “na canetada”.
Dois dias depois, o mandatário voltou ao assunto e disse em tom de ironia que, se pudesse, passaria o comando da Petrobras ao vice, o general Hamilton Mourão (PRTB).
“O dólar está diretamente ligado ao preço do combustível por lei. Eu tenho que cumprir a lei. Eu não mandei… Não é que eu não mandei, eu não mando na Petrobras. Eu quero… Se eu pudesse, eu passava a Petrobras para o Mourão administrar: ‘Olha, se aumentar combustível, quem manda é o Mourão’”, afirmou Bolsonaro em entrevista à imprensa em Guarujá (SP).