Ciro dispara ataques contra Judiciário, MP e tucanos
Após perder o apoio do Centrão para Alckmin, pedetista direcionou verborragia contra Doria, magistrados e promotores de Justiça
atualizado
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O candidato do PDT à Presidência da República, Ciro Gomes, é conhecido por colecionar declarações polêmicas sobre adversários ao longo de sua carreira política. Nesta semana, após perder o apoio do Centrão para Geraldo Alckmin na corrida presidencial, direcionou sua atenção contra o PSDB e o Judiciário.
Em entrevista a uma emissora de televisão maranhense divulgada na última quarta-feira (25/7), o presidenciável disse que, caso vença a eleição, colocará o Judiciário e o Ministério Público em suas respectivas “caixinhas”. Afirmou também que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) só teria chance de sair da cadeia caso ele assumisse o poder.
Juristas e analistas do setor criticaram a postura do pré-candidato. Com a repercussão negativa, o pedetista alegou distorções em suas falas feitas por adversários. “Quando eu disse ‘a gente’, eu não quis dizer ‘eu’. Quis dizer os democratas, os que têm compromisso com o Estado democrático de direito, com o restabelecimento da autoridade, do império da lei, que, no Brasil, parece estar completamente deformada”, declarou.
Com o PT e Lula, idas e vindas
Rejeitado pelo PT como possível candidato do campo da esquerda, Ciro tenta manter distanciamento do partido, pelo menos até a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ser impedida formalmente pela Justiça Eleitoral. Um dia antes de ser lançado oficialmente à corrida presidencial, o pedetista disse: “O Brasil nunca terá paz enquanto o companheiro Lula não tiver sua liberdade restaurada”.
Semanas antes, em evento na Suécia, Ciro afirmou cogitar dar indulto ao ex-presidente. Segundo ele, Lula seria capaz de lhe mandar à “puta que pariu” caso decidisse a seu favor. “Lula ainda está recorrendo da decisão que o condenou. Se eu, amigo próximo a ele, disser que daria indulto a ele caso fosse eleito, eu imagino que poderia me mandar para a puta que pariu. Ou seja, ele teria uma reação adversa. […] Se eu falasse isso, ele me responderia: ‘Vai me indultar? Por quê? Eu sou inocente’.”
Em abril, antes da prisão de Lula, Ciro refutou a possibilidade de se lançar como candidato pelo partido. “Não sou ‘puxadinho’ do PT e jamais serei. Nos últimos 16 anos, apoiei Lula sem faltar um dia. Eles façam dessa história o que quiserem fazer”, disparou.
Doria e a Embratur
Na última quinta-feira (26/7), durante a convenção do PDT de São Paulo, Ciro atacou os tucanos, os quais controlam o Executivo do estado desde 1995, e fez elogios ao PSB, legenda cujo apoio formal ele busca na corrida eleitoral. Ao longo do evento, o pedetista criticou indiretamente Alckmin. “Eu não respondo por Rodoanel, por escândalo de trens de metrô. Eu não respondo pelo roubo da merenda das crianças”, disse Ciro, citando envolvimentos do PSDB paulista em escândalos recentes.
O pedetista também explorou o processo relativo às contas da gestão de João Doria (PSDB), pré-candidato ao governo paulista, no Instituto Brasileiro do Turismo (Embratur) entre 1986 e 1988. Ciro Gomes reafirmou que o ex-prefeito paulistano foi expulso da empresa após se envolver em um escândalo de corrupção. Doria, segundo Ciro, foi investigado por um repasse de US$ 1,3 milhão da Comunidade Econômica Europeia.
“Eu era prefeito de Fortaleza e ainda tinha cabelo, mas nenhum branco [risos]. Esse cidadão foi botado para fora da Embratur por roubalheira, corrupção. Está na internet”. Procurado pela reportagem, o TCU informou que aprovou com ressalvas as contas do tucano quando o PSDB estava à frente da autarquia federal do turismo. A assessoria do ex-prefeito de São Paulo disse que não comentará as declarações de Ciro.
Na convenção, o PDT paulista fechou aliança com o PSB pela eleição de Márcio França ao governo local. A medida foi uma cartada da incursão de Ciro pela aliança nacional. A convenção foi recheada de afagos do pedetista ao PSB. “Peço, com o mesmo entusiasmo e fervor que tenho por São Paulo, Márcio França governador”.
“Boçal”
Os tucanos não são os únicos alvejados pelo presidenciável. Um dos alvos preferidos do pedetista durante a pré-campanha ao Palácio do Planalto é o candidato do PSL, o deputado Jair Bolsonaro. O ex-militar já foi chamado de “fascista” e “espertalhão” pelo ex-governador cearense. Em junho, durante debate sobre impostos, Ciro classificou Bolsonaro como um “boçal despreparado”.
“O próximo presidente da República vai tomar posse com um deficit primário ao redor de R$ 150 bilhões. Daí, pega um tresloucado desses, boçal despreparado, e desorienta o debate. Esse é o problema dele”, disse.
Sobre Marina Silva (Rede), Ciro alegou não sentir nela apetite de candidata. Para ele, a incerteza política brasileira precisa de testosterona para ser solucionada. “Não vejo ela com energia. O momento é muito de testosterona. Não elogio isso. É mau para o Brasil, mas é um momento muito agressivo e ela tem uma psicologia avessa a isso. Não sei, eu estou achando que ela não é candidata.”
A ex-deputada federal Luciana Genro (PSol-RS) criticou as afirmações de Ciro. No Facebook, divulgou um vídeo classificando as declarações como machistas. Na publicação, Ciro contra-atacou: chamou-a de “descuidada e oportunista”.
Erros e “bobagem”
Um episódio da campanha de 2002 assombra Ciro Gomes. Naquele ano, quando também foi candidato a presidente, Ciro disse o seguinte sobre a atriz Patrícia Pillar: “Minha companheira tem um dos papéis mais importantes [na campanha], que é dormir comigo”. Ao notar o desconforto da declaração, ele ainda tentou contornar a situação. Em vão. A frase ainda ecoa quando se trata do pedetista.
Em março, em entrevista ao site Poder360, Ciro Gomes afirmou: “Foi a maior bobagem que eu falei na minha vida e, por ela, pedi desculpa na mesma hora, dizendo que era uma brincadeira. Isso faz 16 anos”. No lançamento de sua candidatura ao Planalto, em 20 de julho, Ciro disse que comete erros em suas falas, mas “nunca por desonestidade intelectual”. “Não se restaura a paz pública com cultura de ódio, frases de efeito e mais violência. Falo 10 horas por dia e eventualmente cometo erros. Nenhum deles por desonestidade intelectual. […] Evidentemente, posso errar aqui e ali. Nunca tive a pretensão de ser um anjo”.
Processos e ataques ao MP
As declarações rendem dezenas de processos contra Ciro Gomes. Somente na Justiça do Ceará, são 77 ações por danos morais, injúria e calúnia, segundo levantamento do site Jota. O processo mais recente contra o pedetista é relativo ao episódio em que ele chamou o vereador paulistano Fernando Holiday (DEM) de “capitãozinho do mato”. Em 18 de junho, Ciro disse: “Esse Fernando Holiday é o capitãozinho do mato. A pior coisa que tem é um negro que é usado pelo preconceito para estigmatizar”.
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) pediu a abertura de inquérito contra o presidenciável para apurar possível crime de injúria racial. Em reação, Ciro disparou contra a promotora que fez a solicitação de investigação. Ele a chamou de “filha da puta”.
“Um promotor aqui de São Paulo resolve me processar por injúria racial. E pronto, um filho da puta desse faz isso. Ele que cuide de gastar o restinho das atribuições dele, porque, se eu for presidente, essa mamata vai acabar”. O presidente do PDT, Carlos Lupi, tentou apaziguar a situação. Para o cacique pedetista, a mãe da profissional “não merecia” os xingamentos. Contudo, ele alegou que Ciro “fala a verdade” quando critica eventuais excessos do MP.