Unesco: Reforma no ensino médio deve incluir formação de professores
A medida provisória, editada pelo presidente Temer, não toca na formação docente, no salário do professor ou na sabida falta de tempo para planejar as aulas
atualizado
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A nova arquitetura do ensino médio, que promete colocar o aluno como protagonista do próprio aprendizado, é importante, mas não solucionaria os problemas da educação brasileira sem que se invista na formação de professores e de gestores escolares. É assim que a coordenadora de Educação da Unesco (órgão das Nações Unidas responsável pelas áreas de Educação, Ciência e Cultura), Rebeca Otero, avalia a reformulação anunciada semana passada pelo governo Michel Temer, cuja principal mudança é a adoção de um currículo 50% comum e 50% específico, além da ampliação da política de tempo integral.
A medida provisória editada pelo presidente Temer a pedido do ministro da Educação, Mendonça Filho, não toca na formação docente, no salário do professor ou na sabida falta de tempo para planejar as aulas – algo que Rebeca considera primordial para reverter o fracasso do ensino médio brasileiro, já constatado pelos números do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), estagnados há quatro anos e, desde 2013, abaixo das metas estipuladas pelo Ministério da Educação (MEC).
Formação
Para Rebeca, no entanto, é preciso ir até a raiz do problema. “A formação inicial do docente nos cursos de licenciatura e de Pedagogia é precária no Brasil, pois não dá insumos suficientes para que ele chegue à sala de aula capaz de contornar problemas. O governo precisa acompanhar isso.”
Ela ainda destaca que as faculdades que formam docentes são desconectadas da vida prática e que esses profissionais, que não têm plano de carreira satisfatórios, são pouco valorizados. “Isso os obriga a se dividirem entre vários empregos, o que tem ligação direta com a falta de tempo para o planejamento de aulas”, afirma.
“Como resultado, em geral, temos professores com métodos ultrapassados e impositivos de ensino, ancorados no pressuposto de que eles sabem tudo e o alunos, nada. Isso precisa mudar. O estudante não quer ficar apenas copiando da lousa”, completa.
Investir
Apesar dessas críticas, a coordenadora da Unesco afirmou que a mudança pretendida pelo governo “é bem-vinda”, principalmente por causa da parte flexível do novo currículo. “O aluno deve investir tempo e esforço no que ele gosta e quer aprender, no que ele acha que vai ser necessário para a sua vida”, afirma, salientando a importância de investimentos na educação profissional.
Tem de haver ofertas mais variadas e conectadas com a realidade do mercado de trabalho, como eletrônica, informática, robótica. Hoje, a maior parte dos cursos é da área administrativa, pois não precisa de tanta infraestrutura.
Rebeca Otero
Sobre o fomento à ampliação do número de alunos estudando em tempo integral (a meta do Ministério da Educação é que 500 mil novos estudantes estejam enquadrados nesta modalidade, que preconiza 7 horas de aula por dia, até o ano que vem), Rebeca diz que é imprescindível que a quantidade esteja aliada à qualidade e à interdisciplinaridade das ações.
“Não basta fazer com que os jovens fiquem mais tempo na escola se forem aulas ‘mais do mesmo’. Isso pode ser entediante para eles”, diz. A solução, segundo ela, é trabalhar menos com as chamadas “decorebas” e mais com os objetivos maiores da Educação: “Transformar vidas, trabalhar a cidadania e ganhar qualidade de vida”.
Rebeca também vê uma inversão de influências entre o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o conteúdo ensinado nas salas de aula nesta etapa da educação. Hoje, o que cai no Enem é que pauta o que será lecionado aos alunos do ensino médio, quando, para ela, deveria ocorrer o processo inverso – algo que o novo modelo, se aprovado no Congresso Nacional, pode ajudar a realizar. O Senado abriu consulta pública sobre a medida provisória do ensino médio integral.