Sete membros do Conselho de Política Penitenciária renunciam
Em carta ao Ministério da Justiça, eles criticam política do governo, contrária aos direitos humanos, e mudanças no conselho. Veja íntegra
atualizado
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Sete integrantes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), incluindo o presidente do colegiado, divulgaram nesta quarta-feira (25/1) uma carta de renúncia endereçada ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes (foto em destaque).
São eles: Alamiro Velludo Netto, professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP); Gabriel Sampaio, ex-secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça; os advogados Hugo Leonardo, Leonardo Costa Bandeira e Leonardo Yarochewksky; o promotor Marcellus Uggiette e o defensor público Renato de Vitto.
Na carta, eles alegam que o Ministério da Justiça tem “desprezado o Conselho” e formulado uma política contrária aos direitos humanos. Os ex-conselheiros criticam também e elaboração do Plano Nacional de Segurança Pública pelo governo federal e a abertura de novas vagas de suplência no órgão.
O que se tem visto, entretanto, é a formulação de uma política, encabeçada por este ministério, que ruma em sentido contrário a tudo isso. Navega com a popa da embarcação. Poder-se-ia nestas sintéticas razoes de renúncia apontar muitos defeitos, vícios de compreensão e caminhos equivocados, ao menos em nosso sentir, pelo qual o governo federal conduz a sua forma de atuação no âmbito da execução penal.
Carta de renúncia
Carta de demissão: Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) by Metropoles on Scribd
De acordo com o documento, a decisão de abrir oito novas vagas de suplência, reformando o regimento do órgão por meio da Portaria 1.107, de 19 de janeiro de 2107, viola regras e mostra-se como “verdadeira afronta à autonomia do Conselho”. “O que se vê é uma clara tentativa de controle da voz e da opinião deste CNPCP”, afirma a carta de renúncia.
De acordo com o advogado Hugo Leonardo, esse ato dos conselheiros “se dá em razão de uma política irracional do Ministério da Justiça de extermínio das populações mais pobres encarceradas no país e de uma impossibilidade de ação frente a uma cultura autoritária e violenta que vigora no ministério nesse momento”.
Na reunião do CNPCP de novembro de 2016, o colegiado ficou dividido sobre a proposta de indulto natalino que seria assinada pelo presidente Michel Temer (PMDB/SP). O conselho sempre é ouvido pelo Ministério da Justiça acerca do indulto, elaborando uma sugestão de minuta.
O relator da proposta em 2016, desembargador Otávio de Almeida Toledo, modificou a estrutura tradicional do decreto, excluindo a possibilidade de indulto para condenados por crimes com violência ou grave ameaça, mas, ao mesmo tempo, criando a hipótese de comutar penas de prisão por restritivas de direitos para condenados por crimes de menor potencial lesivo, visando alcançar um maior número de pessoas.
A maioria do colegiado, porém, considerou a proposta um retrocesso e acompanhou o voto vista do conselheiro Gabriel Sampaio, que manteve as hipóteses de indulto dos anos anteriores e acolheu a novidade da comutação de penas.
O Decreto 8940/2016, assinado pela presidência da República, não seguiu nem a minuta do CNPCP nem o esquema proposto pelo desembargador Almeida Toledo. Na visão dos conselheiros, o decreto de 2016 representou um retrocesso na política carcerária, o que também foi criticado na carta de renúncia. Não foi a primeira vez que a presidência da República ignora a sugestão do CNPCP. Os decretos de 2014 e 2015 seguiram o texto do ano de 2013.
Notas
O Ministério da Justiça publicou uma nota à imprensa, no fim da tarde desta quarta-feira, sobre a renúncia coletiva. No texto, afirma que o Conselho “há anos é ignorado” em matéria de indulto, “sobretudo porque suas proposições sequer eram plausíveis de pronta aplicação prática”.
“Com sorte, o indulto tinha algum resultado concreto um ou dois anos depois. Por outro lado, o último indulto (já na atual gestão) separa o joio do trigo: concede o benefício àqueles que cometeram crimes sem violência ou grave ameaça e dificulta-o àqueles que cometeram crimes com violência ou grave ameaça”, declara.
Todos os sete membros que renunciaram na manhã de hoje foram indicados pelo ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, durante a presidência Dilma Rousseff. Cinco membros indicados na gestão Cardozo permanecem no Conselho. Entre eles, o conselheiro Otávio de Almeida Toledo, desembargador, que foi relator da proposta de indulto em 2016, preterida pelo próprio colegiado e pelo Ministério da Justiça.
Almeida Toledo alega que sempre atuou de forma técnica e que não concorda “com a politização do Conselho” – “tanto que não assinei nenhuma das cartas, mas entendo perfeitamente a posição dos que foram nomeados pelo ministro [Alexandre de Moraes]. Foi uma reação a uma ação política e de política eu não entendo”.
Cinco membros divulgaram mais cedo uma carta reafirmando a confiança no trabalho do Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Os promotores Fernando Kfouri, e Roberto Porto, o advogado Aldovandro Modesto Chaves, o coronel André Luiz de Almeida e Cunha e o juiz Ulysses de Oliveira Gonçalves Jr, que assinam a missiva, foram todos indicados ao colegiado durante a presidência de Michel Temer.