Em livro, governo recomenda leitura da Bíblia e incomoda servidores da PRF
No livro, a pasta recomenda leituras diárias da Bíblia Sagrada, livro que é referência para os evangélicos e católicos
atualizado
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De acordo com queixas de servidores da Polícia Rodoviária Federal (PRF), o governo determinou, por meio do Ministério da Justiça, a distribuição aos funcionários da corporação, exemplares de um devocional. No livro, a pasta recomenda leituras diárias da Bíblia Sagrada, livro que é referência para os evangélicos e católicos.
Intitulado como “Pão Diário – Segurança Pública”, o livro visa “estimular a espiritualidade, contribuindo para o bem estar e qualidade de vida do servidor PRF”, segundo um dos trechos. Fazendo menção a Deus e à Bíblia, o livro não menciona em nenhum momento outros credos.
Além do estímulo de fazer uso do devocional em “ambiente de trabalho”, para “melhor o desempenho nas atividades diárias”, nas primeiras páginas, há uma “palavra” do diretor-geral da corporação Marco Antonio Territo. As reclamações foram divulgadas pela GloboNews.
À reportagem da GloboNews, alguns servidores se mostraram incomodados com o começo do incentivo, que segundo eles, se deu “de forma injustificada” e pode caracterizar “violação de liberdade religiosa”.
Além disso, os agentes também mencionaram que a distribuição gerou certo “constrangimento” porque, apesar de não ser obrigatório, o projeto “estimula o exercício da fé no ambiente de trabalho, duas coisas que não deveriam se misturar”.
Contrato
A parceria entre o Ministério da Justiça e os autores do devocional foi antecipada pela coluna Guilherme Amado. O acordo foi assinado em agosto de 2021, na gestão do atual ministro, Anderson Torres, e durará dois anos. Um dos produtos da organização, o aplicativo “Pão Diário — Segurança Pública” oferece cursos como “Tornando Deus e Sua Palavra uma prioridade” e “Aprendendo a orar”.
O Ministérios Pão Diário, responsável pela autoria da publicação, informou à Receita Federal ser uma organização religiosa sediada em Curitiba. No ano passado, foi contratado por R$ 11,2 mil pelo Exército, sem licitação, para distribuir 2 mil livros intitulados “Pão Diário Edição Militar”.
A obra tratava de “valores cristãos encontrados na sabedoria da Bíblia”. Em outro contrato, de valor não informado, o Exército também intermediou a entrega de materiais da entidade na Operação Acolhida, que lida com imigrantes venezuelanos em Roraima.
Posição da PRF e Ministério da Justiça
Quando questionada pela reportagem, a PRF informou que se houver servidores interessados em atividades de outras religiões, precisam entrar com solicitação justo à corporação.
“As atividades de religiões não representadas formalmente – não só as de matriz africana, mas também budistas, hinduístas, muçulmanos, entre outras – poderão ser realizadas no âmbito da instituição, mediante solicitação dos servidores interessados e demanda que as justifique, cabendo ao servidor responsável pela gestão da Capelania PRF viabilizar o contato com os ministros religiosos dos credos solicitantes”, respondeu o órgão.
A PRF complementou dizendo não ter identificado denúncias contrárias ao programa na ouvidoria. Disse também que não “houve gasto de dinheiro público” com o material.
Acerca das respostas trazidas na matéria original, a reportagem do Metrópoles questionou a instituição sobre quem teria solicitado o programa religioso, já que, caso um servidor queira que outro credo seja incluído, precisa pedir.
Também foi questionado sobre quem teria arcado com os custos de edição, impressão e distribuição do material, que segundo a PRF, não consumiu valores públicos. Em nota, a PRF respondeu:
“Sobre os questionamentos deste portal temos a informar que se trata de um Projeto Estratégico da PRF voltado à assistência espiritual, chamado Capelania e criado pela própria instituição, visando a saúde integral do servidor PRF. Estudos científicos apontam que a saúde integral é composta por saúde física, mental e espiritual. Estatísticas apontam que o serviço de Capelania gera a valorização dos direitos humanos.
Entre os benefícios, espera-se a redução da violência policial, da violência doméstica, do suicídio policial; a melhoria do ambiente de trabalho e dos relacionamentos familiares. Ou seja, se busca a melhoria da qualidade de vida do policial, que apresentará melhores condições para o desempenho de suas funções.
Existe um acordo de cooperação com o Ministério Pão Diário, por meio do qual foi feita a doação dos livros Pão Diário e se organizou o curso de formação em Capelania na Segurança Pública. O acordo não prevê repasse de verba pública. O curso e os livros não geram nenhum custo para a corporação.”