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Senador Telmário Mota já pagou R$ 437 mil por aluguel de carro que vale R$ 128 mil

O senador transfere mensalmente R$ 18 mil, provenientes da cota parlamentar, a Daura de Oliveira Paiva, que não possui empresa de locação

atualizado

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Marcelo Camargo/Agência Brasil
Imagem colorida do ex-senador Telmário Mota
1 de 1 Imagem colorida do ex-senador Telmário Mota - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O senador Telmário Mota (Pros-RR) mantém um ritual mensal desde quando assumiu o cargo, em 2019. Ele deposita R$ 18 mil a cada 30 dias para uma pessoa física, chamada Daura de Oliveira Paiva, pelo aluguel de uma caminhonete. Desde então, o valor do desembolso, com verba da cota parlamentar, já chegou a R$ 437 mil.

Com base nos dados do Portal da Transparência do Senado, é possível ver as quantias ressarcidas ao senador para pagar despesas com locomoção, hospedagem, alimentação e combustíveis. Nos quatro primeiros meses de 2021, o parlamentar já usou R$ 90.696,75 da cota parlamentar para esses gastos – R$ 72 mil apenas pelo aluguel do veículo.

De acordo com as notas, os R$ 18 mil são para pagar o aluguel mensal de uma Mitsubishi Triton Sport GLX, modelo 2019. Na tabela Fipe –  principal referência no mercado de carros usados e seminovos –, o veículo está avaliado em R$ 128.723. Isso significa que, com o montante embolsado por Daura até agora, seria possível comprar ao menos três caminhonetes.

A cota parlamentar não pode ser usada para compra de patrimônio, mas a comparação com o valor do bem alugado por tanto tempo faz surgir dúvidas sobre a racionalidade do uso da verba pública.

Mesmo na opção aluguel, entretanto, a quantia gasta mensalmente pelo senador chama a atenção pela discrepância em relação a valores facilmente constatados em uma consulta rápida a empresas formais, especializadas em aluguel de veículos.

Em uma busca no site de locação de veículos Localiza, na franquia de Boa Vista (RR), é possível alugar, mensalmente, caminhonetes do mesmo grupo da usada pelo senador. Os preços diários variam, mas o plano mais caro é de R$ 302,23 por dia, e com proteção básica ao carro, contra coisas como roubo, furto e pequenos acidentes. Ao fim do mês, isso significa um gasto, a cada 30 dias, de R$ 9.369. Ou seja, metade do valor desembolsado por Telmário com dinheiro público.

O Metrópoles também conversou com o proprietário de uma franquia da Mitsubishi, que não quis ser identificado. Ele afirmou que o valor do aluguel pago pelo parlamentar está acima da média.

Outra simulação fácil de ser feita por meio da internet é a de leasing – uma espécie de contrato de aluguel do carro por um período estabelecido, porém na qual o banco oferece a opção de compra do veículo ao fim da assinatura, nos valores da tabela Fipe. Nesse modelo, é possível arrendar um carro de R$ 130 mil por R$ 3.995,52 mensais, em 36 meses. Contudo, há uma entrada de 20% do valor (R$ 26 mil, algo como uma mensalidade e meia da paga atualmente pelo senador). No fim desses três anos, a caminhonete poderia ser adquirida por R$ 169.838,72, já pagos nesse período.

O carro locado por Telmário fica em Boa Vista, capital de Roraima, para uso do senador quando ele não está em Brasília para as sessões do Senado – normalmente, em sábados e domingos, além de dias eventuais no início e no fim de cada semana.

Quando estão em Brasília, os senadores têm carro oficial, com motorista, à disposição para transitar por onde quiserem.

“Desvio de finalidade”

O advogado Thiago Sorrentino, especialista em direito do Estado e tributário, afirma que, sem um devido processo de apuração, não é possível cravar que haja algum ilícito na atitude de Telmário Mota.

Ele cita o que é considerado ilícito em casos envolvendo patrimônio e recursos públicos. “Incluem-se como atos ilícitos contra o patrimônio público o desvio de finalidade, a inexistência de motivos e a ilegalidade do objeto. A circunstância de haver pagamentos recorrentes de valor incompatível com o aluguel do objeto pode sim, em tese, caracterizar esse ilícito”, declara Sorrentino.

O advogado explica que já três órgãos e pessoas competentes para pedir a abertura dessa apuração: “O próprio Senado, via controle interno, o Tribunal de Contas da União (TCU), via controle externo, mas, mais importante, qualquer cidadão poderia ajuizar uma ação popular”, pontuou.

Transparência

O professor Diego Mota Vieira, do Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB), especialista em administração pública, disse que “a princípio, estranha o aluguel da caminhonete ser pago a uma pessoa física”, já que existem no mercado inúmeras empresas prestadoras desse serviço.

O especialista afirmou que a transparência não foi priorizada pelo Senador, neste caso. “Observando o princípio de transparência com o uso dos recursos públicos, espera-se a realização de uma cotação do valor mensal do aluguel dessas caminhonetes em algumas dessas empresas para então selecionar objetivamente a melhor oferta”, explicou.

“Sobre alugar ao invés de comprar um veículo como este, novamente seria interessante fazer as contas, porque, ao adquirir uma caminhonete há uma série de custos envolvidos, tais como seguro e manutenção, por exemplo”, opinou Vieira.

Para finalizar, o especialista declarou que “espera-se que um senador e sua equipe de assessoramento técnico priorizem a eficiência e a transparência no emprego dos recursos públicos”.

Outro lado

A reportagem não conseguiu contato com a locadora do carro. O espaço permanece aberto para Daura de Oliveira Paiva.

O Metrópoles também procurou a assessoria do parlamentar, em busca de uma posição do senador sobre as opções pelo aluguel e pelo contrato com uma pessoa física, não com uma empresa de locação formal. A resposta do gabinete de Telmário foi enviado na segunda-feira (7/6).

No texto, ele critica a reportagem por informar que a despesa reiterada poderia ter servido para a aquisição de ao menos três caminhonetes do mesmo tipo até agora, alegando que a afirmação “é sensacionalista e inverídica, pois todos os custos de manutenção, seguro, IPVA, revisões, troca de peças são mantidos exclusivamente pelo locador. É sabido que tais custos, referentes ao modelo da caminhonete são bastante elevados”.

“Fizemos cotações com empresas privadas e pessoas físicas, porém, as empresas não possuíam, à época da contratação, disponibilidade do
modelo desejado pelo período necessário”, sustenta a nota ao falar sobre a razão de fazer o contrato com uma pessoa física, não com uma empresa de locação formal.

E prossegue, sem explicar porque o valor do aluguel é muito mais alto do que nessas empresas, alegando apenas que situações semelhantes “nunca” foram colocadas “sob suspeição”.

“Sabe-se, ainda, que o Distrito Especial Indígena DSEI Leste, quando era indicação do ex-senador Romero Jucá, alugava mais de 80 pick ups dessas por R$ 20.000,00 (vinte mil reais) cada e nunca foi colocado em suspeição.”

Leia a nota na íntegra:

Nota de Esclarecimento by Lourenço Flores on Scribd

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