Reforma da Previdência não põe fim a privilégios de algumas categorias
Atual proposta ainda mantém regime especial para políticos, militares e servidores, reduzindo resultados desejados
atualizado
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O discurso de que a reforma da Previdência trata todos os trabalhadores de igual para igual foi colocado em xeque, segundo economistas, principalmente depois das últimas flexibilizações acordadas entre o governo e o relator, deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA). Uma série de categorias continuará a ser privilegiada com regras mais brandas, como políticos e servidores públicos.
Em diferentes ocasiões, o relator e representantes do governo têm destacado pontos que serão comuns à maioria dos brasileiros caso a proposta seja aprovada pelo Congresso, como a limitação do valor da aposentadoria ao teto do INSS (R$ 5.531,31). Mas outros aspectos da reforma não se aplicam de fato a todos.
“O governo deixou muito solto. Ficou muito no simbólico, talvez mais para discurso do que uma coisa realmente estruturada”, diz um economista na condição de anonimato. “O texto também é muito silente em relação a acúmulo de benefícios por políticos. Não vejo o texto sendo autoaplicável a eles, teria de ter alguma interpretação judicial.”
Nos últimos dias, o relator também lançou a ideia de permitir que os políticos tenham um plano de previdência complementar, assim como os servidores. A iniciativa exigiria que a União pagasse contribuição igual à do beneficiário, de até 8,5% sobre a parcela do salário que está acima do teto do INSS. Hoje, nenhum funcionário que exerça cargo de confiança ou político pode aderir a fundo de previdência complementar patrocinado pelo governo.
Servidores
Após um lobby intenso de professores e policiais civis e federais, que hoje têm regras especiais de aposentadoria, o governo e o relator desistiram de igualá-los aos demais trabalhadores. Com isso, eles terão de cumprir idade mínima menor, de 60 anos. O argumento oficial é que outros países mantêm a diferenciação para essas profissões, mas a decisão implica retirar do texto a proibição de qualquer caracterização de exigências por categoria.
“Isso, do meu ponto de vista, não é um demérito do governo, mas sim da sociedade”, diz o economista Paulo Tafner, do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). “Em todas as áreas, tudo o que se ouve é ‘queremos reduzir desigualdade’. A hora que tem uma proposta com enorme igualdade de tratamento, o que acontece? Grupos organizados dizem ‘queremos igualdade sim, mas para os outros’. Trata-se, do meu ponto de vista, de uma esquizofrenia social.”
A economista Ana Carla Abrão, ex-secretária de Fazenda de Goiás e filha da senadora Lúcia Vânia (PSB-GO), também acredita que o regime previdenciário brasileiro precisa ser mais justo do ponto de vista social. Ela, que é contra a diferenciação de idade mínima entre homens e mulheres, defende a unificação das regras. “Há privilégios que tornam a Previdência regressiva, ou seja, ela beneficia os mais ricos em detrimento dos mais pobres. Isso tem de mudar.”
A retirada dos servidores estaduais e municipais da reforma da Previdência também foi vista como manutenção de privilégios, além de privar os Estados de uma solução para suas finanças. A medida, anunciada como sinal de respeito à autonomia federativa, é considerada uma “excrescência” por técnicos estaduais e economistas. Ninguém garante que os Legislativos aprovarão as regras de aposentadoria nos Estados – a solução seria o relator fixar um prazo para isso, que certamente expiraria e resultaria na extensão das regras da União a todos.
O temor é que eles acabem cristalizando seus privilégios e desidratem ainda mais a reforma da Previdência.
Os privilegiados
Políticos 1 – Idade mínima de 65 anos valerá apenas para novos eleitos. Os próprios políticos terão de propor e aprovar uma regra de transição para os que têm mandato, mas não há prazo definido para isso. Sem a transição, eles mantêm as regras atuais.
Políticos 2 – Relator quer permitir que os políticos façam adesão à previdência complementar, que viabiliza aposentadoria acima do teto do INSS. O acesso ao Funpresp hoje é vedado aos que exercem cargo de confiança. União paga contribuição igual à do beneficiário.
Servidores estaduais e municipais – Foram excluídos da reforma após pressão de parlamentares, embora os Estados enfrentem situação fiscal bastante delicada.
Policiais (não militares) e professores – Terão direito à idade mínima menor, de 60 anos, embora o governo tenha enviado o texto original proibindo caracterização por categorias na hora de formular regras especiais.
Militares – Forças Armadas, policiais militares e bombeiros ficaram de fora da proposta. Governo ainda estuda as mudanças. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.