PL das Fake News: oposição articula votação de substitutivo
A oposição no Congresso, diante da resistência ao PL das Fake News, quer derrubar atual relatório e votar substitutivo de Mendonça Filho
atualizado
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Enquanto a Câmara dos Deputados se prepara para analisar, nesta terça-feira (2/5), o projeto de lei das Fake News, cujo relatório de Orlando Silva (PCdoB-SP) foi apresentado na semana passada ao presidente Arthur Lira (PP-AL), a oposição mexe suas peças para apresentar uma alternativa ao texto. Parlamentares contrários a pontos da atual proposta se articulam em torno de um substitutivo.
O regime de urgência foi aprovado na última terça-feira (25/4), com margem mínima, diante de intrigas envolvendo quebra de acordo com lideranças partidárias. A medida só passou graças à “tratorada” de Lira. Isso permite a análise do PL 2630/2020 sem necessidade de discussão em Comissão Especial.
Ao Metrópoles, parlamentares que endossaram a urgência já disseram ser contrários ao mérito do texto. Diante disso, a oposição trabalha com um cenário no qual o relatório de Orlando Silva não prosperará até a votação final. Sabe-se que até a tarde desta terça, quando está prevista a votação do mérito do projeto, Orlando seguirá conversando com os colegas. Na manhã do dia de votação, o relator ainda deve se encontrar com lideranças.
“Para a oposição, ficou muito aberto. E o Executivo poderia regulamentar a lei fazendo, via decreto, uma agência reguladora. Além do mais, como o Senado foi a Casa iniciadora desse projeto, ele pode voltar para o Senado e eles voltarem então com a agência reguladora. É um entendimento da oposição”, reclama a deputada Julia Zanatta (PL-SC).
Orlando apresentou seu relatório após intensa discussão entre representantes do Congresso Nacional e das plataformas e provedoras de internet. Isso acontece porque a medida visa estabelecer regras e punições sobre desinformação e conteúdo criminoso em meios digitais, além de prever a adoção de medidas de transparência.
O maior ponto de inflexão sobre o PL das Fake News é a criação de uma agência reguladora para monitorar, fiscalizar e punir empresas que gerenciam redes sociais, plataformas e aplicativos de mensagens instantâneas. Diante do desacordo entre as lideranças da Câmara, Silva retirou esse dispositivo do seu relatório final, apresentado na última quinta-feira (27/4), mas deixou a previsão de um Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet.
Disputa
Sob reserva, uma das nomes de oposição chegou a elogiar o trabalho do deputado, no sentido de procurar tanto parlamentares quanto as plataformas para arredondar a proposta. “Mas o projeto já está estigmatizado, mesmo que a gente queira, não podemos votar a favor. Seríamos detonados pelo eleitor nas redes. Mesmo com as mudanças, se for colocado em plenário, será derrotado”, diz.
Nas redes sociais bolsonaristas, o texto é chamado de “PL da Censura”. Nesse sentido, a oposição trabalha a votação do texto a partir de um substitutivo assinado por Mendonça Filho (União-PE). O texto do ex-ministro da Educação do governo Temer (MDB) é um novo Projeto de Lei, apensado ao PL 2630/2020.
“O texto está sendo bem recebido, pois prevê o combate ao crime contra crianças, crime eleitoral, contra o estado democrático de direito etc, mas preserva a liberdade de expressão. Não há autoridade reguladora, que é algo estranho. Isso demonstra um projeto de controle, intervencionista”, comenta Mendonça Filho, ao Metrópoles.
Para que o projeto apensado por Mendonça seja votado, porém, a oposição precisará que o presidente da Câmara dos Deputados paute o texto em caráter substitutivo, em detrimento do projeto relatado por Orlando. A base governista, nesse sentido, segue se valendo do acordo feito com Arthur Lira a aposta que ele seguirá valendo.
Base
“Acho muito difícil o Lira recuar, o texto passou por intenso debate, sofreu modificações. (…) Ele bancou uma votação apertada para garantir a urgência. Nós, que participamos do debate, tentamos unificar em torno desse texto. Uma alternativa à discordância pode ser a votação de um texto base global, com votação posterior de destaques”, disse Lídice da Mata (PSB-BA), ao Metrópoles. Ela foi relatora da CPMI das Fake News e é uma das parlamentares governistas que acompanham a proposta.
A oposição, porém, argumenta que diante do impasse, é melhor aprovar o texto de Mendonça para uma regulação inicial, uma vez que o substitutivo mantém algumas das iniciativas adotadas por Orlando Silva. O principal ponto em comum versa sobre a remuneração do conteúdo jornalístico e as regras para publicidade, no sentido de pagamento de imposto também sobre o valor pago às plataformas.
Enquanto isso, representantes do Facebook procuraram, um a um, parlamentares que votaram a favor do regime de urgência, para argumentar contra o PL das Fake News. As chamadas big techs são contra o projeto e, além da Meta, gigantes como TikTok e o Google já se posicionaram criticamente ao texto.
Comparativo
O relatório de Orlando Silva (confira na íntegra):
- Estabelece o princípio da transparência nas regras para veiculação de anúncios e conteúdos pagos;
- Veda o funcionamento de contas inautênticas e de contas automatizadas não identificadas como tal;
- Prevê a possibilidade da exigência de confirmação de identificação de usuários e responsáveis pelas contas;
- Prevê adoção de procedimentos de moderação, assegurando aos usuários o direito de reparação por dano individualizado ou difuso aos direitos fundamentais e o direito de recorrer da indisponibilização de conteúdos e contas;
- Prevê limitação, do número de encaminhamentos de uma mesma mensagem a usuários ou grupos de serviços de mensageria privada;
- Determina necessidade de consentimento prévio do usuário para inclusão em grupos de mensagens;
- Determina aos provedores de redes sociais a produção de relatórios trimestrais de transparência e de identificação de todos os conteúdos impulsionados e publicitários;
- Estabelece regras de transparência sobre dados de contratação de serviços de publicidade e propaganda ou de impulsionamento de conteúdo por meio da internet pelo Poder Público;
- Cria o Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, que terá como atribuição a realização de estudos, pareceres e recomendações sobre liberdade, responsabilidade e transparência na internet. Esse conselho deve:
1. Elaborar o código de conduta para redes sociais e serviços de mensageria privada, a ser avaliado e aprovado pelo Congresso Nacional;
2. Avaliar a adequação das políticas de uso adotadas pelos provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada;
3. Avaliar os procedimentos de moderação adotados pelos provedores de redes sociais, bem como sugerir diretrizes para sua implementação - Cria regras de autorregulação regulada, prevendo que provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada poderão criar uma instituição de autorregulação voltada à transparência e à responsabilidade no uso da internet;
- Aponta as sanções a serem aplicadas pelo Poder Judiciário nos casos de descumprimento da lei, prevendo penalidades de advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas e de multa de até 10% do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício;
- Obriga a nomeação de representantes legais no Brasil para provedores de redes sociais e serviços de mensageria privada;
- Cria novos requisitos para formação do cadastro de telefones pré-pagos;
- Cria novas hipóteses de improbidade administrativa contra os princípios da administração pública;
- Prevê a remuneração de conteúdo autoral ou jornalístico caso sejam utilizados nos provedores de internet, incluindo os ofertantes de conteúdo sob demanda e produzidos em quaisquer formatos que incluam texto, vídeo, áudio ou imagem;
- Garante a extensão da imunidade parlamentar material às plataformas mantidas pelos provedores de aplicação de redes sociais;
- Determina a atuação dos provedores diligentemente para prevenir e mitigar práticas ilícitas no âmbito de seus serviços, empregando esforços para aprimorar o combate à disseminação de conteúdos ilegais gerados por terceiros, que possam configurar:
1. Crimes contra o Estado Democrático de Direito, tipificados no Decreto-Lei;
2. Atos de terrorismo e preparatórios de terrorismo;
3. Crime de induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação;
4. Crimes contra crianças e adolescentes ou de incitação à prática de crimes contra crianças e adolescentes ou apologia de fato criminoso ou autor de crimes contra crianças e adolescentes;
5. Crime de racismo;
6. Violência contra a mulher;
7. Infração sanitária, por deixar de executar, dificultar ou opor-se à execução de medidas sanitárias quando sob situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional. - Necessidade de a plataforma informar ao autor do conteúdo removido os critérios usados para a decisão e promoção de meios para recorrer;
- Determina necessidade de documento válido em território nacional para anunciantes ou quem impulsionar conteúdo;
- Contas de interesse público, como de políticos, não poderão bloquear usuários;
O texto de Mendonça Filho (veja na íntegra):
- Determina que caberá ao Ministério Público notificar as plataformas quanto aos crimes de:
– Automutilação e suicídio;
– Atos de exploração sexual, abuso ou nudez infantil;
– Atos violentos ou fraudulentos que ataquem diretamente o estado democrático de direito e eleições;
– Organizações terroristas e crime organizado;
– Estelionato e fraudes que possam causar danos a economia popular;
– Coordenação ou promoção da propagação ativa e deliberada de doenças transmissíveis. - Prevê responsabilidade subsidiária das plataformas em caso de omissão após a notificação do Ministério Público;
- Retira o dever de cuidado das plataformas diante de conteúdos sensíveis, o que, segundo o parlamentar, colocará às plataformas um dever de constante “vigilantismo e até mesmo de censura”.
- Dever das plataformas para atuar frente a práticas notificadas pelo Ministério Público, e somente diante dos seguintes conteúdos sensíveis:
1. Atos violentos que interfiram diretamente no processo eleitoral, nas instituições democráticas ou no Estado Democrático de Direito;
2. Organizações terroristas e crime organizado;
3. Estelionato e fraudes que possam causar danos à economia popular;
4. Propagação ativa e deliberada de doenças transmissíveis.
5. Para proteção de crianças e adolescentes, o dever de atuação das plataformas pode ser instaurado a partir da notificação de qualquer usuário quanto a conteúdos que busquem induzir suicídio ou automutilação, bem como crimes contra menores ou apologia. - Prevê autorregulação;
- Resguarda dos segredos comercial e industrial, inovação e desenvolvimento tecnológico, prevendo obrigações contundentes para garantir respostas à sociedade quanto aos serviços prestados pelas plataformas.
- Prevê transparência dos termos de uso, das medidas de moderação e dos critérios utilizados para envio de publicidade aos usuários;
- Requer direito de ampla defesa e direito de revisão nos procedimentos de moderação de conteúdo das plataformas;
- Obriga a nomeação de representantes no Brasil e de cooperação com as autoridades brasileiras, a fim de tornar ainda mais efetivo o respeito à legislação do país, ainda que a plataforma esteja sediada no exterior;
- Obriga as plataformas a informar os usuários quando estiverem em contato com contas automatizadas (robôs) e de combaterem contas automatizadas não identificadas;
- Restringe o funcionamento de contas automatizadas não identificadas publicamente como tal;
- Prevê aplicação de multa caso as plataformas não retirem conteúdo ilícito que tenha causado dano;
- Determina a produção de relatórios anuais de transparência, mas ressalva a “proteção aos segredos comerciais e industriais”;
- Determina disponibilização do histórico de conteúdo pago ou impulsionado com a qual a conta teve acesso;
- Determina remuneração às empresas jornalísticas dos conteúdos utilizados pelas plataformas digitais, produzidos em quaisquer formatos, que inclua texto, vídeo, áudio ou imagem.