O que é a graça constitucional concedida por Bolsonaro a Silveira
Presidente formalizou o perdão nessa quinta-feira (21/4), menos de 24 horas após o STF condenar o deputado a 8 anos e 9 meses de prisão
atualizado
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Menos de 24 horas após o Supremo Tribunal Federal (STF) condenar o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) a 8 anos e 9 meses de prisão, o presidente Jair Bolsonaro (PL) concedeu graça constitucional ao deputado aliado e abriu uma nova crise entre os Poderes.
O ato foi anunciado em uma transmissão ao vivo pelo próprio mandatário e formalizado via decreto publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) de quinta-feira (24/4).
A graça é um instrumento que permite ao chefe de Estado perdoar penas impostas a um condenado. Ela inclui as penas privativas de liberdade, a multa e as penas restritivas de direitos. A graça é um perdão individual, enquanto o indulto (mais comum) é coletivo e não costuma ser usado para benefício de uma pessoa.
Para embasar a decisão, Bolsonaro usou o texto constitucional, que prevê o indulto, e o Código de Processo Penal, que estabelece as condições para concessão da graça.
Diz o artigo 734 do Código de Processo Penal:
“A graça poderá ser provocada por petição do condenado, de qualquer pessoa do povo, do Conselho Penitenciário, ou do Ministério Público, ressalvada, entretanto, ao Presidente da República, a faculdade de concedê-la espontaneamente”.
O chefe do Executivo classificou a graça concedida ao deputado como de “extrema importância para a nossa democracia e a nossa liberdade”.
No decreto, Bolsonaro ressaltou que tem a prerrogativa presidencial para conceder o indulto individual e classificou a medida como “fundamental à manutenção do Estado Democrático de Direito”.
Ele também colocou que a concessão de indulto individual é “medida constitucional discricionária excepcional destinada à manutenção do mecanismo tradicional de freios e contrapesos na tripartição de poderes”.
Ainda, o presidente afirmou que a sociedade encontra-se em “legítima comoção” em face da condenação do parlamentar e justificou que ele está “resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição, que somente fez uso de sua liberdade de expressão”.
Indulto
O indulto costuma ser concedido de forma coletiva por presidentes da República ao fim do ano — os chamados “indultos de Natal”.
Normalmente, o benefício é destinado aos detentos que cumprem requisitos como ter bom comportamento, estar preso há determinado tempo, ser paraplégico, tetraplégico, portador de cegueira completa, ser mãe de filhos menores de 18 anos. Deve manter ainda o bom comportamento no cumprimento da pena, e não responder a processo por outro crime praticado com violência ou grave ameaça contra a pessoa.
Aos condenados que não preencham os requisitos para serem beneficiados com o indulto, poderão ter a pena reduzida, desde que tenham cumprido 1/4 da pena se não reincidentes e 1/3 se reincidentes.
De acordo com a Constituição, o perdão de pena não se aplica a:
- condenados por crimes de racismo, de tortura, de terrorismo e de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins;
- condenados por crimes hediondos;
- condenados pelos crimes definidos no Código Penal Militar; e
- condenado por decisão transitada em julgado que, embora solvente, tenha deixado de reparar o dano causado pelo crime.
Em dezembro de 2021, Bolsonaro autorizou o perdão da pena de agentes de segurança pública. Foram abarcados os policiais que se enquadravam nas seguintes hipóteses: 1) condenados por crimes culposos, ou seja, quando não há intenção de matar, desde que tenham cumprido ao menos um sexto da pena; e 2) condenados por crime, em caso de excesso culposo.
Já para os militares das Forças Armadas, o indulto foi concedido àqueles que, em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), tivessem cometido crimes não intencionais. O benefício ainda incluía agentes que praticaram crime fora de serviço.
Acusação e condenação no STF
Daniel Silveira é aliado de Jair Bolsonaro e dos filhos do presidente. O deputado é acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de coação no curso do processo, incitação à animosidade entre as Forças Armadas e o Supremo Tribunal Federal, e tentativa de impedir o livre exercício dos poderes da União. A PGR defendeu a condenação do deputado.
Durante o julgamento, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, citou diversos crimes cometidos por Silveira e disse que as falas e ameaças contra instituições foram “vexatórias”, “inaceitáveis” e de “afronta à democracia”.
“Não se pode permitir que a força ou violência contra membros de instituições essenciais possam ser legitimamente concedidas no espaço público. Inviolabilidade do parlamentar não alcança, a despeito dos termos abrangentes, o apelo à violência, declarações carregadas de grave ameaça”, afirmou Lindôra.
Na quarta-feira (20/4) Silveira foi condenado à prisão por 10 votos a um por estimular atos antidemocráticos e proferir ataques a ministros do Supremo e instituições democráticas. O único a votar pela absolvição do parlamentar foi Kassio Nunes Marques, o primeiro indicado por Bolsonaro à Corte.
Durante o julgamento, o relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes, também estabeleceu a perda do mandato e dos direitos políticos de Silveira e uma multa de R$ 200 mil.
O primeiro efeito da condenação é a inelegibilidade. Ela será reconhecida judicialmente se e quando Daniel Silveira pedir registro de uma candidatura. Quanto à perda do mandato, o Supremo, depois do trânsito em julgado da ação, vai comunicar a decisão para a Câmara dos Deputados, onde deve ser procedido o trâmite interno.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), defende que a perda de mandato seja discuta pelos parlamentares. A prisão também não ocorre de imediato, porque ainda cabe recurso.