Nos EUA, Bolsonaro diz que um terço do Bolsa Família “é fraude”. Será?
Agência Lupa conferiu a veracidade das declarações do deputado federal e presidenciável Jair Bolsonaro durante turnê pelos Estados Unidos
atualizado
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O deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), pré-candidato à Presidência em 2018, fez uma turnê pelos Estados Unidos nas últimas semanas. Além de se encontrar com investidores e analistas, deu entrevistas, fez pronunciamentos através de suas redes sociais e participou de palestras. Dando continuidade à cobertura da pré-campanha, a Lupa checou algumas de suas frases:
World Trade Center
“Se você pegar os anais da Câmara dos Deputados, não encontra um só pronunciamento dos deputados do PT e do PCdoB condenando os ataques aqui (ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001).”
Deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), em transmissão feita ao vivo pelo Facebook no dia 13 de outubro
FALSO
Pelo menos quatro deputados do PT fizeram discursos em que condenaram os ataques às Torres Gêmeas, em Nova York. Na semana do 11 de setembro de 2001, a Câmara dos Deputados teve cinco sessões.
Na manhã da terça-feira (11/9), foi o deputado Valdeci Paiva (PSL-RJ) que levou a informação sobre os atentados à Câmara. Ele chegou a interromper a sessão solene daquele dia para falar do assunto. De tarde, ainda no calor dos eventos, o então deputado Aécio Neves (PSDB-MG) e Efraim Moraes (PFL-PB) mencionaram o tema.
No dia seguinte, 12 de setembro, o deputado Osmar Terra (PMDB-RS) lembrou a tragédia. Classificou-a como “horror”.
Em 13 de setembro, Jair Bolsonaro, então deputado federal pelo PPB-RJ, ocupou a tribuna da Casa para criticar a conduta do governo Fernando Henrique Cardoso ao se solidarizar com o então presidente dos EUA, George W.Bush. Em sua opinião, FHC tinha tentado “tirar proveito politiqueiro de um grave episódio ocorrido nos Estados Unidos”.
Logo depois de Bolsonaro, foi a vez de o deputado Dr. Rosinha (PT-PR) fazer um pronunciamento e condenar de forma clara o ataque às Torres Gêmeas: “Assim como o nosso partido, lamentamos as vítimas inocentes desse atentado. Inocentes, acreditamos, não devem pagar por erros ou políticas internacionais imperialistas de governantes”.O deputado Nelson Pellegrino (PT-BA) também foi à tribuna naquele dia 13 e condenou o ataque: “O terrorismo há de ser repudiado, e a solidariedade reafirmada. Solidariedade não só às vítimas, mas à própria nação atingida”, afirmou. Uma busca no acervo da Câmara ainda mostra uma série de falas sobre o mesmo assunto durante a sessão solene daquela data.
Na sexta-feira, 14 de setembro de 2001, Paulo Paim (PT-RS) tomou os microfones da Casa para afirmar sua posição: “a nação norte-americana foi agredida de forma covarde por terroristas, cujos atos devem ser repudiados por qualquer homem de bem”.
Por fim, na mesma sexta-feira, Pedro Celso (PT-DF) leu nota de seu partido em solidariedade às vítimas e foi enfático: “Os trágicos acontecimentos de terça-feira, nos Estados Unidos, constituem-se em crime hediondo que merece o repúdio de toda a humanidade.”
Procurado para comentar essa checagem, Bolsonaro não respondeu.
Ajuda à Palestina
“O governo do PT, em 2010, doou R$ 25 milhões para construção de um hospital na Palestina.”
Jair Bolsonaro, em transmissão feita ao vivo pelo Facebook no dia 13 de outubro.
VERDADEIRO, MAS
Em 20 de julho de 2010, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei nº 12.292, autorizando uma doação de R$ 25 milhões para “reconstrução de Gaza”. Mas o texto não cita hospitais ou unidades médicas. Consiste no repasse de “recursos à Autoridade Nacional Palestina, em apoio à economia palestina”.
Ainda vale ressaltar que a sanção presidencial só aconteceu depois de o projeto ser aprovado pelo plenário da Câmara dos Deputados e do Senado.
O Executivo enviou o projeto à Câmara em fevereiro de 2009 e, lá, a matéria tramitou até dezembro daquele ano, quando foi aceita e submetida ao Senado. Em junho de 2010, após passar pelas comissões de Relações Exteriores e Assuntos Econômicos da Casa, entrou na pauta e foi autorizada pelos senadores sem votação nominal.
Procurada para comentar esta checagem, a assessoria de Bolsonaro enviou a imagem de uma reportagem com o título “Lula doou, através de decreto, R$ 25 milhões para a Palestina, em região comandada por terroristas.”
Bolsa Família
“Bolsa Família, ninguém quer acabar, mas um terço (do programa) é fraude.”
Jair Bolsonaro, em transmissão feita ao vivo pelo Facebook no dia 13 de outubro.
EXAGERADO
Em novembro do ano passado, o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário suspendeu 1,1 milhão de bolsas por fraude. Na época, isso equivalia a 8% dos 13,9 milhões de beneficiários. O pente-fino foi fruto de um levantamento feito pelo Ministério Público Federal e divulgado seis meses antes.
O estudo analisou cuidadosamente as “suspeitas de irregularidade” no Bolsa Família entre 2013 e maio de 2016 e concluiu que, dos 21,5 milhões de beneficiários do programa no período, 4,23% podiam ser considerados “perfis suspeitos”, o equivalente a 909,7 mil pessoas.
Se analisados os recursos aplicados, a afirmação de Bolsonaro também não se sustenta. Entre 2013 e maio de 2016, o programa custou R$ 86,1 bilhões, e o total suspeito de fraude nesse período foi de 3,84% – ou R$ 3,31 bilhões. Os dois índices ficam, portanto, bem distantes do “um terço” citado pelo deputado.
Confira dados do programa:
Procurada, a assessoria de imprensa de Bolsonaro enviou à reportagem imagem que remete a um estudo publicado pelo governo federal em 20 de maio de 2014. Segundo o levantamento, 75,4% dos beneficiários do programa trabalhavam – supondo que outros 24,6% não o faziam. “Segundo o Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 75,4% dos beneficiários do Bolsa Família trabalham. Desde o lançamento do programa, em 2003, 1,7 milhão de brasileiros deixaram de receber o benefício por não precisar mais da ajuda do governo”, diz trecho do estudo.
Petrobras
“Eu posso considerar a privatização da Petrobras, mas seria uma das últimas empresas (a ser privatizada).”
Deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), em entrevista concedida à Bloomberg no dia 13 de outubro.
CONTRADITÓRIO
Em entrevista concedida ao programa do Jô Soares, na TV Globo, em 2005, o deputado Jair Bolsonaro era radicalmente contra as privatizações: “barbaridade é privatizar, por exemplo, a Vale do Rio Doce, privatizar as telecomunicações e entregar as reservas petrolíferas para o capital externo”.
O deputado foi procurado para comentar essa checagem, mas não retornou.