Na volta do recesso, Câmara aprova projeto de regularização fundiária
O projeto é repudiado por comunidades indígenas que chegaram a se manifestar, em julho, contra aprovação
atualizado
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Por 296 votos a favor, 136 contrários e uma abstenção, a Câmara dos Deputados aprovou, no primeiro dia de trabalho após o recesso parlamentar de duas semanas, a votação do texto-base do Projeto de Lei 2633/20, do deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), que trata da regularização fundiária. Entre outros pontos, a proposta abre caminho para a mineração comercial e agricultura em terras indígenas.
A matéria, prioridade da bancada ruralista, é polêmica e já provocou reação de povos indígenas, que chegaram a entrar em conflito com a polícia no mês de julho, quando a proposta estava sendo discutida.
O projeto aumenta o tamanho de terras da União passíveis de regularização sem vistoria prévia, bastando a análise de documentos e de declaração do ocupante de que segue a legislação ambiental.
Além disso, passa de 4 para 6 módulos fiscais o tamanho da propriedade ocupada que poderá ser regularizada com dispensa de vistoria pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Promessa de campanha
O governo federal e a bancada ruralista no Congresso têm pressa em aprovar a matéria, parte da promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de entregar 600 mil títulos de terras até 2022.
Por ter sido aprovado como urgência, o texto não passou pelas comissões de mérito. A oposição tentou obstruir os trabalhos, mas acabou vencida.
A deputada Joênia Wapichana (Rede-AP), de origem indígena, apontou a necessidade de maior discussão sobre o assunto. “Há conflito de interesse e por esse motivo era necessário o adiamento da discussão”, disse.
“A regularização fundiária é importante. O tema é importante, mas não com um texto que traz mais insegurança jurídica e fragiliza a situação ambiental e a demarcação das terras indígenas no Brasil”, ressaltou.
Desmatamento
Um dos problemas levantados por deputados contrários à proposta foi a questão do desmatamento. Para o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) o texto apresentado funcionará como um grande incentivo.
“As pessoas desmatam e depois procuram as autoridades para fazer a regularização fundiária. Então, as pessoas só vão regularizar as áreas que elas já desmataram”, afirmou.
A líder do Psol, deputada Talíria Petrone (Psol-RJ), também alertou para o problema.
“Estamos votando, neste momento, infelizmente, um PL que tem como principal objetivo a titulação de grandes posses irregulares, a facilitação do perdão de dívidas e o pagamento de dívidas para infratores ambientais”, lamentou.
Já o relator da proposta, Bosco Saraiva, disse que o objetivo central do projeto é atualizar a legislação diante de avanços no monitoramento de terras. “Trazemos uma proposta sólida e justa, que concilia diferentes interesses e que foi construída sob o prisma das diferentes facetas de um desenvolvimento sustentável”, defendeu.
“A proposição traz uma série de situações nas quais será obrigatória a vistoria, ainda que se trate de pequenos agricultores”, disse.
Relatório
Segundo o substitutivo preliminar do relator, deputado Bosco Saraiva (Solidariedade-AM), a regularização de imóveis poderá beneficiar, inclusive, posseiros multados por infração ao meio ambiente se for atendida qualquer uma destas condições: imóvel registrado no Cadastro Ambiental Rural (CAR); adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA); ou o interessado assinar termo de compromisso ou de ajustamento de conduta para recuperar vegetação extraída de reserva legal ou de Área de Preservação Permanente (APP).
As novas regras da Lei 11.952/09 valerão para imóveis da União e do Incra em todo o país, em vez de apenas os localizados na Amazônia Legal. A data de referência da ocupação, no entanto, continua a ser 22 de julho de 2008, atualmente prevista na lei. O ano de 2008 coincide com a anistia ambiental concedida pelo Código Florestal de 2012.