Na pandemia, ciência e pesquisa são negligenciadas na agenda de Bolsonaro
Desde março, presidente prioriza pauta econômica para reduzir impactos da Covid-19 no Brasil. País tem mais de 35 mil óbitos e 645 mil casos
atualizado
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Desde o início da pandemia do coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se reuniu apenas 11 vezes com o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes. É o que mostra levantamento feito pelo Metrópoles com base nos compromissos oficiais de Bolsonaro entre março e junho deste ano. O país tem mais de 35 mil óbitos em decorrência do novo vírus e 645 mil casos.
A pasta chefiada pelo ministro astronauta tem poder de investimento em pesquisas e testes com medicamentos que poderiam auxiliar na corrida para entender o vírus e para produzir uma vacina, por exemplo.
É possível observar, igualmente, o baixo número de visitas dos ministros da Saúde e da Ciência ao Palácio do Planalto ao comparar a quantidade de encontros que o presidente teve com o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Bolsonaro recebeu o titular da área econômica 42 vezes no período, enquanto os médicos Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, ex-ministros da Saúde, e o atual interino da pasta, general Eduardo Pazuello, somam, os quatro, 17 agendas com Bolsonaro.
O Metrópoles entrou em contato com o Planalto, com o Ministério da Saúde e o MCTIC. As pastas, porém, não se posicionaram até a publicação desta reportagem. O espaço está aberto para manifestações.
Mandetta e Teich deixaram o governo por divergirem de Bolsonaro sobre o isolamento social e o uso da cloroquina no combate ao coronavírus. De março a maio, eles se reuniram nove e sete vezes com o presidente, respectivamente.
Segundo interlocutores, por conta do conflito entre o presidente e Mandetta, Bolsonaro optou por diminuir os encontros com o ex-ministro da Saúde e deixar o comando da crise com o ministro da Casa Civil, general Braga Netto.
Após a demissão de Mandetta, rumores de que o ministro Marco Pontes seria o próximo a deixar o governo surgiram. Recentemente, o astronauta foi às redes sociais comentar o assunto e disse que ele e Bolsonaro continuam “completamente alinhados e firmes pelo Brasil”.
Bolsonaro defende “volta à normalidade”
O levantamento feito pela reportagem vai de encontro ao discurso de Bolsonaro que, desde o início da pandemia, pede “a volta à normalidade”, sempre citando a reabertura do comércio nos estados do país para não prejudicar ainda mais a economia brasileira.
Além disso, desde o início da crise, o presidente dá seguidas declarações nas quais diminui ou subestima o perigo que a pandemia do novo coronavírus representa. No fim de abril, por exemplo, ao ser questionado sobre o fato de o Brasil ter superado a China no número de mortos por Covid-19, Bolsonaro respondeu: “E daí? Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”, disse, em referência ao seu segundo nome.
No início de março, o presidente sustentou que o isolamento e o distanciamento social, defendidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo próprio Ministério da Saúde, não estão funcionando para achatar a curva de mortos e infectados, mas “servindo só para matar o comércio”.
Militares no topo
Ainda segundo o levantamento, com exceção de Guedes, Bolsonaro tem se reunido com mais frequência com a ala militar do Planalto durante a pandemia. Fontes ouvidas pelo Metrópoles foram unânimes ao dizer que os militares têm “grande influência” na condução da crise do coronavírus no país. Atualmente, segundo a OMS, o Brasil caminha para ser o epicentro da pandemia em todo o mundo.
No total, foram 402 encontros dos militares no gabinete presidencial entre março e a primeira semana de junho. No topo, aparece o ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, com 146 visitas ao presidente. Em seguida aparecem os ministros da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira (102), da Casa Civil, general Braga Netto (86), e do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno (68).
Veja a relação completa dos encontros do presidente com os ministros do governo: