Líder do governo: Bolsonaro procurou Pazuello para apurar Covaxin
Senadores de oposição ao governo federal na CPI afirmam que presidente cometeu crime de prevaricação ao não pedir investigação de denúncias
atualizado
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O líder do governo no Senado Federal, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), afirmou, nesta sexta-feira (25/6), que o governo federal solicitou, após o encontro entre o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), uma investigação prévia sobre potenciais irregularidades nas tratativas para aquisição de doses da Covaxin.
O senador defendeu que a “averiguação prévia” permitiu que, na ocasião, se atestasse que o “contrato estava juridicamente hígido”. Ele chamou de “inverídicas” as denúncias trazidas pelo deputado e seu irmão, Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde.
Veja como foi:
“Informo que, em face do relato do depoente, o presidente da República levou o fato ao conhecimento do ministro Pazuello e o ministro no regular exercício solicitou ao secretário-executivo [Élcio Franco] que realizasse uma averiguação previa acerca das supostas irregularidades. Verificou-se na ocasião que o contrato estava juridicamente hígido”, disse durante sua participação na sessão desta sexta.
A informação de que Bolsonaro teria agido para investigar os indícios de irregularidades nas tratativas surge dois dias após o pronunciamento do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, atacando os depoentes, em especial o parlamentar.
Miranda disse ter encontrado Bolsonaro em 20 de março para situá-lo das situações duvidosas em torno das negociações para compra do imunizante indiano.
Na ocasião, segundo o deputado, o presidente teria prometido encaminhar a denúncia à Polícia Federal. A corporação, no entanto, nega abertura de qualquer inquérito para apuração do caso.
Prevaricação
Diante da informação de que não havia investigação em curso, senadores de oposição que integram a CPI da Covid defendem que houve prevaricação de Bolsonaro.
O presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), lembrou que a exoneração de Pazuello ocorreu três dias após o encontro de Miranda e Bolsonaro. Segundo o senador, não teria sido possível, portanto, que o general realizasse qualquer investigação sobre as denúncias trazidas pelo deputado.
“É impossível cronologicamente isso ter acontecido. (…) O presidente prevaricou. Não é verdade que [Pazuello] teve condições de investigar”, disse Aziz.
“Deus tá vendo”
A determinação de Bolsonaro para que se apurassem os indícios não foi trazida nem mesmo durante a coletiva do ministro Onyx. O pronunciamento contou, inclusive, com a participação de Élcio Franco.
A dupla buscou, na entrevista, desmentir que as tratativas entre a empresa e o Ministério da Saúde apresentassem irregularidades. O ministro chegou a indicar que pediria uma investigação sobre a fala de Miranda à Polícia Federal, o que foi classificado pela maioria da CPI da Covid como tentativa de intimidá-lo antes de depoimento.
“Deputado Luís Miranda, Deus tá vendo. Mas o senhor não vai se entender só com Deus não, vai se entender com a gente também. E tem mais: o senhor vai explicar e o senhor vai pagar pela sua irresponsabilidade, pelo mau-caratismo, pela má-fé, pela denunciação caluniosa e pela produção de provas falsas”, disse na coletiva.
“No momento que o senhor trai o presidente Bolsonaro, no momento que o senhor trai o Brasil, no momento que o senhor mente deslavadamente, o senhor se junta a todo mal que existe na política brasileira. Que deus tenha pena do senhor – é o único sentimento que eu tenho, mas o senhor vai pagar na Justiça tudo o que o senhor fez hoje de manhã”, prosseguiu.
Nomes revelados
O servidor Luis Ricardo Miranda, do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, revelou à CPI da Covid nomes dos superiores que teriam, segundo ele, o pressionado para dar celeridade nas tratativas pela compra de imunizantes Covaxin.
O servidor também apontou supostos indícios de pagamento de propina a gestores da Saúde na compra de imunizantes. “O ministério estava sem vacina. E um colega, Rodrigo, servidor, disse que um rapaz vendia vacina. E esse rapaz disse que alguns gestores estavam recebendo propina. Ele não disse nomes”, relatou.
Entre os nomes o teriam pressionado, o funcionário publicou citou o coronel Marcelo Pires. O militar chefiava desde janeiro a Diretoria de Programas do ministério, mas foi exonerado em meados de abril após a chegada do atual ministro Marcelo Queiroga. Ele também disse ter sofrido pressões do coordenador Alex Lial Marinho e do diretor Roberto Ferreira Dias.
Segundo Miranda, a cúpula do setor o procurava, constantemente, para saber detalhes do andamento das negociações. “Me procuravam para saber detalhes: se acionou a empresa, se conseguiu a documentação, se já foi protocolado na Anvisa, sempre o andamento, mas com bastante constância”, disse.
Desconfortável
O servidor relata ter se sentido desconfortável com a conduta dos superiores. “Com essa pressão e as formas como recebemos os documentos, toda equipe do setor não se sentiu confortável com essa pressão, como estavam me pressionando, eu conversei e acionei o meu irmão [deputado federal Luis Miranda (DEM-DF)], que procurou o presidente”.
O deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e o irmão, Luis Ricardo Fernandes Miranda, servidor do Ministério da Saúde, prestam depoimento, nesta sexta-feira (25/6), à CPI da Covid, acerca das negociações da vacina Covaxin, produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech.
Luis Ricardo foi convidado após a CPI ter tido acesso ao depoimento dele ao Ministério Público Federal (MPF), em investigações sobre supostas irregularidades no processo de aquisição do imunizante indiano. O servidor disse ter sofrido pressão atípica de superiores; ele também revelou que membros do governo federal articularam, junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em favor da vacina.
O parlamentar, por sua vez, colocou-se à disposição da comissão para participar ao lado do irmão, alegando ter mais informações sobre o caso.
Depois de ser suspensa por mais de uma hora, a sessão começou, de fato, às 15h22. Após as apresentações dos depoentes, o deputado tomou a palavra e afirmou que os dois foram expostos pelo vazamento de uma gravação registrada pelo Ministério Público Federal. O parlamentar confirmou o encontro com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para falar da pressão sofrida pelo irmão.
“Não procuramos essa CPI, fomos procurados. Procurei meus colegas parlamentares desta CPI para explicar que o caminho poderia ser muito ruim para meu irmão. A maioria dos problemas ocorreu na semana que antecedeu o encontro com o presidente da República, em 20 de março.”
Luis Miranda disse que, ao procurar Bolsonaro, fez “o que qualquer cidadão brasileiro deveria fazer”. “Não sou policial, não sou promotor de Justiça, não sou investigador. Levei para a pessoa certa, na minha opinião. Presidente olhou nos meus olhos e disse: ‘Isso é grave. Vou acionar o DG (diretor-geral) da Polícia Federal'”, contou.
Para o parlamentar, a decisão tomada por ele e o irmão foi o suficiente para o Brasil não dispender dinheiro público com um imunizante ainda não utilizado. “Se não fôssemos nós, 45 milhões de dólares seriam pagos por uma vacina que até agora não se resolveu e não sabemos se vai se resolver”, apontou.
Houve um bate-boca entre depoentes, senadores de oposição e governistas. O deputado Luis Miranda, então, ameaçou deixar a sessão. “Se for o caso, levantamos e vamos embora. Não acuse que nós estamos mentindo”, disse.
Início com suspensão
Pouco depois de iniciada a sessão, o presidente da CPI, Omar Aziz, suspendeu a reunião por 15 minutos. “Fui informado que o servidor está no aeroporto, dirigindo-se para a CPI”, afirmou Aziz. O deputado Luis Miranda, no mesmo momento, chegou ao Senado, vestindo um colete a prova de balas e segurando uma Bíblia.
Por causa do atraso na chegada de Luis Ricardo, a sessão foi suspensa. Ele chegou ao Congresso às 15h20. Às 15h22, os senadores recomeçaram a reunião.
Integrantes do colegiado avaliam que Luis Ricardo é uma peça-chave nessa nova fase da comissão, que investiga corrupção na aquisição de vacinas. Diversos pontos dessa negociação, contudo, ainda precisam ser esclarecidos.
Na abertura da reunião desta sexta-feira, senadores do comando da CPI reclamaram da postura do Ministério da Saúde, de não dar acesso de técnicos do Senado e da Controladoria Geral da União (CGU) a documentos da pasta.
O relator Renan Calheiros (MDB-AL) classificou que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, realiza “obstrução delituosa”, ao dificultar que técnicos do colegiado possam verificar documentos da pasta. “Por isso, eu solicito que se tome as providências contra essas obstruções do ministro Marcelo Queiroga, que já é investigado nessa comissão”, disse.