Investigação: doleiros de Cabral tinham como clientes JBS e Odebrecht
Operação “Câmbio, desligo”, deflagrada nesta quinta (3), revela a atuação ampla de operadores da moeda americana em esquema de lavagem
atualizado
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Uma das maiores operações já montadas pela Lava Jato a incluir o Rio de Janeiro, a Operação Câmbio, desligo, deflagrada nesta quinta-feira (3/5), tendo como alvos 45 doleiros que atuavam para o ex-governador Sérgio Cabral (MDB), prendeu também dois operadores em atividade para a JBS. Conhecidos pelos apelidos “Paco” e “Raul”, eles foram capturados no Uruguai.
“Os doleiros faziam a junção entre demanda de dólar no exterior e de real no Brasil. Precisavam ter uma rede complexa de financiadores, era tal qual um sistema bancário. Essas contas têm íntima relação com todo o ciclo da corrupção no Brasil. Juca e Tony (doleiros de Cabral) forneciam serviços para empreiteiras como a Odebrecht”, explicou o procurador da República Rodrigo Timóteo.Segundo a Procuradoria da República, foi montado pelo grupo de Cabral um “banco paralelo”, que lavava dinheiro sujo no Brasil e no exterior, e também seria utilizado pela Odebrecht. Esta é a maior investida contra a lavagem de dinheiro no país desde a do Banestado, afirmou o coordenador da Lava Jato no Rio, procurador Eduardo El Hage.
A operação contou com o apoio de autoridades uruguaias e mirou em doleiros que serviram no Brasil e no exterior ao esquema de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas atribuído ao ex-governador carioca. Segundo as investigações, foi movimentado mais de US$ 1,6 bilhão. Pelo menos US$ 100 milhões seriam de Cabral.
Segundo o procurador da República Stanley Valeriano, sem o esquema não teria sido possível ao grupo do emedebista movimentar tanto dinheiro de propina. “Não seria possível movimentar cifras tão altas se não fossem os doleiros. Eles dão suporte a várias outras atividades criminosas, possibilitam outros crimes de evasão se dividas, sonegação, tráfico de drogas”, ressaltou Valeriano.
Megaoperação
Estão sendo cumpridos 45 mandados de prisão preventiva no Brasil contra operadores financeiros e seis de prisão preventiva no Paraguai e Uruguai, além de quatro mandados de prisão temporária e 51 de busca e apreensão determinados pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. As equipes estão, desde cedo, nas ruas no Rio, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Distrito Federal. A Interpol foi acionada para prisões na Alemanha (um alvo) e nos Estados Unidos (dois).
A ofensiva se baseou na delação premiada dos doleiros de Cabral Vinícius Claret, o Juca Bala, e Cláudio Barboza, o Tony, que estão presos, assim como o ex-governador. Segundo a dupla, a rede se utilizou de 3 mil off shores instaladas em 52 países.
Das 3 mil contas, boa parte não foi objetivo de repatriação do dinheiro, informou o superintendente da Receita Federal Luiz Henrique Casemiro. Conforme mostra fluxograma divulgado pela Procuradoria, Cabral está no centro do esquema, tendo seu operador Carlos Miranda a função de contatar os irmãos doleiros Renato e Marcelo Chebar (também delatores) e, estes, por sua vez, de acionar Juca e Tony.
A dupla operava com Dario Messer, o chamado “doleiro dos doleiros”. Por circular na alta sociedade carioca, em especial em eventos da comunidade judaica, e entre celebridades, Messer trazia novos clientes ao grupo.
O fluxograma mostra também que os doleiros do Rio se relacionavam com os demais operadores cujas prisões foram decretadas durante a Câmbio, desligo e que atuam em São Paulo e demais unidades da Federação.
A necessidade de utilizar essa rede se deu pelo fato de o montante de dinheiro sujo ser grande demais, revelam as investigações. Messer está sendo procurado no exterior. Ele tem cidadania brasileira e paraguaia.
Funcionamento
O sistema funcionava assim: o grupo de Cabral, segundo os delatores, entregava aos doleiros dinheiro sujo, em reais, no Brasil, e este era “transformado” em dólares limpos no exterior. No processo de branqueamento, os envolvidos ainda faziam pagamentos de boletos, além de comprar e vender cheques oriundos do comércio.
O juiz federal Marcelo Bretas justificou assim as prisões: “A gravidade da prática criminosa de pessoas com alto padrão social que tentam burlar os trâmites legais não poderá jamais ser tratada com o mesmo rigor dirigido à prática criminosa comum”.
Ele considera ainda que foi criado um sistema financeiro paralelo pela organização criminosa vinculada a Cabral.
Os atos supostamente praticados, acredita o juiz, “afetam toda a economia do país, pois há uma verdadeira rede de câmbio paralelo, movimentando soma de bilhões de dólares sem passar pelo trâmites legais”. O magistrado prossegue: “A impressão é que a apontada organização criminosa, cujas diversas ramificações estão ainda a ser escrutinadas, criaram um ‘sistema financeiro paralelo’ ao oficial, de forma a desrespeitar as normas existentes sobre a matéria e colocar em risco a credibilidade do sistema financeiro do Brasil perante instituições internacionais”.
Repise-se que muitos dos ora investigados já foram investigados ou denunciados no passado por delitos de mesma tipologia, todavia, isso não parece ter desestimulado a perpetuação da conduta
Marcelo Bretas, juiz federal
Outro lado
A defesa do ex-governador Sergio Cabral mandou nota sobre a operação desta quinta-feira. “A operação policial de hoje em nada afeta a defesa do ex-governador Sérgio Cabral, não se refere à sua pessoa e nem ao seu mandato”, destacam os advogados do político.
Em nota, a Odebrecht afirma “que está colaborando com a Justiça no Brasil e nos países em que atua. Assinou Acordo de Leniência com as autoridades do Brasil, Estados Unidos, Suíça, República Dominicana, Equador, Panamá e Guatemala. Implantou um sistema para prevenir, detectar e punir desvios ou crimes. E adotou modelo de gestão que valoriza não só a produtividade e a eficiência, mas também a ética, a integridade e a transparência”.
A assessoria de imprensa da JBS afirmou que a Operação Câmbio, desligo não traz nenhum fato novo envolvendo a empresa e que todas as denúncias relativas à JBS no âmbito da operação constam no acordo de colaboração firmado entre a holding J&F e o Ministério Público Federal.