CCJ do Senado aprova indicação de Kassio Marques para o STF
Após 10 horas de sabatina, nome do desembargador agora será votado no plenário da Casa. Ele precisa de 41 votos favoráveis de 81 senadores
atualizado
Compartilhar notícia
Após 10 horas de sabatina, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (21/10), por 22 votos a 5, a indicação do desembargador Kassio Marques para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), na vaga do ex-ministro Celso de Mello, que se aposentou no último dia 13. Agora, a indicação segue para o plenário. Lá, Marques necessita obter, ao menos, 41 votos favoráveis dos 81 senadores.
Marques iniciou sua apresentação fazendo acenos a conservadores. Relacionou sua indicação a um “chamado” e citou o salmo Isaías, versículo 12: “Eis o Deus meu salvador; eu confio e nada temo. O senhor é minha força, meu louvor e salvação. Com alegria bebereis do manancial da salvação”.
Duas horas depois do início da sabatina, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), relator ad hoc da indicação, solicitou a abertura do painel de votação, a presidente da CCJ, Simone Tebet (MDB-MS) acatou, sob a justificativa de que o indicado já respondeu algumas questões e, portanto, os senadores já teriam algum juízo de valor. O resultado, porém, só deve ser divulgado no final da sabatina.
O relator Eduardo Braga (MDB-AM) apresentou parecer favorável à indicação, mas, por causa da Covid-19, não pôde participar da sabatina.
Reforma administrativa
Uma das perguntas que Marques respondeu foi sobre a inclusão do Poder Judiciário na reforma administrativa. Ele afirmou que não vê “nenhum óbice”, mas ponderou a questão dos direitos adquiridos.
“Eu não percebo nenhum óbice para que a revisão seja ampla. Ninguém não pode estar submetido a uma reforma. Nem membro e nem servidores do Judiciário”, declarou.
“Agora, o problema enfrentado no Judiciário será o mesmo no Executivo, que é a questão do direito adquirido, de como vai ser trabalhado, que são questões que vão ser enfrentadas com muita propriedade aqui, no Congresso Nacional”, acrescentou.
Aborto
Entre outros assuntos, Marques foi questionado sobre sua posição em relação ao aborto. Durante sua intervenção, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) se levantou e foi até Marques entregar a representação de um feto de 11 semanas de gestação.
Depois, o parlamentar deixou claro que questionava a posição pessoal do desembargador sobre o aborto, e não a opinião de Marques enquanto desembargador ou futuro ministro do STF.
“Entendo que o Poder Judiciário muito provavelmente, exauriu as hipóteses dentro da sociedade, a não ser algo inimaginável, algum problema como a acefalia provocado pelo mosquito [Aedes Aegypti], da Zyka, algo que transformasse a sociedade e provocasse o Congresso e o Judiciário para alterar as coisas. No meu lado pessoal, eu sou defensor do direito à vida”, respondeu.
Lava Jato
Em um dos momentos de destaque esta manhã, Marques disse reconhecer os méritos das operações em curso no Brasil, inclusive da Lava Jato, mas frisou que “nada é imutável”. “Não há um brasileiro que não reconheça os méritos de quaisquer operações. Elas são legitimadas porque têm a participação do Ministério Público e do Poder Judiciário e, depois, da Polícia Judiciária dando cumprimento”, afirmou.
“Então, não há o que se falar em demérito de operações, que é fruto de três pilares. O que pode acontecer em qualquer operação, se houver uma determinada conduta de seja da autoridade policial, membro do MP ou do Poder Judiciário, qualquer membro, essas correções podem ser feitas. Nada é imutável”, agregou.
Por volta das 13h, a presidente da CCJ, Simone Tebet, fez um intervalo de 30 minutos para o almoço e, no retorno, os senadores que estão acompanhando a sabatina remotamente farão as perguntas.
“Farra das lagostas”
Em uma das primeiras confrontações, indagado pelo senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) sobre a “farra das lagostas”, como ficou conhecido o episódio, Marques explicou que não se tratava de uma licitação para almoço ou lanche dos ministros do STF, mas de uma contratação para eventos especiais da instituição – como jantares com autoridades estrangeiras.
O caso foi resgatado por grupos conservadores contrários a indicação do desembargador. Entre os pedidos do STF no edital estavam medalhões de lagosta, camarões e vinhos que tenham “pelo menos quatro premiações internacionais”.
“Esse evento em nada se confunde com o almoço dos ministros. Não foi licitação para restaurantes internos. Não era para almoço ou lanche dos ministros. Essa licitação foi feita, como existe em todas as instituições brasileiras, para receber autoridades de fora”, justificou.
Marques, então, se disse o Tribunal de Contas da União (TCU) julgou a licitação em questão como licita. “Em novembro ou dezembro do ano passado, essa licitação foi apreciada pelo Tribunal de Contas da União, que a julgou como lícita”, acrescentou.
Segunda instância
Ao ser perguntado sobre a prisão em segunda instância, Marques respondeu que a prisão nessa fase do processo não deveria ocorrer de forma “automática” e citou, como exemplo, o caso de um “criminoso habitual” e de um “pai de família”.
“Se de um lado, nós temos um criminoso habitual, um traficante, alguém que tem por profissão delinquir e, por outro lado, temos um cidadão brasileiro, pai de família, empregado, tem residência fixa, sem absolutamente nenhum antecedente criminal, mas que por um infortúnio ele se envolveu em uma briga em um bar próximo de sua casa e tenha cometido uma lesão corporal de natureza grave”, afirmou.
“Naquela condenação em segunda instância, se não dermos ao Poder Judiciário a possibilidade de fundamentar uma decisão de recolhimento, nós iríamos aplicar em sede desse automatismo o recolhimento de ambas as pessoas”, acrescentou. O desembargador destacou que a definição do tema cabe ao Congresso, onde já tramitam projeto do tipo.
Currículo
Na apresentação, Marques explicou as inconsistências no currículo que lhe gerou críticas nas últimas semanas. “Creio que em razões das regras educacionais europeias”, disse.
Ele explicou que começou o doutorado na Universidade de Salamanca em 2016 e, nos anos subsequentes, realizou dois cursos de pós-doutorado – um em Salamanca e outro na Universidade de Messina, mas os certificados só foram expedidos após a conclusão do doutorado, em 2018, o que justificaria os período curto entre eles.
“Não há menção em meu currículo de pós-graduação feito na Espanha. Em algumas universidades em regiões autônomas na Espanha, qualquer curso realizado após a graduação pode receber a denominação ‘postgrado’ sem guardar qualquer similaridade com o que a expressão significa no Brasil”, acrescentou.
Liberdade de expressão
Marques afirmou que não se pode usar a liberdade de expressão para cometer atos ilícitos e ponderou o papel do Judiciário na aferição do conteúdo.
“A liberdade de expressão não significa que atos ilícitos possam ser cometidos. A exemplo disso tem a calúnia, injúria e difamação. Ou seja, tipos penais específicos para punição. O Estado brasileiro e a sociedade [devem] inibir as fake news porque isso se trata de liberdade de expressão”, declarou.
“A preocupação que deve ter o Poder Judiciário é na aferição desses conteúdos. A liberdade de expressão, quando se trata algo que ocorreu e não é considerado desvirtuamento da verdade, não pode ser tolhido sobre em nenhum aspecto”, ponderou.
Esposa
Questionado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) sobre a sua esposa trabalhar para o senador Elmano Ferrer (Podemos-PI), Marques não soube responder e citou o custo de vida em Brasília para se explicar.
Segundo o desembargador, parlamentares oriundos de estados pequenos e com dificuldades econômicas não conseguem importar mão de obra dos respectivos lares por causa do alto custo de vida em Brasília.
“No Piauí, com uma remuneração de R$ 10 mil é possível que se viva com muita dignidade, sem faltar nada para filhos em escolas particulares, com muita dignidade. Em Brasília, pagando aluguel, com dois filhos na escola, não sobra nada”, disse.
“As pessoas que detêm alguma experiência e que já morem em Brasília tenham o facilitador de serem contratadas. Ela já possuía experiência nessa casa. Muito provavelmente, quando o senador Elmano vislumbrou essa possibilidade, a contratou. Agora, o trabalho que ela desempenha, eu não sei dizer”, afirmou. “Também não sou a pessoa certa para lhe responder.”
Perfil
Nascido em Teresina, no Piauí, Marques é bacharel em direito pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) e obteve títulos de mestrado pela Universidade Autônoma de Lisboa e de doutorado pela Universidade de Salamanca, na Espanha.
Depois de exercer a advocacia privada, ocupou, entre 2008 e 2011, o cargo de juiz eleitoral em vaga reservada a advogado no Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE-PI). Em 2011 foi escolhido, a partir de lista tríplice, para vaga de juiz no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), onde chegou à vice-presidência no biênio 2018-2020.