Glossário da CPI: vacinas, cloroquina e China são as palavras mais pronunciadas
Metrópoles selecionou 24 palavras-chave usadas durante depoimentos de ministros, ex-ministros, e demais autoridades ligadas à área de saúde
atualizado
Compartilhar notícia
Desde a instalação da Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI) que investiga ações e omissões do governo federal, além de eventuais desvios de recursos por estados e municípios no enfrentamento à pandemia de coronavírus, senadores já ouviram o depoimento de oito pessoas.
Até o momento, a comissão recebeu os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello; o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo; o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga; o ex-secretário de Comunicação do governo Fabio Wajngarten; o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres; e o gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo.
Durante as três semanas de depoimentos, as palavras mais usadas pelos depoentes e parlamentares foram “vacinas”, “cloroquina”, “estados” e “China”. É o que mostra um levantamento de dados feito pelo Metrópoles com base nas notas taquigráficas das sessões da CPI.
Para chegar ao resultado, a reportagem utilizou mecanismo de busca para identificar a frequência de 24 palavras-chave selecionadas e pronunciadas pelos presentes nas sessões da comissão. Os termos usados (veja todos mais abaixo) têm relação direta ou indireta com a pandemia.
A palavra “vacinas”, por exemplo, foi pronunciada 677 vezes em todos os oito depoimentos ao colegiado. Os senadores investigam se o governo federal falhou ou foi omisso na compra de imunizantes contra a Covid-19. Até essa sexta-feira (21/5), o Brasil já tinha perdido mais de 446 mil vidas para a doença.
À CPI, Carlos Murillo afirmou que o governo brasileiro ignorou cinco ofertas de vacinas da Pfizer para entrega ainda em 2020, e que os primeiros contatos para oferta de doses foram feitos em maio do ano passado.
O fato foi confirmado um dia após o ex-secretário Wajngarten dizer aos senadores que uma carta da Pfizer, com ofertas de vacinas, ficou sem resposta do governo por dois meses.
O segundo termo mais usado foi “cloroquina”, com 442 menções. O medicamento é frequentemente defendido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), apesar de não ter eficácia comprovada cientificamente contra o novo coronavírus.
Em uma transmissão ao vivo nas redes sociais, na última semana, Bolsonaro voltou a dizer que, recentemente, apresentou sintomas de uma possível reinfecção da Covid, e que, antes mesmo de procurar um médico, tomou o medicamento. Segundo o presidente, ele estava dando um “exemplo” à população: “No dia seguinte, eu estava bem”.
A terceira palavra mais falada em três semanas de depoimentos foi “estados” (359), em referência às 27 unidades federativas do país. Na sequência, “China” foi mencionada 316 vezes, sendo 187 citações feitas apenas durante o depoimento do ex-chanceler Ernesto Araújo.
Durante o seu depoimento, o ex-ministro afirmou que jamais promoveu “nenhum atrito” com o país asiático. No tempo em que ficou no comando do Itamaraty, no entanto, Araújo protagonizou um embate com o embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming.
Além disso, o próprio ex-ministro, o presidente Bolsonaro e filhos do chefe do Executivo federal já fizeram declarações contra o país. Recentemente, o chefe do Executivo do Brasil sugeriu que a China “criou” o novo coronavírus para ganhar uma suposta “guerra química”.
Fechando o ranking das cinco palavras mais usadas, o termo “máscaras” foi pronunciado 256 vezes. O equipamento de proteção é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo próprio Ministério da Saúde do governo.
Bolsonaro, genocida e negacionismo
Segundo o levantamento do Metrópoles, o presidente Jair Bolsonaro – incluindo referências ao seu governo – foi citado, nominalmente, ao menos 214 vezes.
Desde o início da pandemia, o chefe do Executivo vem sendo chamado de “genocida”, com uma política voltada ao “negacionismo”. Os dois termos foram usados 5 e 12 vezes, respectivamente, durante a CPI.
Além disso, durante depoimento de Luiz Henrique Mandetta, o ex-ministro afirmou que o presidente Jair Bolsonaro recebia uma espécie de “assessoramento paralelo” ao Ministério da Saúde no combate à pandemia.
A CPI investiga se as orientações desse “gabinete extraoficial” eram definidas pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente.
Mandetta e Carlos Murillo, representante da Pfizer, relataram que o vereador participava de reuniões e fazia anotações dos encontros. Carlos Bolsonaro foi citado 32 vezes na comissão.
Já a palavra “omissão” foi usada em 42 ocasiões. O termo “pressionado”, referente a “sofrer pressão por algo”, também foi citado entre os depoentes e senadores por sete vezes. A CPI investiga se algum integrante do governo sofreu pressão do presidente Jair Bolsonaro para seguir uma linha de ações opostas à ciência.
Remédios sem eficácia X medidas de enfrentamento
Em pouco mais de 14 meses de pandemia de coronavírus, não há, até o momento, medicamentos eficazes e comprovados cientificamente contra a infecção. Na CPI, remédios como cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina e annita foram citados 698 vezes se somadas todas as menções.
Além disso, o chamado “tratamento precoce” e o “kit Covid” foram citados 92 e 11 vezes, respectivamente.
Por outro lado, palavras como “máscaras”, “isolamento”, “distanciamento”, “lockdown” e “álcool” [em gel] foram citadas em 603 oportunidades. No geral, as medidas de enfrentamento à pandemia são alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro, especialmente direcionadas a governadores e prefeitos que têm adotado ações restritivas na pandemia.
O presidente Bolsonaro também costuma, sem máscara, gerar aglomerações entre apoiadores do governo. O termo “aglomeração” foi usado em 38 oportunidades na CPI.
Manaus, oxigênio e recursos
Em janeiro deste ano, a capital do Amazonas, Manaus, viu seu sistema de saúde colapsar com o aumento de casos e óbitos pela Covid-19.
Devido à alta taxa de internação, hospitais da capital chegaram a ficar sem oxigênio. De acordo com documentos oficiais, 31 pessoas morreram por falta do insumo na região entre os dias 14 e 15 de janeiro – ápice da crise.
Durante depoimento do ex-ministro Eduardo Pazuello, o militar afirmou que faltou oxigênio em Manaus por apenas três dias, o que irritou senadores. Ao colegiado, ele ainda disse que o governo federal chegou a discutir uma intervenção no Amazonas durante o colapso do sistema de saúde do estado, mas desistiu após uma explicação do governador Wilson Lima (PSC).
“Essa decisão [de intervir] não era minha. Foi levada ao conselho de ministros, o governador se apresentou, se justificou. Desculpa, quero retirar o termo, não é conselho de ministros, é reunião de ministros, com o presidente. O governador se explicou e foi decidido pela não intervenção”, afirmou Pazuello.
“A argumentação, em tese, é que o estado tinha condição de continuar fazendo a resposta. Em tese, mas a argumentação eu não tenho aqui. O resumo é que tinha condição de continuar fazendo frente à missão”, prosseguiu.
As palavras “Manaus” e “oxigênio” foram pronunciadas 215 e 230 vezes, respectivamente, em três semanas de depoimentos.
Além disso, o termo “recursos”, em referência a recursos financeiros enviados pela União a estados e municípios para enfrentar a pandemia, foi usado em 229 ocasiões.
Antes mesmo de a CPI da Covid ser instalada, o presidente Jair Bolsonaro defende que estados e municípios sejam investigados por eventuais desvios de recursos federais – o que também está incluído nos trabalhos da comissão.
Segundo afirmou em transmissão ao vivo na última semana, governadores “deitaram e rolaram” em recursos federais repassados aos estados. Ele não apresentou indícios ou provas para constatar sua tese.