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“Fomos convidados ao Jaburu, e recusamos”, diz procurador da Lava Jato

De acordo com Carlos Fernando dos Santos Lima, o convite ocorreu às vésperas da votação que selou o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016

atualizado

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Carlos Fernando dos Santos Lima
1 de 1 Carlos Fernando dos Santos Lima - Foto: Divulgação

O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima contou nesta segunda-feira (14/8), em São Paulo, que a força-tarefa da Operação Lava Jato de Curitiba (PR) foi convidada “a comparecer ao Palácio do Jaburu à noite” às vésperas da votação do impeachment de Dilma Rousseff (PT). A presidente teve seu mandato cassado no ano passado.

O convite ocorreu durante um evento da Associação Nacional dos Procuradores da República, em Brasília, e foi feito pelo ex-assessor especial da presidência da República e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR).

“Nós acreditamos que não era conveniente, porque naquele momento não havia porque conversar com o presidente ou eventual presidente. Nós acreditávamos que esse tipo de reunião naquele momento não haveria uma repercussão positiva para a Lava Jato”, relembrou o investigador.

“Tenho para mim que encontros fora da agenda não são ideais para nenhuma situação de um funcionário público. Nós mesmos, às vésperas do dia da votação do impeachment, fomos convidados a comparecer ao Palácio do Jaburu, à noite, e nos recusamos. Nós entendíamos que não tínhamos nada que falar com o eventual presidente do Brasil naquele momento”, prosseguiu.

Segundo o procurador, o emissário era Rocha Loures, pivô da crise política na qual mergulhou o presidente — o ex-assessor foi flagrado e filmado com uma mala preta estufada com R$ 500 mil em propina viva do grupo JBS, dinheiro supostamente destinado a Temer, segundo a Procuradoria-Geral da República.

Em 10 de maio do ano passado, a força-tarefa recebeu um prêmio da entidade pelo combate à corrupção. No dia seguinte, o plenário do Senado deu início à votação do parecer da Comissão de Constituição e Justiça sobre o impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Em 12 de maio, a petista foi afastada da presidência.

“Foi nesse momento que recebemos o convite, através do interlocutor e ele nos convidou a ir até o Palácio e nós dissemos não”, relatou o procurador. Carlos Fernando acrescentou que, naquele momento, a força-tarefa entendeu que não deveria conversar com a presidente ou seu vice. Ele salientou que a Lava Jato está sempre aberta a interlocução.

Raquel Dodge
Na última terça-feira (8), o presidente Michel Temer (PMDB-SP) recebeu no Palácio do Jaburu a nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em encontro marcado fora da agenda oficial. A sucessora de Rodrigo Janot chegou por volta das 22h, em seu carro oficial.

Na ocasião, a assessoria do Planalto disse que Temer atendeu ao pedido de Raquel para conversar sobre a sua posse no cargo, prevista para 18 de setembro, um dia depois do encerramento do mandato do atual procurador-geral.

Segundo Carlos Fernando dos Santos Lima, “todo funcionário público é responsável pelos atos que tem”. “É claro que ela (Raquel) tem de se explicar, ela deu uma explicação, ela que deve, então, ser cobrada das consequências desse ato”, salientou. “Infelizmente não há como fugir da responsabilização das pessoas perante a sociedade.”

Carlos Fernando afirmou ainda: “Eu não sou o corregedor do Ministério Público. Eu posso dizer por nós. Nós estivemos em uma situação semelhante e nos recusamos a comparecer. Nós temos agora que avaliar as consequências dentro da política que o Ministério Público vai ter a partir da gestão dela.”

Em meio a críticas recebidas antes mesmo de assumir o comando do Ministério Público Federal (MPF), a procuradora Raquel Dodge divulgou nota, na tarde de domingo (13), para esclarecer o encontro polêmico fora da agenda do Planalto com Temer, no Palácio do Jaburu.

No comunicado oficial, redigido somente cinco dias depois da visita ocorrida dia 8 — mesma data em que o presidente pediu ao ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato e do caso JBS no Supremo Tribunal Federal (STF), a suspeição de Janot — , ela disse que a audiência constou de sua agenda pública.

Raquel Dodge acrescentou que teve por objetivo discutir a posse no cargo, prevista para o próximo dia 18. “Os fatos que motivaram a reunião são institucionais”, afirmou no comunicado.

Corrupção
O procurador disse também que a corrupção no setor público brasileiro tem ligação com o sistema eleitoral extremamente caro. Contudo, a reforma política que tramita no Congresso, que entre outros pontos propõe a criação de um fundo para financiar as campanhas de R$ 3,6 bilhões, não vai, na opinião do procurador, resolver o problema, “pelo contrário”.

“Precisamos combater as causas da corrupção no Brasil. No setor público, elas estão ligadas a um sistema eleitoral extremamente caro e que exige, para se financiar, recursos obtidos ilicitamente”, alertou. “A resposta dos deputados agora é dinheiro público através de um fundo. Numa democracia consolidada, acho que até caberia discutir isso. Mas atualmente é incompatível com a situação que o Brasil está.”

O procurador criticou ainda o “distritão”, que é debatido no Congresso no âmbito da reforma política, argumentando que tem objetivo de manter as elites partidárias no comando. Essas propostas seriam a prova da resistência da classe política à tentativa de mudança do sistema.

De acordo com Lima, um dos principais desafios que a Lava Jato enfrenta nesse momento é uma sensação de indignação que pode crescer na população caso as descobertas das investigações não gerem punições.

“Imagine como ficaria a população se fosse aprovada uma lei de anistia?”, questiona, ponderando que seria uma “solução ineficaz” contra a corrupção e se assemelharia ao que aconteceu na Itália após a operação Mãos Limpas, que inspirou a Lava Jato.

Lima participou do 4º Fórum de Compliance, promovido pela Câmara Americana de Comércio Brasil Estados Unidos (Amcham), em São Paulo.

Suspeição
Carlos Fernando dos Santos Lima afirmou que entende o pedido de suspeição contra o procurador-geral da República, pela defesa de Temer. Mas criticou a medida, a qual classifica como “sem fundamento”. Para o procurador, o pedido objetiva colocar a investigação em um plano político.

“Não creio que o pedido de suspeição seja analisado pelo Congresso”, afirmou o procurador da operação Lava Jato, ponderando que tal fato seria até positivo, uma vez que não deixaria dúvida sobre o mérito do pedido. Ele afirmou, porém, que a solicitação “não tem nenhum fundamento”.

Questionado se poderia sair candidato no ano que vem, o procurador negou qualquer convite e afirmou que o trabalho no Judiciário exige uma vocação diferente. “Não sou candidato e brinco com (o juiz Sergio) Moro que também não votaria nele (caso ele seja candidato)”.

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