Exclusivo: em nove anos, o Brasil teve 263 atentados. Veja lista
Na segunda reportagem sobre terrorismo, o Metrópoles mostra ataques entre 1978 e 1987 contra advogados, universidades e igrejas
atualizado
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Enquanto a ditadura entrava em decadência, setores insatisfeitos com a redemocratização apelavam para atos violentos. Levantamento feito pelo Serviço Nacional de Informações (SNI) revela que grupos radicais praticaram 263 atentados com características de terrorismo entre 1978 e 1987.
Na maioria das ocorrências, os alvos representavam setores ativos na oposição à ditadura e na abertura política. Advogados de presos políticos, sedes de jornais, instituições católicas, shows de artistas, sindicatos e bancas de revistas sofreram ataques registrados pelo SNI.
Um dos fatos registrados nos papéis é a morte de Lyda Monteiro da Silva (imagem em destaque) em 27 de agosto de 1980. Vítima de uma carta-bomba enviada por terroristas ligados à ditadura, tinha 59 anos e trabalhava na Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro. A lista de atentados inclui o sequestro, em julho de 1980, do jurista Dalmo Dallari, expoente da resistência contra os abusos do regime militar.
Algumas unidades militares e órgãos públicos também foram atingidos por criminosos nos nove anos abordados no levantamento. Como acontece em praticamente todos os casos, não houve identificação dos autores.
Confira abaixo cópias dos documentos originais do SNI com detalhes sobre os 263 ataques terroristas:
Em 1984, a pedido de um serviço secreto estrangeiro não especificado, o SNI listou 183 “atos de terrorismo” desde 1978. Três anos depois, a relação foi complementada com 81 atentados. Esses e outros documentos a respeito de ações terroristas no Brasil fazem parte do Fundo SNI do Arquivo Nacional.
Elaborados em ordem cronológica, o segundo relatório tem uma falha na apresentação. Inexplicavelmente, a numeração salta do caso 230 (um explosivo na Prefeitura de Jequié, na Bahia) para o episódio 321 (uma bomba nos Correios em Belém).
Como o intervalo de tempo entre os dois fatos é de apenas três dias, provavelmente, trata-se de um erro cometido pelos responsáveis pelo documento. Fazendo-se a correção, chega-se ao número total de 263 atentados.
Os episódios anotados pelos organismos de espionagem dos militares ocorreram em 19 estados e no Distrito Federal. Com 70 atentados, São Paulo lidera o ranking, seguido pelo Rio de Janeiro, com 66 episódios. Em Brasília, teve 10 atos de terrorismo. Veja gráfico abaixo:
Nessa época abordada pelos relatórios do SNI, ações violentas contrárias ao retorno do Brasil ao Estado de Direito tinham, preponderantemente, a marca da extrema direita. Como revelado na reportagem sobre o tema publicada nesse domingo (05/01/2020), grupos de direita assumiram mais de uma dezena desses atos.
Os terroristas usavam nomes como Vanguarda de Caça aos Comunistas (VCC), Falange Pátria Nova e Comando de Caça aos Comunistas nas ações descritas pelo SNI. Derrotada pela repressão, a esquerda armada não operava mais nesse período. O tema fora tratado antes no Relatório Informação nº 042/116/ARJ/81, feito pelo SNI em 1981, conforme trecho reproduzido abaixo.
O que restara das organizações que adotaram a violência para enfrentar o regime militar integrava-se ao caminho pacífico das forças democráticas da sociedade. Desde a derrota da Guerrilha do Araguaia, no sudeste do Pará, em 1974, não se teve mais notícia de movimentos armados da esquerda.
Ainda assim, os documentos dos militares fazem especulações sobre participações de correntes ligadas à esquerda, como Alicerce da Juventude Socialista (AJS) e Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8) em alguns atos. Pelo contexto, são ilações improváveis.
A ditadura terminou formalmente no dia 15 de março de 1985, data da posse de José Sarney na Presidência da República. Em defesa de eleições diretas, as manifestações pacíficas do ano anterior contaram com a presença de todos os setores democráticos da sociedade e com ex-integrantes da luta armada contra o regime militar. A linha dura dos militares e a extrema direita se posicionaram contra a campanha das Diretas Já, responsável pelo empurrão final na ditadura.
As duas reportagens do Metrópoles sobre o terrorismo no Brasil foram motivadas pelo ataque à produtora do programa humorístico Porta do Fundos na véspera do Natal. As páginas do site permanecem abertas para manifestações de pessoas envolvidas nesses fatos ou que tenham informações relevantes sobre o assunto.