Ex-coordenadora da Força Nacional adverte para risco de formação de milícia
Tenente-coronel da PM foi demitida ao resistir à renovação de vínculo de reservistas ao grupo, armados e sem vínculo com forças de segurança
atualizado
Compartilhar notícia
Ex-coordenadora-geral de Administração da Força Nacional, a tenente-coronel da Polícia Militar do Ceará Keydna Alves Lima Carneiro entregou ao Ministério Público Federal (MPF) na terça-feira (23/06) uma denúncia contra o atual diretor-geral da unidade, coronel Aginaldo de Oliveira. Demitida no fim de maio, a oficial diz, na acusação, que o marido da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (SPL-SP), tentou silenciá-la para que ela parasse de questionar internamente a decisão de manter reservistas integrados ao grupo.
Keydna Carneiro sustenta que o uso desses reservistas (e armados) é inconstitucional e carrega vários riscos, como a criação de uma espécie de “milícia inimputável” e até mesmo a infiltração de criminosos, ao permitir que sejam integrados condenados em primeira instância, conforme atualização da portaria número 161/20.
As informações foram divulgadas nesta quarta-feira (24/06) pelo site O Antagonista, que teve acesso à denúncia da tenente-coronel.
A oficial da PM foi a primeira mulher a alcançar um posto de comando na Força Nacional. O prestígio, contudo, ruiu após ela insistir na avaliação de que “a participação de agentes de segurança na Força Nacional pressupõe a manutenção de seu vínculo funcional com a ‘instituição originária'”. No caso, alega a ex-coordenadora, reservistas não estão vinculados a nenhuma instituição militar, “sendo meramente cidadãos comuns com fardas institucionais e armas de Estado”.
Na denúncia ao MPF, ela anexou uma série de comunicações internas para comprovar a tentativa de alertar para a inconstitucionalidade da medida. “Essa denúncia é a terceira tentativa para a investigação do assunto”, escreve no documento revelado pelo site.
Na argumentação exposta na denúncia, Keydna afirma que não existe amparo jurídico que permita a reservistas atuarem na segurança pública, só como integrantes de operações de Garantia da Lei e da Ordem convocadas pelo Ministério da Defesa.
A ex-coordenadora também questiona que os reservistas mobilizados na FN mantenham patentes e até porte de arma. “Se nas Forças Armadas, as praças reservistas não possuem porte de arma, como podem adquirir essa prerrogativa ao integrarem a Força Nacional?”, indaga.
A argumentação técnica foi incluída em uma nota técnica apresentada por Keydna a Aginaldo, em 8 de janeiro deste ano. No documento, ela condicionava a renovação do vínculo de reservistas e inativos, que se encerraria no dia 31 daquele mês, à realização de estudos técnicos “complexos e variados” e à elaboração de uma “nova legislação”.
O diretor-geral da Força Nacional, porém, teria dado de ombros ao alerta da então subordinada e encomendado a outros assessores uma nova nota técnica, está favorável à prorrogação, para “evitar prejuízos na ordem operacional e continuidade nas atividades de segurança pública do país”. O contingente de reservistas já chegou a 400.
Keydna seguiu alertando sobre a precaridade do vínculo dos reservistas, em pressão para que o Ministério da Justiça elaborasse uma proposta legislativa para corrigir o problema. Foi exonerada em 29 de maio.
A Força Nacional divulgou uma nota na noite desta quarta negando a veracidade da denúncia. Leia a íntegra:
“A Força Nacional de Segurança Pública é um Programa de Cooperação Federativa, instituído pelo Decreto nº 5.289/2004, com o objetivo de reunir profissionais de segurança pública dos Estados e DF para atuar, sob coordenação do governo federal, na preservação da ordem pública e na proteção das pessoas e do patrimônio, sempre que haja a necessidade de apoio da União às estruturas locais de segurança.
A mobilização de reservistas para atuar na Força Nacional de Segurança Pública está prevista na Lei nº 13.500/2017. No mesmo ano, foi publicado o primeiro edital para a seleção de militares temporários das Forças Armadas (que tenham passado para a reserva há menos de cinco anos) para ingressar na Força Nacional de Segurança Pública.
Todos os atos realizados no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública prezam pela legalidade e são submetidos à Consultoria Jurídica para devida apreciação. Ressaltamos ainda que a Lei nº 10.826/2003 permite aos integrantes da Força Nacional de Segurança Pública o porte de arma de fogo em todo o território nacional.”