Ex-assessor de Flávio Bolsonaro recebia até quando estava fora do país
Constatação é do Coaf, que apura movimentação financeira atípica nas contas de 75 servidores e ex da Alerj: um deles estava em Portugal
atualizado
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O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) encontrou movimentação financeira suspeita nas contas de 75 servidores e ex-servidores de deputados estaduais do Rio de Janeiro. Entre eles, mais um ex-assessor do deputado e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que recebia mesmo em períodos em que estava fora do país. E outro – Fabrício José Carlos de Queiroz (na foto em destaque com o ex-chefe) – teve movimentação financeira atípica em suas contas bancárias que somaram R$ 1,2 milhão, em um ano. A informação foi divulgada pelo Jornal Nacional, da TV Globo.
De acordo com a reportagem, um conjunto de prédios na zona oeste do Rio é o terceiro endereço ligado à família de Fabrício José Carlos de Queiroz, o motorista e segurança de Flávio Bolsonaro que foi exonerado em outubro. Nesta quarta-feira (12), um porteiro confirmou que o ex-assessor do parlamentar mora no local. “Faz mais de semana que eu não vejo ele”, afirmou.
As duas filhas e a mulher de Fabrício de Queiroz também trabalharam no gabinete de Flávio Bolsonaro. Os nomes delas aparecem no relatório do Coaf que apontou para a movimentação atípica nas transações de Fabrício. Conforme o relatório, parte do R$ 1,2 milhão sobre os quais pairam suspeitas de irregularidades vinha de depósitos feitos por nove assessores e ex-assessores do gabinete. Um deles era Wellington Sérvulo Romano da Silva, contratado em 2015 por Flávio, mas que estaria no exterior desde então, segundo o porteiro do prédio onde mora.
“Ele está em Portugal, tem uns dois anos ou mais, 2015 por aí. A família está toda lá, resolveram se mudar para lá”, disse, ao JN, o porteiro do edifício do ex-servidor do deputado estadual. Conforme o noticiário, Wellington é tenente-coronel da Polícia Militar e foi nomeado em abril de 2015 para trabalhar como assessor de Flávio Bolsonaro na vice-liderança do PP, partido do deputado à época.
A reportagem teve acesso aos registros dele na Alerj e às viagens que ele fez, sempre pela mesma companhia aérea, a TAP. Em 24 de abril de 2015, nove dias depois de ter sido nomeado, Wellington viajou para Portugal, onde ficou 44 dias. Nesse período recebeu o salário e gratificações da Alerj: total de R$ 5.400 por mês.
No mesmo ano, viajou mais quatro vezes para Portugal, somando 119 dias fora do Brasil. A última viagem foi em 16 de dezembro. Wellington só voltou ao Brasil em 31 de janeiro de 2016. Em março, outra viagem. Saiu dia 9 e voltou em 8 de abril. Segundo a apuração, enquanto estava fora do Brasil, Wellington foi dispensado do trabalho na vice-liderança do PP. O documento é do dia 1º de abril. Nos registros da Alerj ele não aparece na lista de pagamentos nos meses de abril e maio de 2016.
Mas o caso não foi de demissão, e sim de remanejamento. Em 18 de maio, Wellington foi nomeado para trabalhar no gabinete do deputado Flávio Bolsonaro. Dois dias depois, embarcou no voo TAP 0070, das 22h45, com destino a Lisboa, para mais 15 dias no exterior, segundo o JN. Em 15 de julho, Wellington viajou de novo: 45 dias longe do Brasil e do trabalho. Em 1º de setembro de 2016, foi dispensado mais uma vez do cargo e não voltou mais a trabalhar com Flávio Bolsonaro.
A Alerj informou à reportagem que, durante todo o período em que Wellington Sérvulo Romano da Silva esteve na Casa, nunca tirou licença. Mas, de acordo com a apuração, em um ano e quatro meses de trabalho com Flávio Bolsonaro, ele ficou fora do país por 248 dias – a metade do período. Numa rede social a mulher de Wellington diz que a cidade onde mora atualmente é Aveiro, em Portugal.
Devassa
O relatório do Coaf lista, no total, movimentações financeiras atípicas nas contas de 75 funcionários e ex-funcionários da Alerj. As transações chegam a R$ 207 milhões, segundo o órgão. Os alvos da devassa do conselho, vinculado ao Ministério da Fazenda, são pessoas que trabalham ou trabalharam em pelo menos 21 gabinetes de deputados estaduais de 14 partidos (Avante, DEM, MDB, PDT, PHS, PRB, PSB, PSC, PSD, PSDB, PSL, PSol, PT e Solidariedade).
Segundo o JN, a maior movimentação de valores envolveu quatro pessoas ligadas ao gabinete do presidente em exercício da Assembleia, André Ceciliano (PT): foram R$ 49 milhões. Cinco pessoas ligadas ao gabinete do deputado Paulo Ramos (PDT) movimentaram R$ 30 milhões. Nove pessoas do gabinete do deputado Márcio Pacheco (PSC), candidato à presidência da Alerj, R$ 25 milhões.
Oito pessoas do gabinete do deputado Luiz Martins (PDT), que foi preso em novembro, R$ 18,5 milhões. Cinco pessoas ligadas ao gabinete do deputado Doutor Deodalto (DEM), movimentaram R$ 16,3 milhões. E cinco pessoas ligadas ao gabinete do deputado Carlos Minc (PSB), que já foi ministro do Meio Ambiente, R$ 16 milhões.
O Ministério Público Federal ressaltou que nem todos os nomes citados no relatório do Coaf foram incluídos nas apurações e que nem todas as movimentações suspeitas são, necessariamente, ilícitas. Como o relatório indicava a existência de movimentações atípicas de outras pessoas que não foram alvos da operação federal, os procuradores encaminharam essa parte da documentação para o Ministério Público estadual, informou o telejornal. O MP do Rio abriu uma investigação, que corre em sigilo.
Outro lado
Durante live em uma rede social, o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), também reforçou que nem ele nem o filho são investigados, que estão à disposição das autoridades e, caso comprovada quaisquer irregularidades, ambos pagarão pelo erro. Jair Bolsonaro disse ainda esperar que tudo seja esclarecido o mais rapidamente possível.
Flávio Bolsonaro declarou à reportagem que não procede a informação de que Wellington Sérvulo morava em Portugal enquanto estava lotado no gabinete na Alerj. Segundo o deputado estadual e senador eleito, a família de Wellington tem cidadania portuguesa e se mudou para lá.
Segundo o parlamentar, Wellington os visitava esporadicamente e trabalhou normalmente no gabinete até ser exonerado. Flávio Bolsonaro considerou o depósito de R$ 1.500 corriqueiro e pontual e disse que não pode ser cobrado por isso. Ele reiteirou que não é investigado, mas está à inteira disposição das autoridades.
O presidente interino da Alerj, André Ceciliano, ressaltou também ao JN que constar no relatório não significa que os assessores tenham praticado condutas ilícitas.
Márcio Pacheco afirmou à reportagem que sete dos nove funcionários não trabalham mais no gabinete e que está apurando o caso.
Paulo Ramos disse ao telejornal que pessoas de bem têm as vidas pessoais e profissionais ilegalmente devassadas por serem assessores parlamentares.
Já Carlos Minc afirmou que não é investigado e a movimentação de um assessor se refere a uma herança.
Doutor Deodalto disse que todos os citados prestarão os esclarecimentos quando necessário.
O Solidariedade declarou que desconhece os fatos, mas entende que todos os citados prestarão os devidos esclarecimentos.
O JN não conseguiu resposta dos demais citados.