Em clima pré-eleitoral, Bolsonaro intensifica viagens durante CPI
Parte das viagens é destinada a entregas de obras iniciadas em governos anteriores ou reinaugurações. Agendas costumam promover aglomerações
atualizado
Compartilhar notícia
Desde que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid começou a funcionar no Senado, no fim de abril de 2021, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) intensificou suas agendas em outros estados. A maior parte das viagens é destinada a entregas de obras, algumas iniciadas em governos anteriores, ou reinaugurações (veja detalhamento mais abaixo).
As agendas buscam manter o presidente próximo da população e dar o pontapé na campanha à reeleição de 2022. Elas também são uma oportunidade para o presidente criticar senadores da CPI em seus próprios estados. A comissão investiga ações e omissões do governo federal no combate à pandemia de coronavírus.
Este ano, Bolsonaro foi a redutos eleitorais de políticos adversários e aproveitou para polemizar com os rivais. O chefe do Executivo federal defende que governadores e prefeitos também sejam investigados pela CPI, mas a apuração nesses casos cabe às assembleias legislativas e câmaras municipais.
Recentemente, Bolsonaro esteve no Ceará, governado por Camilo Santana (PT); no Maranhão, liderado por Flávio Dino (PCdoB); e em Alagoas, comandado por Renan Filho (MDB). Em nenhuma das ocasiões os governadores acompanharam a agenda presidencial.
No caso do filho do senador Renan Calheiros (MDB-AL) – que é relator da CPI da Covid –, Bolsonaro esteve ao lado do ex-presidente e também senador Fernando Collor (Pros), e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Atacou Calheiros pai, a quem chamou de “vagabundo”, e reinaugurou um viaduto que já havia sido aberto em 2020. O financiamento da obra saiu nos governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).
Contrariando recomendações das autoridades sanitárias, as agendas promovem aglomeração de apoiadores do presidente e muitas desrespeitam o distanciamento social e o uso de máscaras.
Nos primeiros cinco meses do ano, Bolsonaro já viajou ao menos 29 vezes, considerando registros da agenda oficial da Presidência da República levantados pelo Metrópoles. Destas, 10 foram realizadas apenas em maio (acima da média mensal de 2021, de 5,8).
No mesmo período de 2020, tinham ocorrido 18 viagens — considerando que a pandemia só foi decretada em meados de março. Em todo o ano passado, foram realizadas 64 viagens.
Em março de 2020, Bolsonaro fez duas viagens internacionais: a primeira, a Montevidéu, para a posse do novo presidente do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou, e a segunda, aos Estados Unidos, em um movimento de aproximação com o então presidente Donald Trump. Imediatamente após o retorno da comitiva presidencial, começaram a ser notificados os primeiros casos de pacientes com Covid-19 no Brasil.
O fechamento das fronteiras e as barreiras sanitárias impostas pelas autoridades mundiais obrigaram a interrupção na circulação, inclusive dos chefes de Estado.
Nos primeiros meses da pandemia, o chefe do Executivo federal reduziu o ritmo de viagens — todas nacionais, e algumas relacionadas à Covid-19, como a inauguração do Hospital de Campanha de Águas Lindas de Goiás.
Ainda no segundo semestre de 2020, o presidente foi aconselhado por assessores a retomar as viagens pelo país, que rarearam entre março e junho. A retomada foi iniciada com a participação em eventos militares, mas, posteriormente, o presidente passou a acompanhar inaugurações ou reinaugurações de obras.
Em 23 de maio deste ano, o presidente fez a primeira viagem internacional após a decretação da pandemia. Ele foi para Quito participar da posse do novo presidente do Equador, o conservador Guillermo Lasso.
Inauguração de obras
Segundo o levantamento feito pelo Metrópoles, a maior parte das viagens se destinou a inaugurações ou lançamentos de obras de infraestrutura. Foram 39 eventos do tipo, no total. O ministro de Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, costuma acompanhar todas essas agendas. Bolsonaro, inclusive, tem aproveitado as cerimônias para adiantar uma possível candidatura de Tarcísio em 2022 – menciona com frequência uma disputa em São Paulo.
Desses, alguns eram reinaugurações, como a de um viaduto em Maceió e um trecho do Canal do Sertão, que leva água do Rio São Francisco a municípios do semiárido, ambos em Alagoas. As duas obras já tinham sido entregues quando Bolsonaro compareceu às cerimônias de “inauguração”.
Na sequência, aparecem visitas a centros técnicos, parques, escolas museus e outras instituições (28) e eventos de cunho policial ou militar (16). Veja detalhamento na tabela abaixo:
“Rolezinhos”
A reportagem considerou apenas os registros oficiais, mas há ainda as agendas que o presidente tem feito pelas redondezas de Brasília em feriados e fins de semana, e que constam como “agenda privada”, como na última quinta-feira (3/6), quando fez um bate e volta a Formosa (GO), onde participou de uma missa alusiva ao Corpus Christi.
Os chamados “rolezinhos” realizados pelo presidente não são comunicados à imprensa com antecedência e geralmente contam apenas com a presença dos seguranças mais próximos do presidente.
Nas ocasiões, Bolsonaro não tem o costume de usar máscara de proteção facial e promove aglomerações de dezenas de apoiadores.
Aglomerações durante a CPI
Na semana passada, o Metrópoles mostrou que o chefe do Executivo federal mais que dobrou o número de aglomerações desde a instalação da CPI. Ao longo do primeiro mês do colegiado, Bolsonaro promoveu aglomerações e desrespeitou normas sanitárias estaduais em pelo menos 26 oportunidades.
Foi depois de provocar aglomeração durante uma viagem ao Maranhão, em 21 de maio, que o governador Flávio Dino (PCdoB) multou o presidente Jair Bolsonaro por provocar aglomerações e não usar máscara de proteção facial.
A autuação foi expedida em nome de Bolsonaro e endereçada ao Palácio do Planalto. Foi dado o prazo de 15 dias, a partir da notificação, para o presidente se defender das acusações.
A multa pode ir de R$ 2 mil a R$ 1,5 milhão, segundo a norma que trata de infrações à legislação sanitária, mas só é aplicada ao fim do processo.