Em Congresso com perfil conservador, gays pedem avanço da pauta LGBTQIA+
ONGs entregaram aos presidentes da Câmara e do Senado uma lista de projetos prioritários para garantir direitos fundamentais
atualizado
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Com a iminente volta ao trabalho presencial no Congresso e após um longo período em que o foco do Legislativo foram as pautas econômica e eleitoral, representantes da comunidade LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer, interssexuais e agêneros) procuraram parlamentares para tentar fazer avançar projetos de lei que garantam mais direitos.
Tratam-se de propostas que estão há anos tramitando no Congresso e que não avançaram por causa da resistência de parlamentares que se intitulam defensores da família (tradicional, formada por um homem e uma mulher), conservadores e religiosos.
Nesta semana, integrantes de grupos gays, apoiados por deputados de partidos de oposição, se reuniram com os presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
No encontro, os representantes da comunidade LGBTQIA+ pediram aos presidentes do Legislativo que pautem propostas que garantam a segurança de homossexuais, o pleno exercício da identidade de gênero, entre outros pontos.
Há 12 anos consecutivos, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking dos países que mais matam transgêneros no mundo. Além disso, o número de assassinatos de mulheres trans e travestis é o maior desde 2008 — ano em que o dado começou a ser registrado.
Nas duas reuniões, também houve pedidos para Lira e Pacheco não colocarem em votação uma série de projetos considerados prejudiciais para a comunidade. São propostas que, na avaliação dos defensores de direitos humanos, acabam contribuindo para que essa posição do Brasil na lista da violência não se modifique.
Perfil conservador do Congresso é obstáculo
Para o diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antonio Augusto de Queiroz, o perfil conservador do Congresso é um grande obstáculo para o andamento dessas pautas. No entanto, ele destaca que é importante a apresentação, como forma de se contrapor às forças conservadoras.
“Essas pautas têm mais chances de avançar no Judiciário do que no Legislativo, mesmo em composições mais progressistas. Nessa composição, as chances de sucesso são muito baixas, para não dizer zero. Mas é importante que sejam apresentadas para fazer o contraponto às forças conservadoras”, apontou Queiroz.
“Temos um Congresso que é liberal, do ponto de vista econômico; fiscalista, do ponto de vista de gestão; conservador, em relação a valores e atrasado em relação aos direitos humanos e ao meio ambiente”, declarou o diretor do Diap.
Uso do banheiro
No rol de propostas criticadas pela comunidade LGBTQIA+, há projetos que têm como alvo as pessoas transexuais. Uma delas torna contravenção o uso de banheiro público diferente do sexo do usuário, por exemplo.
Há também projetos de lei para proibir a adoção de crianças por casal homoafetivo e incluir a chamada “disseminação de ideologia de gênero” no rol de crimes hediondos.
A intenção do grupo é começar a construir duas propostas que unifiquem direitos já conquistados e que ainda podem ser aprovados. Até o momento, esses projetos são chamados de Estatuto da Diversidade e o Estatuto de Todas as Famílias.
“Saímos satisfeitos tanto da reunião com Lira, quanto da reunião com o Pacheco. Também estivemos com 16 senadores e 25 deputados. Como está em vias de liberar as visitas, nós faremos uma visita a todos os parlamentares porque queremos construir o Estatuto da Diversidade e o Estatuto de Todas as Famílias. Essas propostas visam contemplar todos os direitos que já adquirimos por meio de jurisprudência e que a gente quer positivar em ambas as Casas”, disse Toni Reis, diretor do grupo Dignidade e presidente da Aliança Nacional LGBTI.
“Dissemos que não queremos destruir a família de ninguém, mas queremos a nossa”, relatou Reis ao Metrópoles.
Pedidos e respostas
De acordo com os participantes da reunião, Lira se comprometeu a levar ao plenário todas as propostas que vencerem a fase de comissões e estiverem prontas para ser votadas. Da mesma forma, o presidente da Câmara se recusou a ter comportamento diferente em relação à lista de projetos indesejáveis defendidos pelos parlamentares conservadores.
Lira garantiu que a Câmara respeita decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que já garantiu uma série de direitos que foram votados pelo Congresso.
Pacheco, na avaliação dos presentes à reunião, foi enfático ao dizer que não se pode permitir nenhum milímetro de retrocesso dos direitos.
Terceiro sexo
Uma reinvindicação até então pouco divulgada no Brasil diz respeito aos direitos de pessoas intersexuais, ou seja, que possuem características de ambos os sexos.
Para essas pessoas, o grupo defende propostas de lei que proíbem a “mutilação de bebês intersexo”, assegurando a autodeterminação de gênero, além de propostas que impedem a prática de hormonioterapias realizadas sem respeito à identidade de gênero da pessoa.
O grupo Movimento Intersexo, um dos que assinam a carta entregue ao presidente da Câmara, pediu que avance na Casa a proposta de reconhecimento civil do chamado terceiro sexo.
A proposta, de autoria da ex-deputada Laura Carneiro (MDB-RJ), tramita na Câmara desde 2016 e se encontra atualmente apensada ao projeto 1475/2015. O objetivo é disciplinar o registro civil do recém-nascido sob o estado de intersexo.
LGBTcídio
Outra proposta considerada importante pelo grupo é a que define como circunstância qualificadora de crime de homicídio a condição sexual, a exemplo do que ocorre hoje com a Lei Maria da Penha.
O agravante é chamado na proposta de LGBTcídio. O projeto de autoria da deputada Luiziane Lins (PT-CE) está entre os elencados.
Já a proposta da deputada Jandira Feghali (PT-DF) amplia a proteção da Lei Maria da Penha, considerada uma das legislações mais avançadas no mundo para o enfrentamento à violência contra a mulher, para a violência contra transexuais e transgêneros.
Gays na política
Também foram elencados projetos com o objetivo de favorecer candidaturas de LGBTs. Entre eles, estão duas propostas de autoria do deputado Alexandre Frota (PSDB-SP), ex-aliado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que estabelece cotas eleitorais, como as existentes hoje para as mulheres, para candidaturas LGBTs.
Essa proposta se encontra apensada a outros projetos no mesmo sentido e aguarda um parecer do relator na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara.
Outro texto, também de autoria de Frota, proíbe a violência política eleitoral contra candidato LGBT ou transgênero. Esse projeto aguarda parecer na Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Confira a lista de propostas prioritárias na garantia de direitos LGBTQIA+: